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domingo, 20 de julho de 2025

Pré-diabetes - Revisão (Nature, 2025)

Resumo

O pré-diabetes, ou hiperglicemia intermediária, representa um estágio preliminar no desenvolvimento do diabetes mellitus tipo 2 (DM2). Além de apresentarem maior probabilidade de evoluir para DM2, indivíduos com pré-diabetes têm risco aumentado para diversas complicações vasculares e não vasculares. Ainda não há consenso sobre a estratégia ideal de rastreamento do pré-diabetes, sendo mais frequentemente utilizados a glicemia de jejum, a hemoglobina glicada (HbA1c) e o teste oral de tolerância à glicose. Os dois principais fenótipos do pré-diabetes — glicemia de jejum alterada e tolerância à glicose diminuída — podem representar fisiopatologias distintas, com história natural, risco de desfechos adversos e resposta ao tratamento também diferentes. A maior parte das evidências para o manejo do pré-diabetes concentra-se em intervenções no estilo de vida, com ou sem medicamentos, em indivíduos com sobrepeso ou obesidade e tolerância à glicose diminuída. Ainda não está claro se essas intervenções são benéficas em pessoas com glicemia de jejum alterada e em indivíduos com peso corporal normal, assim como permanecem incertas a relação custo-efetividade e a sustentabilidade do uso de farmacoterapia no tratamento do pré-diabetes. Programas nacionais de prevenção do DM2 em larga escala estão em andamento para avaliar se os benefícios das intervenções para o pré-diabetes podem ser traduzidos para a prática em nível populacional.

Introdução

O diabetes mellitus é um distúrbio metabólico e vascular caracterizado por hiperglicemia crônica associada a lesões celulares e vasculares, resultando em diversas complicações e associado a considerável morbidade e mortalidade precoce. No diabetes mellitus tipo 2 (DM2), a forma mais comum da doença, elevações progressivas nos níveis de glicose no sangue costumam ser detectadas antes que os valores de corte para o diagnóstico de diabetes sejam alcançados. Assim, os termos pré-diabetes ou hiperglicemia intermediária foram introduzidos para classificar indivíduos com níveis de glicose no sangue acima dos usados para definir a normoglicemia, mas abaixo dos limiares atuais para o diagnóstico de diabetes mellitus (Tabela 1). Existem múltiplas definições para as categorias de hiperglicemia intermediária (Caixa 1). 

Embora a OMS e a Federação Internacional de Diabetes utilizem o termo hiperglicemia intermediária como termo coletivo para todas essas categorias, neste Primer é usado o termo pré-diabetes, pois é mais familiar para médicos e comunidades. Indivíduos com pré-diabetes apresentam maior risco de desenvolver DM2, bem como complicações vasculares e outras, em comparação àqueles com níveis normais de glicose no sangue.

Pessoas com pré-diabetes e estágios iniciais de diabetes muitas vezes não apresentam sintomas, e o diagnóstico baseia-se inteiramente em valores pré-definidos de glicemia de jejum, glicemia 2 horas após teste oral de tolerância à glicose (TOTG) e/ou hemoglobina glicada (HbA1c). O pré-diabetes pode ser detectado usando uma ou mais dessas medidas: glicemia de jejum (após jejum noturno de pelo menos 8 horas), glicemia plasmática 2 horas após ingestão de 75 g de glicose (TOTG) ou HbA1c. Esta última pode ser explicada de forma simples como a proporção das cadeias β da hemoglobina às quais a glicose foi adicionada de forma não enzimática (glicada). Como os glóbulos vermelhos têm um tempo de vida de 2 a 3 meses, a HbA1c fornece uma estimativa dos níveis médios de glicose aos quais os glóbulos vermelhos estiveram expostos nesse período.

A glicemia de jejum alterada (IFG) é caracterizada por valores de glicemia de jejum acima do normal, mas não suficientemente elevados para diagnosticar diabetes mellitus. De forma semelhante, a tolerância à glicose diminuída (IGT) refere-se a indivíduos com valores de glicemia 2 horas após o TOTG acima do normal, mas não tão altos a ponto de justificar o diagnóstico de diabetes mellitus. O indivíduo pode apresentar IGT ou IFG isoladamente, ou uma combinação de ambos. A medida da HbA1c tem a vantagem, em relação aos níveis de glicose plasmática, de refletir o controle glicêmico de longo prazo e não sofrer variações diárias; no entanto, devido a limitações e armadilhas (por exemplo, em pacientes com anemia ou durante a gestação), a HbA1c não é universalmente aceita para diagnóstico de pré-diabetes. Os critérios diagnósticos para pré-diabetes baseiam-se em estudos epidemiológicos, mecanísticos e de intervenção que relacionam esses limiares ao risco de progressão para DM2 e doença cardiovascular (DCV) (Caixa 1).

Diante das centenas de milhões de pessoas com glicose elevada que muitos profissionais de saúde atendem, o conhecimento sobre pré-diabetes é de grande importância para o médico, pois o diagnóstico correto oferece uma oportunidade valiosa para monitoramento, educação e intervenção precoce, podendo alterar positivamente sua trajetória. Neste Primer, apresentamos uma visão ampla do pré-diabetes, discutindo sua epidemiologia, a compreensão atual de sua fisiopatologia, diagnóstico, implicações, manejo e propomos caminhos para novas pesquisas visando melhorar os desfechos para os pacientes.

Progressão para DM2

As diferentes formas de pré-diabetes variam em relação ao risco de progressão para diabetes mellitus tipo 2 (DM2). Indivíduos com combinação de IFG (glicemia de jejum alterada) e IGT (tolerância à glicose diminuída) apresentam a maior incidência de DM2, seguidos por aqueles com IGT isolada e, por fim, por aqueles com IFG isolada, sem diferenças geográficas claras. A taxa de progressão do pré-diabetes para o DM2 também é influenciada por fatores de risco adicionais, que podem interagir para acelerar essa evolução, exigindo uma avaliação de risco abrangente e individualizada em pessoas com pré-diabetes.

Fatores de risco

Os fatores de risco para o pré-diabetes são os mesmos do DM2. Entre os fatores não modificáveis estão: idade avançada, sexo (IFG é mais comum em homens, IGT mais comum em mulheres, e a HbA1c geralmente é mais alta em mulheres), etnia ou raça (indivíduos brancos têm risco menor do que outras populações), histórico familiar, extremos de peso ao nascer e fatores genéticos. Fatores de risco modificáveis — muitos associados à vida urbana, desenvolvimento econômico e status socioeconômico — incluem inatividade física, dieta não saudável (por exemplo, bebidas açucaradas, alimentos ultraprocessados e alto consumo de carne vermelha), tabagismo e consumo excessivo de álcool. Outros fatores psicológicos e comportamentais incluem má qualidade do sono, estresse, ansiedade, depressão e baixa qualidade de vida. A obesidade (especialmente a obesidade central, refletida por maior circunferência da cintura) é um mediador importante dos efeitos de vários fatores de risco relevantes, além de estar associada a hipertensão arterial e alterações nos níveis lipídicos. Evidências indicam que existem diferenças entre os sexos na associação relativa dos fatores de risco para o pré-diabetes: obesidade central, dislipidemia, tabagismo e consumo de álcool são fatores chave em homens, enquanto hipertensão arterial e dietas de baixa qualidade têm importância relativamente maior em mulheres. Fatores de risco adicionais para mulheres incluem histórico de diabetes gestacional e síndrome dos ovários policísticos.

Morbidade e mortalidade

Uma revisão abrangente de 16 revisões sistemáticas mostrou que o pré-diabetes definido por IGT e IFG — mas não o definido por HbA1c — está associado a maior risco de mortalidade por todas as causas em comparação com a normoglicemia definida pela mesma medida. As razões postuladas para essa discrepância incluem o número reduzido de estudos envolvendo pré-diabetes definido por HbA1c, além da possibilidade de que uma HbA1c elevada seja uma medida menos robusta de hiperglicemia em indivíduos com normoglicemia e pré-diabetes em comparação com aqueles com diabetes. O risco de mortalidade por todas as causas, doença coronariana e AVC foi maior para IGT do que para IFG. A coexistência frequente do pré-diabetes com múltiplos fatores de risco (como obesidade, hipertensão arterial, dislipidemia, resistência à insulina — uma resposta subótima às ações da insulina —, baixa taxa de filtração glomerular estimada, albuminúria, doença hepática gordurosa associada à disfunção metabólica (MASLD), doença cardíaca isquêmica e insuficiência cardíaca) contribui para o risco elevado de múltiplas morbidades e morte precoce em pessoas com pré-diabetes.

Etiologia do pré-diabetes

A taxa de concordância de risco vitalício de quase 100% para DM2 em gêmeos monozigóticos destaca a importância dos fatores hereditários. Em linha com essa evidência, estudos de associação genômica ampla identificaram muitos loci genéticos ligados à biologia das ilhotas pancreáticas, do músculo esquelético e do tecido adiposo. Outros estudos relataram associações com escores de risco genético, implicando o papel das vias relacionadas às células β no desenvolvimento do pré-diabetes. No entanto, esses variantes genéticos explicam menos de 20% do risco de DM2, sugerindo que fatores demográficos — como idade, sexo, etnia, ancestralidade e modificações epigenéticas transgeracionais e perinatais precoces (por exemplo, ambiente intrauterino e extremos de peso ao nascer) — podem contribuir para a predisposição ao desenvolvimento de pré-diabetes. Além disso, fatores relacionados ao estilo de vida, condições ambientais e eventos ao longo da vida podem precipitar a progressão de normoglicemia para pré-diabetes e DM2, e podem ser modificados por diagnóstico precoce e intervenção.

Adicionalmente, a disbiose intestinal (ou seja, composição anormal da microbiota intestinal) altera a liberação de ácidos graxos livres de cadeia curta, proteínas, vitaminas e ácidos biliares secundários na circulação, podendo contribuir para resistência à insulina, pré-diabetes e DM2. Estudos em humanos com perda de peso forneceram evidências de que a redução da resistência à insulina e da massa de tecido adiposo visceral são os principais motores da remissão do pré-diabetes e do DM2, ressaltando, assim, o papel predominante da resistência à insulina e da disfunção do tecido adiposo no início e progressão do pré-diabetes.

O modelo de biologia integrativa para o desenvolvimento do DM2 postula que os eventos iniciais de resistência à insulina envolvem estresse mecânico local e hipóxia, levando à infiltração de macrófagos no tecido adiposo, contribuindo para sua disfunção. O tecido adiposo disfuncional é caracterizado por inflamação local e resistência à insulina, com lipogênese induzida pela insulina prejudicada, favorecendo a secreção de NEFA (ácidos graxos não esterificados) e adipocinas pró-inflamatórias em detrimento da secreção de adipocinas anti-inflamatórias (sensibilizadoras da insulina). No estudo Whitehall II, a redução dos níveis circulantes de adiponectina — uma adipocina sensibilizadora da insulina produzida pelo tecido adiposo subcutâneo maduro — observada décadas antes do início do DM2, apoia o papel da disfunção do tecido adiposo no pré-diabetes.

Com o tempo, essas alterações levam à resistência sistêmica à insulina, inflamação de baixo grau (subclínica) e acúmulo ectópico de lipídeos, caracterizado por adiposidade visceral e MASLD (doença hepática gordurosa associada à disfunção metabólica).

O pré-diabetes e a MASLD compartilham outras similaridades, como disbiose intestinal e adaptação mitocondrial prejudicada. Vale destacar a relação mútua entre MASLD e pré-diabetes, ilustrada por análises longitudinais que mostram um hazard ratio de 1,69 para pré-diabetes em indivíduos com MASLD.

Disglicemia e progressão para DM2

No pré-diabetes, ocorre uma elevação gradual da glicemia, apesar do aumento da secreção de insulina na presença de resistência à insulina. Assim, indivíduos com pré-diabetes frequentemente apresentam secreção de insulina de primeira fase insuficiente, compensada por aumento da secreção tardia para conter a hiperglicemia inicial. Essa sobrecarga excessiva da função das células β leva, eventualmente, à sua descompensação, resultando em hiperglicemia manifesta. Estudos utilizando TOTG, junto com avaliação de sensibilidade à insulina e função das células β, revelaram a heterogeneidade das trajetórias da disglicemia (níveis anormais de glicose no sangue).

O estudo britânico Whitehall II monitorou as mudanças na sensibilidade à insulina e nos níveis de glicose plasmática em funcionários públicos de ancestralidade europeia por quase duas décadas, no final do século XX (período marcado pelo início do aumento expressivo da obesidade no Reino Unido). Enquanto indivíduos que não desenvolveram diabetes apresentaram apenas um declínio gradual na sensibilidade à insulina corporal total, mantendo a função das células β estável, aqueles que evoluíram para DM2 exibiram sensibilidade à insulina significativamente reduzida mais de 10 anos antes do início do diabetes (Fig. 3). Essa sensibilidade reduzida foi acompanhada por aumento contínuo da glicemia de jejum e da glicemia pós-TOTG, embora ainda dentro da faixa normoglicêmica. Cerca de 6 anos antes do início do DM2, ocorreu um aumento acentuado da glicemia pós-carga, seguido (cerca de 2 anos antes do início do DM2) por aumento igualmente acentuado da glicemia de jejum.

Outros estudos de coorte relataram fenômenos semelhantes, com variações entre grupos étnicos que exibem padrões de tempo diferentes para essas mudanças.

Essas mudanças são acompanhadas por um modelo em múltiplas fases de disfunção das células β, ocorrendo em um contexto de resistência à insulina (Fig. 3). Esse achado destaca também a importância de identificar precocemente anormalidades na ação e secreção da insulina, antes do início de alterações dinâmicas que levam à hiperglicemia persistente.

Manejo

O principal objetivo no manejo do pré-diabetes é retardar ou prevenir o desenvolvimento do diabetes mellitus tipo 2 (DM2). Estudos iniciais focaram na perda de peso por meio de intervenções no estilo de vida (incluindo modificações na alimentação e aumento da atividade física) ou na adição de metformina.

Desde a década de 2010, estudos demonstraram que novos medicamentos que promovem perda de peso, como agonistas do receptor de GLP1 e agonistas duplos GLP1–GIP, além da cirurgia metabólica, também podem retardar a progressão do pré-diabetes e/ou induzir sua regressão (Box 2).

Remissão do pré-diabetes

Tradicionalmente, a remissão é considerada no contexto do diabetes mellitus tipo 2 (DM2) já estabelecido. No entanto, buscar a remissão na fase de pré-diabetes é plausível, já que a função das células β pode estar melhor preservada nesse estágio, antes do DM2 se instalar.

Um subconjunto de indivíduos com pré-diabetes pode reverter espontaneamente para a normoglicemia mesmo na ausência de intervenções.

Embora esse fenômeno não comprometa os benefícios da prevenção do DM2 em estudos clínicos randomizados e controlados, a heterogeneidade na progressão do pré-diabetes para o DM2 deve ser considerada ao decidir a conduta mais apropriada. 

Melhorias no estilo de vida são benéficas em diversas condições de saúde e devem ser incentivadas independentemente do nível glicêmico. Da mesma forma, é fundamental abordar fatores de risco cardiovascular, como hipertensão e dislipidemia, de acordo com diretrizes locais.

Em uma revisão abrangente da Cochrane, que englobou 103 estudos de coorte prospectivos sobre pré-diabetes, 47 estudos relataram taxas de conversão para normoglicemia. Nesses grupos, as taxas de regressão para normoglicemia variaram de 33% a 59% em 1–5 anos, diminuindo para 17–42% em estudos com 6–11 anos de seguimento. O risco de progressão para DM2 e de regressão para normoglicemia apresentou variabilidade entre os estudos, em parte devido à falta de resposta à intervenção no estilo de vida e às diferenças nas definições dos subtipos de pré-diabetes, bem como à adesão e resposta às intervenções.

IFG isolado

A maioria dos estudos sobre intervenções no estilo de vida concentrou-se em indivíduos com IGT isolado ou com IGT associado a IFG. Em 2023, uma meta-análise examinou quatro ensaios envolvendo pessoas com IFG isolado, IGT isolado ou ambos.

Embora intervenções no estilo de vida tenham reduzido efetivamente o risco de diabetes naqueles com IGT, nenhum benefício claro foi observado em indivíduos com IFG isolado, sugerindo que programas estruturados para indivíduos com IFG isolado podem não ser custo-efetivos (Fig. 7).

A explicação para a falta de resposta relativa à intervenção intensiva no estilo de vida em indivíduos com IFG isolado não é clara e pode estar relacionada a diferenças na fisiopatologia entre IGT isolado e IFG isolado. 

Alterações na detecção de glicose, supressão prejudicada da glicogenólise ou captação excessiva de glicose com eficiência reduzida na síntese de glicogênio podem estar na base da patogênese do IFG isolado. Muitos indivíduos com IFG isolado também apresentam características de síndrome metabólica com resistência à insulina devido ao excesso e/ou depósito ectópico de tecido adiposo, especialmente aumento da gordura hepática. Nesses indivíduos, pode ser necessário um déficit calórico maior para reduzir o peso corporal e, assim, diminuir a progressão do IFG isolado para DM2.

Vale destacar que vários estudos mostraram que muitos indivíduos com IFG isolado podem voltar espontaneamente à normoglicemia.

Por outro lado, o IGT isolado está cada vez mais associado à resistência à insulina no músculo esquelético, além da redução da função das células β. Portanto, o treinamento físico para reduzir a resistência à insulina muscular e o uso de metformina para aumentar a secreção de insulina pós-prandial podem ser mais eficazes no IGT do que no IFG. Outra explicação — ainda não explorada — é a possibilidade de que indivíduos com IFG isolado sejam menos motivados a seguir as mudanças de estilo de vida prescritas. Existem diferenças bem documentadas nos perfis de idade e sexo entre IFG e IGT. Enquanto há uma relação clara entre idade avançada e maior prevalência de IGT, a prevalência de IFG é semelhante em todas as faixas etárias. Dada a maior conscientização em saúde em adultos mais velhos, indivíduos com IGT podem ter mais probabilidade de aderir e responder às orientações de mudança de estilo de vida.

Do ponto de vista populacional, preencher programas de intervenção com pessoas com IFG isolado pode não ter grande impacto na redução do risco de DM2. No caso de indivíduos com IFG, encorajá-los a adotar estilos de vida saudáveis pode ser suficiente, com foco no controle de outros fatores de risco, como hipertensão, para reduzir o risco de DCV. Assim, o TOTG deve ser utilizado para rastrear indivíduos com IGT para inclusão em programas estruturados de prevenção de DM2, enquanto mais pesquisas são necessárias para identificar intervenções que retardem a progressão do IFG isolado para DM2.

Intervenções farmacológicas

Diversos ensaios clínicos randomizados controlados por placebo avaliaram diferentes medicamentos (Tabela 3), incluindo metformina, troglitazona, acarbose, orlistate, pioglitazona, rosiglitazona, ramipril, voglibose, nateglinida, valsartana e liraglutida, para prevenir a progressão do pré-diabetes para o DM2. Embora alguns estudos tenham mostrado resultados favoráveis, é importante lembrar que o pré-diabetes não é universalmente aceito como uma doença. Nesse contexto, intervenções farmacológicas ou cirúrgicas permanecem não aprovadas em muitos países e a relação custo-efetividade ainda é incerta.

Metformina

Embora tenha sido demonstrado que a metformina previne a progressão para o DM2, a FDA não aprovou seu uso para essa indicação em clínicas, sendo atualmente usada off-label nos EUA e em outros países para esse fim. Nos estudos US-DPP e DPPOS, a eficácia da metformina variou, sendo maior em indivíduos com IMC ≥35 kg/m², indivíduos com IGT mais glicemia de jejum elevada, pessoas com menos de 45 anos, afro-americanos e mulheres com histórico de diabetes gestacional.

Quando o HbA1c foi utilizado para definir diabetes incidente, metformina e mudanças no estilo de vida tiveram eficácia semelhante, sem associações com a idade.

No China-DPP, que incluiu indivíduos com IGT e IFG (a maioria com IGT), metformina mais intervenção no estilo de vida foi mais eficaz do que apenas intervenção no estilo de vida, especialmente em homens, indivíduos mais jovens e com IMC mais elevado. Na análise de subgrupos, apenas os pacientes do grupo IGT demonstraram redução na incidência de DM2, com uma razão de risco de 0,83 (IC 95% 0,69–0,99).

No US-DPP, foi implementado um curto período de washout para avaliar a persistência dos efeitos da metformina após sua interrupção.

O estudo constatou que, ao interromper a metformina, a incidência de DM2 aumentou, sugerindo que grande parte de seu benefício é farmacológico e não persiste após a retirada. Ainda assim, mesmo após o washout, o grupo de intervenção apresentou uma redução de 24,9% no DM2 incidente. A duração do efeito da metformina após interrupção permanece incerta; porém, em um pequeno estudo com 20 indivíduos com IGT tratados com metformina versus 20 recebendo placebo, a metformina levou à melhora da tolerância à glicose que persistiu por até 6 meses após a interrupção.

A Associação Americana de Diabetes recomenda considerar a metformina para prevenção de DM2 em adultos de alto risco, incluindo aqueles com IGT (idades de 25–59 anos, IMC >35 kg/m²), glicemia de jejum elevada (≥6,1 mmol/l (110 mg/dl)), HbA1c alto (≥42 mmol/mol (6,0%) e histórico de diabetes gestacional, com base em evidências do US-DPP.

A metformina continua sendo uma intervenção barata, amplamente disponível e custo-efetiva para prevenção do diabetes mellitus em indivíduos de alto risco com pré-diabetes.

Embora os custos reais variem entre farmácias e coberturas de seguros, a Associação Americana de Diabetes relata que o custo médio nacional de aquisição de um suprimento de 30 dias de metformina genérica de liberação imediata 500 mg é de aproximadamente US$1, enquanto o preço médio de venda por atacado é em torno de US$87.

Em uma análise de custo-efetividade do DPP, o custo médico direto acumulado em 10 anos da metformina foi de aproximadamente US$2.300 por pessoa.

Embora avaliações detalhadas dos custos diretos para o paciente com uso de metformina em pré-diabetes sejam limitadas, as formulações genéricas são geralmente de baixo custo, embora as despesas individuais possam variar substancialmente conforme o seguro e o acesso.

Tiazolidinedionas

No US-DPP, a troglitazona foi utilizada como intervenção precoce e mostrou-se eficaz na prevenção do DM2; entretanto, a troglitazona foi descontinuada devido à toxicidade hepática (Tabela 3). O estudo TRIPOD (Troglitazone in Prevention of Diabetes), realizado em mulheres hispânicas com histórico de diabetes gestacional, mostrou uma redução de risco superior a 50% na incidência de DM2, mas foi encerrado precocemente quando o medicamento foi retirado do mercado. O estudo PIPOD (Pioglitazone In Prevention Of Diabetes), que deu seguimento ao TRIPOD, constatou que a pioglitazona preservou a função das células β, interrompeu o declínio observado no grupo placebo do TRIPOD e manteve a estabilidade da função das células β assim como a troglitazona. O ensaio ACT NOW (Actos Now for the prevention of diabetes), mostrou que a pioglitazona esteve associada a menor incidência de diabetes e maior reversão para tolerância normal à glicose em comparação com placebo (Tabela 3). No estudo DREAM (Diabetes Reduction Assessment with Ramipril and Rosiglitazone Medication), a rosiglitazona foi associada a menor incidência de diabetes em relação ao placebo.

No Canadian Normoglycaemia Outcomes Evaluation, a reversão para normoglicemia foi mais frequente no grupo metformina mais rosiglitazona do que no grupo placebo.

Por outro lado, no Beijing Prediabetes Reversion Program (BPRP), a pioglitazona não apresentou diferença em relação à intervenção no estilo de vida em termos de reversão para normoglicemia, sugerindo diferenças interétnicas nas respostas ao tratamento.

Inibidores da α-glicosidase

No estudo STOP-NIDDM (Study to Prevent Non-Insulin-Dependent Diabetes Mellitus), o grupo tratado com acarbose apresentou menor incidência de DM2 em comparação com o grupo placebo. De forma semelhante, o estudo ACE (China Acarbose Cardiovascular Evaluation) mostrou que a acarbose não apenas reduziu a progressão do diabetes mellitus, mas também aumentou a regressão para normoglicemia em indivíduos com IGT. Um estudo japonês relatou tendência semelhante com o voglibose.

Análises pós-hoc dos resultados do STOP-NIDDM sugeriram que a acarbose pode oferecer benefícios cardiovasculares em indivíduos com IGT.

Inibidores de SGLT2

Análises pós-hoc de ECRs que avaliaram os efeitos organoprotetores de inibidores de SGLT2 (como dapagliflozina e empagliflozina) em indivíduos com insuficiência cardíaca ou DRC sugeriram que esses medicamentos podem prevenir o surgimento de DM2, embora os resultados tenham sido inconsistentes.

Vale destacar que esses estudos de desfechos cardiovasculares não incluíram especificamente indivíduos com alto risco de diabetes mellitus, diferentemente dos estudos de prevenção com metformina e tiazolidinedionas.

Em uma análise agrupada dos estudos DAPA-CKD (Dapagliflozin and Prevention of Adverse Outcomes in Chronic Kidney Disease) e DAPA-HF (Dapagliflozin and Prevention of Adverse Outcomes in Heart Failure), a dapagliflozina foi associada a risco reduzido de DM2 incidente.

Os autores sugeriram que, além da perda de peso, a redução da resistência à insulina e a melhora da função das células β também podem contribuir para esse benefício.

No entanto, no EMPEROR-Preserved (Empagliflozin Outcome Trial in Patients with Chronic Heart Failure with Preserved Ejection Fraction), que recrutou participantes com insuficiência cardíaca e sem diabetes mellitus, a empagliflozina não reduziu a incidência de diabetes mellitus em comparação com placebo.

Resultados semelhantes foram relatados no EMPEROR-Reduced (Empagliflozin Outcome Trial in Patients with Chronic Heart Failure with Reduced Ejection Fraction).

Análogos de GLP1 e bi-agonistas: GLP1–GIP

Em grandes ECRs, o uso de agonistas do receptor de GLP1 e agonistas duplos GLP1–GIP para promover perda de peso teve impacto significativo na progressão do pré-diabetes (Tabela 3). No estudo SCALE (Satiety and Clinical Adiposity – Liraglutide Evidence), que avaliou os efeitos da liraglutida em pessoas com obesidade e pré-diabetes, a progressão de pré-diabetes para diabetes mellitus foi mais efetivamente retardada no grupo tratado em comparação com o placebo.

O estudo STEP-1 (Semaglutide Treatment Effect in People with Obesity-1) avaliou a eficácia da semaglutida na perda de peso em adultos com sobrepeso ou obesidade sem diabetes mellitus.

A reversão para normoglicemia foi significativamente mais frequente no grupo semaglutida do que no grupo placebo. No ensaio STEP-10, envolvendo 207 indivíduos com obesidade e pré-diabetes, a semaglutida aumentou as chances de regressão para normoglicemia em comparação com placebo.

O agonista duplo GLP1–GIP tirzepatida foi avaliado em 2.539 indivíduos com sobrepeso ou obesidade sem diabetes mellitus, dos quais 1.032 tinham pré-diabetes.

Ao final de 3 anos de seguimento, a progressão para DM2 ocorreu significativamente menos frequentemente nos participantes randomizados para tirzepatida do que naqueles que receberam placebo. A reversão para normoglicemia também foi mais frequente no grupo tirzepatida. Este estudo e outros ECRs apoiam a hipótese de que os efeitos de redução de peso da tirzepatida reduzem o risco de DM2, DCV, DRC e MASLD.

Uma revisão sistemática e meta-análise avaliou os efeitos de agonistas do receptor de GLP1 em oito ECRs (liraglutida em seis, exenatida e semaglutida em um cada).

Todos esses ECRs incluíram indivíduos com pré-diabetes (baseado em HbA1c ou OGTT). Cinco desses estudos indicaram que os agonistas do receptor de GLP1 aumentaram a probabilidade de regressão do pré-diabetes para normoglicemia em comparação com placebo (OR 4,56, IC 3,58–5,80). Em três estudos, o grupo GLP1 teve menores chances de desenvolver DM2 do que o grupo placebo (OR 0,31, IC 0,12–0,81).

Apesar desses resultados promissores confirmados em ECRs rigorosamente supervisionados, os efeitos de perda de peso foram perdidos com a descontinuação do tratamento. Dado seu alto custo, a relação custo-efetividade de agonistas de GLP1, agonistas duplos GLP1–GIP e outros medicamentos antiobesidade em desenvolvimento para prevenção e tratamento do diabetes permanece uma questão controversa.

Outros especialistas sugerem que o uso de curto prazo desses medicamentos, com reforços, pode fazer parte de uma estratégia multifatorial incluindo mudanças no estilo de vida e na dieta, embora os potenciais efeitos adversos do weight cycling (efeito sanfona) não devam ser ignorados. 

Diante do forte componente comportamental da obesidade e dos custos envolvidos na farmacoterapia de longo prazo, usar medicamentos como única estratégia para reduzir peso e prevenir diabetes mellitus e suas comorbidades provavelmente não é algo viável, sustentável ou acessível. Em vez de ‘prevenir’ o diabetes mellitus, esses medicamentos podem apenas estar ‘tratando’ a condição em um estágio mais precoce.

Vitamina D

A suplementação empírica de vitamina D pode ajudar a reduzir o risco de progressão para DM2 em adultos com pré-diabetes. Uma análise agrupada de três ECRs demonstrou que a suplementação de vitamina D não apenas retardou a progressão para DM2, mas também aumentou em 30% a probabilidade de regressão para normoglicemia em comparação com placebo.

Nas análises por intenção de tratar, a vitamina D reduziu o risco de DM2 incidente em 12% (não ajustado) e 15% (ajustado). Esses ensaios incluíram 4.190 adultos (≥18 anos) com pré-diabetes que receberam suplementação oral de vitamina D por pelo menos 2 anos. As intervenções incluíram colecalciferol (vitamina D3) no estudo Tromsø e no estudo D2d, e eldecalcitol (um análogo sintético do calcitriol) no estudo DPVD.

Embora a formulação ideal de vitamina D ainda não tenha sido determinada, o nível médio basal de 25-hidroxivitamina D entre os participantes foi de 63 nmol/l (25 ng/ml). Esses estudos mostraram que níveis sustentados mais altos de 25-hidroxivitamina D conferiram risco progressivamente menor de diabetes mellitus do que níveis endógenos mais baixos. Entretanto, um nível-alvo exato para redução ideal do risco de DM2 ainda não foi estabelecido. Outra revisão sistemática de 11 estudos, com níveis basais médios de 25-hidroxivitamina D variando de 12 a 28 ng/ml (30–70 nmol/l), também encontrou que a suplementação de vitamina D foi associada a menor risco de DM2 incidente, com risco relativo de 0,90 (IC 95% 0,81–1,00).

Dado seu baixo custo, perfil de segurança favorável e potencial para reduzir o risco de diabetes mellitus, a suplementação empírica de vitamina D pode ser uma consideração razoável para adultos com pré-diabetes.

Cirurgia metabólica

Atualmente, a cirurgia metabólica (bariátrica) é o tratamento mais eficaz para obesidade e costuma ser considerada para pessoas que não são elegíveis, recusam ou não respondem à farmacoterapia.

Indivíduos com pré-diabetes que se submetem à cirurgia metabólica têm alta probabilidade de retorno à normoglicemia, com risco reduzido de progressão para DM2, embora as taxas de sucesso variem de acordo com o tipo de cirurgia.

Em um estudo retrospectivo observacional de 4 anos, incluindo 669 indivíduos com obesidade e pré-diabetes (definido como HbA1c ≥5,7% e <6,5%) submetidos à cirurgia metabólica, as taxas de remissão do pré-diabetes — ou seja, retorno à normoglicemia — foram de 82%, 73%, 66% e 58% no primeiro, segundo, terceiro e quarto anos, respectivamente. 

Pacientes mais velhos (49–67 anos) tiveram menores chances de remissão do pré-diabetes a partir do terceiro ano de acompanhamento, em comparação com pacientes mais jovens (19–38 anos).

Em um estudo nos EUA que comparou os efeitos da cirurgia metabólica versus o cuidado usual na incidência de DM2 em indivíduos com obesidade de 21 a 65 anos, 3.060 preenchiam os critérios para pré-diabetes na linha de base. O grupo de cuidado usual teve risco relativo de progressão para DM2 de 33,7 em 1 ano (IC 95% 13,8–82,2) e de 138,8 em 3 anos (IC 95% 19,3–992,7) em comparação com o grupo cirúrgico.

Estudos de longo prazo também sustentam o custo-benefício da cirurgia metabólica em comparação com intervenções de estilo de vida e medicamentos. Isso se deve principalmente aos efeitos sustentados na perda de peso, evitando a escalada de tratamentos e custos de medicamentos. As taxas de progressão para DM2 foram menores 5 anos após a cirurgia em pacientes que perderam >25% do peso inicial do que naqueles que perderam <15% do peso durante o primeiro ano pós-operatório (4,7% versus 14,0%; P <0,001).
Essa progressão foi independente do peso inicial, idade e sexo.

Perspectivas

O pré-diabetes é uma condição heterogênea que aumenta o risco de DM2, bem como de doenças cardiovasculares (DCV) e outras complicações metabólicas. As discussões sobre os critérios diagnósticos e sobre a melhor ferramenta ou estratégia para identificar indivíduos com pré-diabetes continuam em andamento. 

Mais pesquisas são necessárias para identificar modalidades mais simples, como biomarcadores que não exijam jejum, para a detecção de pré-diabetes. As evidências atuais também sugerem que os dois fenótipos mais comuns de pré-diabetes — a glicemia de jejum alterada (IFG) e a tolerância à glicose diminuída (IGT) — têm bases fisiopatológicas diferentes e podem responder de forma distinta às intervenções. Em especial, são necessários esforços para entender por que a modificação do estilo de vida parece relativamente ineficaz na IFG e qual seria a estratégia de intervenção ideal para esses indivíduos.

Embora a mudança de estilo de vida permaneça a intervenção de escolha para a maioria das pessoas com pré-diabetes (especialmente IGT), o advento das terapias mais recentes para perda de peso (farmacológicas e cirurgia metabólica) oferece agora opções adicionais para alterar favoravelmente a história natural dessa condição. No entanto, essas terapias não podem ser recomendadas de forma universal, dado o tamanho do problema do pré-diabetes e suas implicações em termos de custo, segurança e aceitação pelo paciente. Além disso, muitos indivíduos não europeus apresentam pré-diabetes e DM2 sem obesidade, o que pode refletir outros mecanismos fisiopatológicos, como disfunção predominante das células β, que podem responder menos a estratégias centradas na redução de peso.

São necessárias mais pesquisas nesses grupos, que representam a maioria da população global com diabetes e pré-diabetes.

Os indivíduos que mais provavelmente se beneficiarão de qualquer forma de intervenção são aqueles com alto risco de progressão para DM2 e aqueles com indicações adicionais, como obesidade, DCV ou DRC. 

Dada a heterogeneidade em termos de fisiopatologia, história natural e respostas ao tratamento, mais pesquisas são necessárias para aumentar a precisão da previsão e da prevenção, estratificando os indivíduos com base no risco genético ou metabólico, para que as intervenções sejam direcionadas a quem mais possa se beneficiar. 

Sustentabilidade e preferências individuais também precisam ser consideradas, especialmente em contextos com recursos limitados, onde faltam dados sobre os benefícios das intervenções. Apesar desses desafios, enfrentar o problema global do pré-diabetes abre uma janela de oportunidade não apenas para prevenir o diabetes mellitus, mas também as comorbidades associadas, como as DCV.


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segunda-feira, 5 de maio de 2025

Qual o melhor exercício físico para o diabético ? Por Dra. Lia Bataglini (Nutróloga)

O exercício físico é uma parte essencial do manejo do diabetes, sendo importante tanto para o controle glicêmico quanto para a redução dos riscos cardiovasculares e melhora do bem-estar geral. Além disso, o exercício auxilia na perda de peso e na prevenção de complicações relacionadas ao diabetes.

Recomendações gerais

Adultos com Diabetes Tipo 1 e Tipo 2: Devem realizar ao menos 150 minutos de atividade aeróbica de intensidade moderada a vigorosa por semana, distribuídos em pelo menos três dias, sem mais de dois dias consecutivos sem atividade. Para indivíduos fisicamente aptos, 75 minutos semanais de exercício vigoroso ou intervalado podem ser suficientes.
Treinamento Resistido: Deve ser realizado 2–3 vezes por semana, em dias não consecutivos.
Flexibilidade e Equilíbrio: São recomendados especialmente para idosos, incluindo atividades como yoga e tai chi.
Atividades Cotidianas: Pessoas que não atingem as recomendações mínimas devem ser incentivadas a aumentar gradualmente o nível de atividade física (caminhadas, jardinagem, natação, dança etc.). Longos períodos sedentários devem ser interrompidos a cada 30 minutos para melhorar o controle glicêmico.
 
Benefícios do Exercício

Redução do risco cardiovascular, melhora da aptidão cardiorrespiratória, melhora da sensibilidade à insulina, força muscular e controle do peso. Também auxilia na redução dos níveis de HbA1c, triglicerídeos, colesterol LDL e circunferência abdominal. Melhora na mobilidade, especialmente em pessoas com excesso de peso.
 
População Jovem

Crianças e adolescentes com diabetes tipo 1 ou 2 devem realizar pelo menos 60 minutos diários de atividade aeróbica moderada a vigorosa, além de atividades de fortalecimento muscular e ósseo pelo menos três vezes por semana. O tempo sedentário, como uso recreativo de telas, deve ser limitado a menos de 2 horas por dia.
 
Exercícios e Complicações

Retinopatia: Atividades vigorosas podem ser contra indicadas para pacientes com retinopatia proliferativa ou grave. A consulta com um oftalmologista é recomendada antes de iniciar atividades intensas.
Neuropatia Periférica: É importante garantir o uso de calçados adequados e a inspeção diária dos pés. Exercícios de intensidade moderada como caminhadas podem ser seguros.
Neuropatia Autonômica: A avaliação cuidadosa do risco cardiovascular é essencial, especialmente para pacientes com respostas cardíacas reduzidas ou hipotensão postural.
 
Hipoglicemia

Pacientes em uso de insulina ou secretagogos devem monitorar os níveis de glicose antes e após o exercício. Caso os níveis de glicose estejam abaixo de 90 mg/dL, a ingestão de carboidratos pode ser necessária para evitar hipoglicemia.

Exercício em Tratamentos com Fármacos para Controle de Peso e Cirurgia Metabólica

Indivíduos tratados com farmacoterapia ou submetidos a cirurgia metabólica devem priorizar exercícios de fortalecimento muscular para manutenção da massa magra.

Por fim,

O exercício físico é parte essencial do manejo do diabetes e deve ser recomendado para todos os indivíduos com a condição, salvo contra indicações específicas. A adesão às recomendações deve ser incentivada e adaptada às necessidades e capacidades individuais.


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sexta-feira, 11 de abril de 2025

Uma forma atípica de diabetes em pacientes com baixo IMC (Diabetes tipo 5)

OBJETIVO
A diabetes em indivíduos com baixo IMC (<19 kg/m²) é reconhecida há mais de 60 anos como uma condição prevalente em países de baixa e média renda (PBMR), tendo sido formalmente classificada como “diabetes mellitus relacionado à desnutrição” pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 1985. Desde que a OMS retirou essa categoria em 1999, nosso objetivo foi definir as características metabólicas desses indivíduos para estabelecer que se trata de uma forma distinta de diabetes.

DESENHO DO ESTUDO E MÉTODOS
Estudos metabólicos de ponta foram utilizados para caracterizar indivíduos indianos com “diabetes de baixo IMC” (LD), nos quais todas as formas conhecidas de diabetes foram excluídas por meio de análise imunogenética. Eles foram comparados com grupos demograficamente pareados: um grupo com diabetes tipo 1 (DM1), um grupo com diabetes tipo 2 (DM2) e um grupo sem diabetes. A secreção de insulina foi avaliada por desconvolução do peptídeo C. A sensibilidade hepática e periférica à insulina foi analisada com estudos de clamp hiperglicêmico-euglicêmico pancreático em etapas. O conteúdo de lipídios hepáticos e miocelulares foi avaliado por espectroscopia de ressonância magnética nuclear de hidrogênio (¹H-RMN).

RESULTADOS
A resposta secretória total de insulina foi menor no grupo LD em comparação com o grupo magro sem diabetes e com o grupo DM2. A produção endógena de glicose foi significativamente menor no grupo LD em relação ao grupo DM2 (média ± erro padrão da média: 0,50 ± 0,1 vs. 0,84 ± 0,1 mg/kg·min; P < 0,05). A captação de glicose foi significativamente maior no grupo LD em comparação com o grupo DM2 (10,1 ± 0,7 vs. 4,2 ± 0,5 mg/kg·min; P < 0,001). O tecido adiposo visceral e os lipídios hepatocelulares foram significativamente menores no grupo LD do que no grupo DM2.

CONCLUSÕES
Este é o primeiro estudo a demonstrar que indivíduos com LD em PBMR apresentam um perfil metabólico único, sugerindo que se trata de uma entidade distinta que merece investigação adicional.

Introdução

A diabetes e suas complicações atingiram proporções epidêmicas em todo o mundo. A estimativa é que a carga global de diabetes em adultos aumente de 537 milhões de casos em 2021 para 783 milhões até 2045, com cerca de 80% dos afetados vivendo em países de baixa e média renda (PBMR). A existência de uma forma única de diabetes em indivíduos com baixo IMC foi relatada pela primeira vez por Hugh-Jones em 1955, ao encontrar um grupo de pacientes na Jamaica que não se encaixavam nas descrições clássicas de diabetes tipo 1 (DM1) ou tipo 2 (DM2). Desde então, casos de indivíduos com baixo IMC e diabetes (LD) foram documentados em diversos outros PBMR, incluindo Bangladesh, Nigéria, Índia, Etiópia, Coreia, Tailândia e Uganda, com relatos iniciais da Índia sugerindo uma prevalência de aproximadamente 23%. Essa entidade foi formalmente reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 1985 como uma forma distinta de diabetes, denominada “diabetes mellitus relacionado à desnutrição” (MRDM, na sigla em inglês).

Relatos iniciais dessa forma de diabetes documentaram uma série de características comuns, incluindo histórico de desnutrição na infância ou durante a gestação, com persistência de IMC baixo (tipicamente <19 kg/m²) na vida adulta; início precoce da diabetes (idade <30 anos); predominância masculina (~85%); ausência de cetonúria ou cetose, apesar de hiperglicemia descontrolada (glicemia de jejum >200 mg/dL); altas necessidades de insulina (>60 UI/dia ou 2,0 UI/kg/dia); e aumento do risco de complicações relacionadas à diabetes. Embora as elevadas necessidades de insulina nesses indivíduos muito magros sugiram resistência à insulina, isso nunca foi estudado de forma rigorosa.

O relatório da OMS de 1999 recomendou a exclusão do MRDM da classificação oficial da diabetes, por falta de evidência robusta de que a desnutrição ou a deficiência proteica, por si só, causem diabetes. No entanto, dados epidemiológicos subsequentes continuaram a apoiar essa entidade como uma forma única e relativamente prevalente da doença. As estimativas de MRDM entre pacientes com diabetes na Índia e no Irã variam entre ~6% e 21%, após exclusão de casos com patologias pancreáticas visíveis . Maiti et al. relataram recentemente que indivíduos com baixo peso (IMC <18,5 kg/m²) e diabetes em áreas rurais da Índia apresentavam o dobro de chances de glicemia >270 mg/dL em comparação com aqueles com IMC normal ou elevado. Entre mais de 4.700 indivíduos com diabetes insulino-dependente em áreas rurais da Etiópia, o IMC médio foi de 16,7 kg/m² para homens e 16,5 kg/m² para mulheres, com uma predominância masculina de 2 para 1, e quase todos os pacientes eram resistentes à cetose. Os investigadores sugeriram que a maioria dos indivíduos estudados na Etiópia provavelmente tinha uma forma não autoimune de diabetes, proposta como MRDM.

Em uma revisão sistemática recente sobre formas atípicas de diabetes, os autores observaram que a prevalência de DM1 pode estar sendo superestimada entre indivíduos com baixo peso em PBMR, cujas características clínicas seriam consistentes com a definição original de MRDM. Isso sugere que muitos desses indivíduos podem estar sendo tratados de forma inadequada e destaca a necessidade de mais estudos para caracterizar melhor a diabetes em contextos com poucos recursos.

Pacientes com LD oriundos de PBMR frequentemente têm acesso limitado a testes apropriados, podendo ser erroneamente classificados como portadores de DM1. Isso tem implicações terapêuticas relevantes, considerando que o tratamento para DM1 é complexo, requer múltiplas aplicações diárias de insulina e manejo intenso de diversos parâmetros clínicos. Isso é especialmente relevante diante de dificuldades comuns nesses países, como o custo, o acesso e o armazenamento adequado da insulina. Além disso, a insulinoterapia pode levar à hipoglicemia, principalmente em pacientes com insegurança alimentar. Assim, uma avaliação correta dos defeitos metabólicos desses pacientes permitiria aos profissionais de saúde personalizar o tratamento de forma mais apropriada e, possivelmente, evitar o uso desnecessário de insulina.

Neste estudo, portanto, utilizamos metodologias de ponta para definir as características metabólicas dessa entidade ainda pouco compreendida, o MRDM, realizando uma caracterização fenotípica rigorosa de um grupo de indivíduos (LD) que atendem aos critérios da OMS para essa condição. Esse estudo foi viabilizado de forma única no Christian Medical College, em Vellore, na Índia, onde tais avaliações sofisticadas puderam ser realizadas em pacientes com suspeita de MRDM. Pesquisas como essa são essenciais para o desenvolvimento futuro de estratégias terapêuticas adequadas para essa condição ainda pouco compreendida.

Conclusões

Este é o primeiro estudo a utilizar técnicas de ponta para caracterizar de forma abrangente a secreção de insulina, a sensibilidade hepática e periférica à insulina, a composição corporal total, o volume de tecido adiposo abdominal e os teores lipídicos hepáticos e intramiocelulares em indivíduos com LD. Também comparamos indivíduos com LD com sujeitos com DM1, DM2 e controles sem diabetes com IMC semelhante.

Antes do procedimento, o controle glicêmico nos grupos LD e DM2 era semelhante, conforme indicado pelos níveis de frutosamina, sugerindo ausência de glucotoxicidade aguda. No entanto, a capacidade secretória de insulina foi substancialmente menor no grupo LD em comparação aos indivíduos com DM2 e aos controles sem diabetes, embora ainda maior do que nos sujeitos com DM1. É relevante destacar que o grupo LD apresentou valores médios significativamente mais baixos do índice de Matsuda, do índice insulinogênico e dos índices de disposição em comparação com o grupo magro sem DM. Consistente com relatos anteriores, os indivíduos com DM2 demonstraram perda da secreção de insulina de primeira fase e retorno lento aos níveis basais. Os valores médios do ISI e do índice de Matsuda foram maiores no grupo LD do que no grupo DM2, o que pode ser atribuído a um defeito predominante na secreção de insulina e à provável ausência de resistência endógena à insulina no grupo LD. Notavelmente, no grupo com DM2, a característica predominante é a resistência à insulina, levando a valores médios significativamente mais baixos de ISI e índice de Matsuda e a valores mais altos no HOMA-IR.

No procedimento de clamp hiperinsulinêmico-euglicêmico, foi observada uma correlação positiva significativa entre o tecido adiposo subcutâneo (SAT) e a produção endógena de glicose (EGP) na fase de baixa insulina, fornecendo evidências sobre o possível papel do SAT na redução da sensibilidade à insulina no grupo LD. Notavelmente, a sensibilidade periférica à insulina (valor de Rd) no grupo LD não diferiu da observada no grupo DM1 nem nos controles magros, sugerindo que o grupo LD era mais sensível à insulina do que o grupo com DM2.

Dada a escassez de estudos que tenham seguido rigorosamente a definição de MRDM, a taxa de prevalência, a fisiopatologia e o perfil metabólico dessa condição permanecem mal compreendidos . Observações clínicas anteriores caracterizavam pacientes magros com diabetes como resistentes à insulina, com base na necessidade de altas doses de insulina, apesar do baixo IMC. Uma característica marcante descrita nesses estudos é a completa ausência de cetose ou cetonúria, atribuída à mobilização tardia de ácidos graxos livres (AGLs) do tecido adiposo e à supressão do glucagon pós-prandial, independentemente da deficiência periférica de insulina.

Outros estudos sugeriram um defeito na secreção de insulina, com valores reduzidos de insulina e peptídeo C em jejum, e resposta comprometida após sobrecarga oral de glicose ou após administração intravenosa de tolbutamida, embora as metodologias rigorosas aplicadas sejam exclusivas deste estudo. Em um estudo recente conduzido em uma coorte sueca, voltado à identificação de subgrupos de diabetes de início na idade adulta, pesquisadores relataram um novo agrupamento de pacientes com diabetes severamente deficiente em insulina (SIDD), caracterizado por títulos negativos de anticorpos anti-GAD-65, IMC relativamente baixo (~28,9 kg/m²), baixa secreção de insulina, início mais precoce da doença e controle metabólico ruim. 

Esses pacientes necessitavam de insulinoterapia, além de medicamentos orais para controle glicêmico, e a maioria era resistente à cetose.

No entanto, nesse estudo, não foram avaliados os padrões de resistência à insulina com técnicas fisiológicas específicas, nem os perfis de composição corporal, e os mecanismos etiológicos do SIDD ainda precisam ser esclarecidos.

Embora nossos sujeitos com LD também apresentassem defeitos predominantes na secreção de insulina, foram caracterizados por IMC muito baixo (média de 18,3 kg/m²) e pertenciam à etnia indo-asiática. Os resultados de nossas avaliações rigorosas da ação da insulina e da composição corporal total, incluindo lipídios hepáticos e volumes de tecido adiposo abdominal, revelaram um fenótipo metabólico único, distintamente diferente do DM2. Esse fenótipo de LD provavelmente também difere do que foi recentemente chamado de SIDD em uma coorte de indianos asiáticos, que apresentava um IMC bem mais alto (24,9 kg/m²). No entanto, tanto as observações de Ahlqvist et al. quanto os resultados atuais reforçam a necessidade de revisitar a classificação do diabetes e identificar novos subgrupos da doença.

As metodologias de ponta utilizadas neste estudo avançam em relação a relatos anteriores que sugeriam uma capacidade secretória de insulina reduzida e resistência à cetose em indivíduos com LD. Os sujeitos com LD neste estudo apresentaram níveis basais e pós-carga glicêmica médios mais altos de insulina e peptídeo C, além da ausência de cetose, quando comparados aos indivíduos com DM1. Isso sugere que a secreção de insulina nesses indivíduos era suficiente para inibir a cetogênese, mas insuficiente para evitar excursões glicêmicas pós-prandiais.

Especula-se que esse defeito na capacidade secretória de insulina possa estar relacionado à redução da massa de células β, uma vez que padrões epidemiológicos mostram que o LD predomina entre populações de baixa renda e áreas rurais de países em desenvolvimento, onde dietas pobres em proteína são comuns. Em nosso estudo, os participantes eram índios asiáticos recrutados de áreas rurais, onde a dieta básica é à base de arroz e trigo, sendo que o grupo LD apresentou uma ingestão proteica significativamente menor em comparação com o grupo magro sem DM.

A desnutrição proteica materna já foi estudada em roedores, com relatos de que os filhotes dessas mães apresentam menor massa de células β e reduzida capacidade de regeneração dessas células. Notavelmente, embora a desnutrição ou inanição nos primeiros anos de vida possa predispor ao DM2 na idade adulta, o que distingue o LD do DM2 é que os indivíduos com LD permanecem com baixo peso ao longo do desenvolvimento. Em humanos, recém-nascidos pequenos para a idade gestacional tendem a ter menor fração de células das ilhotas pancreáticas e menos vascularização pancreática.

Embora alguns relatos clínicos tenham sugerido que pacientes com LD são resistentes à insulina, há escassez de estudos dinâmicos e sofisticados avaliando essa sensibilidade nesse grupo. Garg et al. (52) realizaram previamente clamps hiperinsulinêmico-euglicêmicos em indivíduos com LD no norte da Índia, mas sem corrigir a glucotoxicidade ou utilizar traçadores de glicose para medir a sensibilidade hepática e periférica à insulina. Como há fortes evidências em animais e humanos de que a correção da hiperglicemia melhora a secreção e a resistência à insulina, corrigimos a hiperglicemia para eliminar o efeito da toxicidade da glicose. Os resultados indicam que a sensibilidade hepática e periférica à insulina no grupo LD foi semelhante à dos grupos com DM1 e não diabéticos magros, enquanto os sujeitos com DM2 eram mais resistentes à insulina.

A análise da composição corporal revelou que a massa magra total e a massa magra troncular foram significativamente menores no grupo LD em comparação com o grupo magro sem DM, motivo pelo qual corrigimos a captação de glicose com base na massa magra. Os triglicerídeos séricos e a razão VAT/SAT foram mais altos no grupo LD do que no grupo magro sem DM, e o volume de gordura visceral (VAT) foi mais alto do que no grupo com DM1. Além disso, o conteúdo de lipídios hepáticos no grupo LD foi variável, mas significativamente menor que no grupo DM2, sendo semelhante ao dos grupos DM1 e não DM. Também observamos considerável variabilidade nas medidas de composição corporal no grupo LD, embora o estudo não tenha sido dimensionado para investigar correlações entre essas medidas e a sensibilidade à insulina no próprio grupo LD.

Em um estudo com indivíduos normoglicêmicos e baixo IMC (média de 21,8 kg/m²) que haviam sofrido desnutrição no primeiro ano de vida, esses sujeitos apresentaram menor sensibilidade à insulina e maior volume de gordura abdominal. Estimou-se que a gordura abdominal explicava 65% da variância na sensibilidade à insulina desses indivíduos. Hipotetiza-se que a desnutrição fetal leve a um acúmulo de gordura visceral em indivíduos magros, promovendo maior reserva de glicose nesse tecido e em outros tecidos sensíveis à insulina. No entanto, são necessários estudos funcionais com biópsias de gordura visceral para determinar se os volumes aumentados de VAT contribuem para a menor sensibilidade periférica à insulina em alguns indivíduos com LD.

Embora a associação entre VAT e disfunção de células β e resistência à insulina seja bem documentada em sujeitos com DM2 com sobrepeso ou obesidade, seu papel potencial no LD deve ser explorado em estudos futuros, incluindo avaliação de adipocinas, citocinas inflamatórias e biópsias de gordura.

Este estudo fornece insights importantes e únicos sobre as características metabólicas da pouco compreendida entidade MRDM, por meio de uma rigorosa “fenotipagem” com metodologias de ponta, em indivíduos que atendem à classificação da OMS para essa condição. Foi realizado no CMC, o único centro na Índia com capacidade para executar esses estudos sofisticados. A complexidade dos estudos metabólicos limitou o tamanho da amostra e impediu a realização simultânea de estudos genéticos de grande escala. Análises futuras com amostras maiores podem ajudar a explorar a base genética dessa condição. Também são necessários estudos adicionais para caracterizar melhor esse fenótipo único e formular estratégias terapêuticas baseadas em evidências. Considerando os desafios de custo e acesso à insulina, especialmente em países de baixa e média renda, minimizar ou evitar o uso de insulina quando clinicamente apropriado seria benéfico. Dada a deficiência secretória de insulina, ainda é incerto se, e em que medida, os secretagogos de insulina seriam eficazes no controle glicêmico desses indivíduos.

Apesar dos pontos fortes, este estudo apresenta várias limitações. As observações foram transversais, não permitindo estabelecer relações de causa e efeito. Além disso, a amostra incluiu apenas participantes do sexo masculino, o que impede avaliar o perfil metabólico de mulheres com LD. Estudar os hormônios incretínicos e os níveis de glucagon nesse grupo provavelmente também traria mais insights sobre a etiologia metabólica do fenótipo. A comparação entre os pesos ao nascimento dos grupos do estudo não foi possível, já que a maioria dos sujeitos era de áreas rurais da Índia e nascidos em casa ou em centros de saúde primários há mais de três décadas, sem documentação oficial do peso ao nascer. Ainda assim, este é o primeiro estudo a oferecer uma avaliação abrangente das características metabólicas únicas de pacientes com LD.

Em resumo, este estudo é o primeiro a avaliar de forma abrangente o perfil metabólico de indivíduos com LD, negativo para autoanticorpos, resistentes à cetose e sem complicações microvasculares ou macrovasculares significativas, em comparação com indivíduos com DM1 e DM2 bem definidos na Índia. Após a correção da toxicidade glicêmica, esse grupo único apresentou um fenótipo fundamentalmente distinto de DM1 ou DM2. Especificamente, os resultados demonstram que a principal característica fisiológica do LD é um defeito na capacidade secretória de insulina — e não resistência à insulina, como sugerido anteriormente. Além disso, o DM2 é caracterizado por aumento da produção hepática de glicose e redução da captação periférica, o que não é observado no LD, reforçando que o LD provavelmente não é um subtipo de DM2. Ainda há muito a ser aprendido sobre essa entidade metabólica distinta — incluindo sua epidemiologia, fisiopatologia, história natural e estratégias terapêuticas ideais — especialmente em contextos clínicos de poucos recursos nos países de baixa e média renda.

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Artigo original: https://diabetesjournals.org/care/article/45/6/1428/146920/An-Atypical-Form-of-Diabetes-Among-Individuals

domingo, 6 de abril de 2025

O que o diabético pode comer? Por Dra. Lia Bataglini (Nutróloga)


Isso é muito comum, mas essa pergunta é mais fácil de ser respondida do que vocês imaginam. A alimentação no paciente diabético deve manter, assim como de todo mundo, um padrão saudável, que seria sem excessos calóricos, evitando o consumo de ultraprocessados, rica em folhas, vegetais e frutas, priorizando alimentos in natura e com consumo reduzido de açúcares. Como um extra, recomenda-se priorizar vegetais não ricos em amido e preferir o consumo de frutas inteiras.

Para continuar esse texto, eu vou utilizar de base um documento da ADA (American Diabetes Association), que se chama “Facilitando comportamentos positivos de saúde e bem-estar para melhorar os resultados de saúde: Padrões de cuidados em diabetes — 2025”.

A ADA enfatiza que não existe uma proporção ideal de carboidratos, proteínas ou gorduras para pessoas com diabetes, e sua distribuição deve ser individualizada considerando padrões alimentares atuais, preferências e metas metabólicas.

Diversos padrões alimentares podem ser eficazes no manejo do diabetes, incluindo a dieta Mediterrânea, DASH, com baixo teor de gordura, com restrição de carboidratos, vegetarianas e veganas. A recomendação é focar em aspectos comuns entre essas dietas, como consumo de vegetais sem amido, frutas inteiras, legumes, grãos integrais, nozes, sementes e laticínios com baixo teor de gordura, e minimizar o consumo de carne vermelha, bebidas adoçadas, doces, grãos refinados e alimentos ultraprocessados.

Em relação às abordagens de planejamento alimentar, estudos indicam que não há diferença significativa na eficácia da contagem de carboidratos comparada a outros métodos como índice glicêmico e porções fixas de carboidratos. O método do prato para diabetes, que sugere dividir um prato de 9 polegadas em vegetais sem amido (metade), proteínas (um quarto) e carboidratos (um quarto), é uma abordagem prática e eficaz para muitos pacientes.

Novas tecnologias, como aplicativos e monitorização contínua da glicose, podem facilitar o planejamento alimentar individualizado, diminuindo a necessidade de contagem precisa de carboidratos e permitindo abordagens mais personalizadas.

A alfabetização alimentar e a numeracia em saúde são elementos importantes a serem considerados na escolha da abordagem de planejamento alimentar adequada para cada pessoa com diabetes.

No próximo texto falaremos especificamente sobre carboidratos, proteínas, gorduras, sódio, alguns micronutrientes e álcool. 

(disponível: https://doi.org/10.2337/dc25-S005)


Como disse, continuaremos o tema sobre diabetes e alimentação, mas agora dividiremos em tópicos de macronutrientes, micronutrientes e outros, começando pelo: 

Carboidratos (CHO)

Estudos não são conclusivos sobre a quantidade ideal de ingestão de carboidratos para pessoas com diabetes. Contudo, o monitoramento da ingestão de carboidratos é essencial para o controle glicêmico em diabetes tipo 1 e tipo 2.

Dieta com baixo ou muito baixo teor de carboidratos pode reduzir a hemoglobina glicada (HbA1c) e diminuir a necessidade de medicamentos em diabetes tipo 2, principalmente a curto prazo. Porém, os resultados são menos consistentes a longo prazo e algumas dietas, como a cetogênica, podem aumentar o colesterol LDL sem melhorar significativamente a HbA1c quando comparadas à dieta mediterrânea com baixo carboidrato.

É importante destacar que planos alimentares com muito baixo teor de carboidratos devem ser supervisionados por profissionais de saúde, especialmente em indivíduos com uso de insulina ou outras medicações como inibidores de SGLT2, e não são recomendados para grávidas, lactantes, crianças, pessoas com doença renal ou transtornos alimentares.

Independentemente da quantidade de carboidratos, recomenda-se focar em carboidratos de alta qualidade, ricos em fibras e minimamente processados. A ingestão adequada de fibras (mínimo de 14g/1.000 kcal) está associada à menor mortalidade e risco de diabetes tipo 2.

Por fim, o uso do índice glicêmico e carga glicêmica como ferramenta é complexo, com resultados variados. Contudo, dietas ricas em fibras e alimentos de baixo índice glicêmico são recomendadas.

Proteínas (PTN)

Não há evidências conclusivas de que ajustar a ingestão diária de proteína acima ou abaixo das recomendações gerais (0,8–1,5 g/kg de peso corporal/dia ou 15–20% das calorias totais) melhore o controle glicêmico ou reduza o risco cardiovascular. Contudo, ingestões ligeiramente mais altas de proteína (20–30%) podem favorecer o controle do diabetes tipo 2 por promover maior saciedade.

A restrição proteica para indivíduos com doença renal crônica (DRC) relacionada ao diabetes não é recomendada abaixo de 0,8 g/kg, pois pode aumentar o risco de desnutrição sem beneficiar o controle glicêmico ou cardiovascular.

A substituição de proteínas animais por vegetais é associada a menor risco de mortalidade cardiovascular e por todas as causas, com pequenas melhorias na HbA1c e glicemia de jejum. Proteínas vegetais são mais ricas em fibras e pobres em gorduras saturadas.

Gorduras (Lipídios - LIP)

Não há uma porcentagem ideal de calorias provenientes de gordura para pessoas com diabetes. O tipo de gordura é mais relevante que a quantidade total para o controle glicêmico e o risco cardiovascular. É recomendado limitar o consumo de gorduras saturadas e evitar gorduras trans.

O padrão alimentar mediterrâneo, rico em azeite de oliva, frutas, vegetais, grãos integrais e oleaginosas, mostrou benefícios no controle glicêmico e melhora do perfil lipídico.

A substituição de gorduras saturadas por gorduras poliinsaturadas ou monoinsaturadas, e não por carboidratos refinados, é benéfica para a saúde cardiovascular. Suplementos de ácidos graxos ômega-3 não mostraram benefícios claros para o controle glicêmico.

Sódio (Na)

O consumo de sódio deve ser limitado a menos de 2.300 mg/dia, pois sua ingestão pode interferir no metabolismo da glicose e afetar a função renal. A principal fonte de sódio na dieta são os alimentos processados e ultraprocessados, cujo consumo deve ser evitado.

Micronutrientes e outros suplementos:

O uso de suplementos alimentares é comum entre pessoas com diabetes, embora não haja evidências de benefícios sem deficiências específicas. Suplementos antioxidantes, como vitaminas E e C, não são recomendados, e o β-caroteno pode aumentar o risco de câncer de pulmão e mortalidade cardiovascular. A suplementação universal de vitamina D não é indicada sem deficiência comprovada. Além disso, não existem evidências suficientes para justificar o uso rotineiro de ervas e micronutrientes, como canela, curcumina, aloe vera e cromo, para controle glicêmico. No caso da metformina, é importante monitorar os níveis de vitamina B12 em pacientes com anemia ou neuropatia periférica. Multivitamínicos podem ser necessários para grupos específicos, como gestantes, idosos e vegetarianos. 


Lembre-se: o diabetes é uma condição séria, mas com acompanhamento médico adequado, é possível mantê-lo bem controlado, prevenindo complicações a curto, médio e longo prazo. Em alguns casos, é possível até alcançar a remissão da doença. Conte com um bom nutrólogo ao seu lado nessa jornada.

(disponível: https://doi.org/10.2337/dc25-S005)


Conforme prometido, tínhamos combinado um resumo das principais orientações nutricionais, certo?!

Antes, vou deixar as principais orientações gerais:

  • Fornecer tratamento de controle de peso com base em nutrição, atividade física e terapia comportamental para todas as pessoas com sobrepeso ou obesidade, visando perda de peso de pelo menos 3–7%.
  • Para prevenção e controle do diabetes em pessoas com pré-diabetes ou diabetes, recomende planos de refeições individualizados que levem em consideração a qualidade dos nutrientes, o total de calorias e as metas metabólicas, pois os dados não dão suporte a um padrão específico de macronutrientes.
  • Os padrões alimentares devem enfatizar os princípios nutricionais essenciais (inclusão de vegetais sem amido, frutas inteiras, legumes, proteínas magras, grãos integrais, nozes e sementes, e laticínios com baixo teor de gordura ou alternativas não lácteas) e minimizar o consumo de carne vermelha, bebidas adoçadas com açúcar, doces, grãos refinados, alimentos processados ​​e ultraprocessados ​​em pessoas com pré-diabetes e diabetes.
  • Considere reduzir a ingestão geral de carboidratos para adultos com diabetes para melhorar a glicemia, pois essa abordagem pode ser aplicada a uma variedade de padrões alimentares que atendem às necessidades e preferências individuais. 
  • Os profissionais de saúde devem perguntar sobre a ingestão de suplementos alimentares e aconselhar conforme necessário. A suplementação com micronutrientes (por exemplo, vitaminas e minerais, como magnésio ou cromo) ou ervas ou especiarias (por exemplo, canela e aloe vera) para benefícios glicêmicos não é recomendada.
  • Aconselhe contra a suplementação de β-caroteno, pois há evidências de danos para certos indivíduos e não confere nenhum benefício. 
  • Aconselhe adultos com diabetes e aqueles em risco de diabetes que consomem álcool a não exceder os limites diários recomendados.
  • Aconselhe as pessoas com diabetes a limitar o consumo de sódio a <2.300 mg/dia, conforme clinicamente apropriado, e que a melhor maneira de conseguir isso é limitando o consumo de alimentos processados.
  • Aconselhe pessoas com pré-diabetes e diabetes que água é recomendada em vez de bebidas adoçadas nutritivas e não nutritivas. Aconselhe pessoas com diabetes e aquelas em risco de diabetes que adoçantes não nutritivos podem ser usados ​​em vez de produtos adoçados com açúcar se consumidos com moderação e a curto prazo para reduzir a ingestão geral de calorias e carboidratos.
  • Rastrear pessoas com diabetes e aquelas em risco de diabetes para desnutrição, especialmente aquelas que passaram por cirurgia metabólica e aquelas que estão sendo tratadas com terapias farmacológicas para perda de peso. “

E aqui são os comportamentos nutricionais para incentivar:

• Vegetais — especialmente vegetais sem amido, de cor verde-escura, vermelha e laranja; frescos, congelados ou enlatados com baixo teor de sódio são opções de vegetais aceitáveis. 

• Leguminosas — feijões secos, ervilhas e lentilhas. 

• Frutas — especialmente frutas inteiras — frescas, congeladas ou enlatadas em suco próprio (ou sem adição de açúcar) são todas opções de frutas aceitáveis. 

• Alimentos integrais — quando culturalmente apropriado, versões integrais de alimentos comumente consumidos, como pães ou massas 100% integrais e arroz integral. Quando não for culturalmente apropriado, concentre-se mais no controle das porções. 

• Alimentos com pelo menos 3 g de fibras por porção, o que geralmente indica um alimento mais rico em fibras. 

• A água deve ser a principal bebida de escolha. 

• Para indivíduos que não preferem água pura, alternativas sem calorias são a próxima melhor escolha. As opções incluem adicionar fatias de limão, lima ou pepino à água; água com gás sem calorias ou águas saborizadas sem calorias; bebidas carbonatadas sem calorias, etc. 

• Proteínas de origem vegetal podem incluir leguminosas (por exemplo, soja, feijão-fradinho, feijão-preto, grão-de-bico, ervilhas secas e lentilhas), nozes e sementes. 

• Carnes e aves devem ser frescas, congeladas ou enlatadas com baixo teor de sódio e em formas magras (por exemplo, peito de frango e peru moído). 

• Peixes gordurosos selvagens saudáveis ​​para o coração, como salmão, atum, sardinha e cavala. Frescos, congelados ou enlatados com baixo teor de sódio são todas opções aceitáveis. 

• Use ervas (por exemplo, manjericão, erva-doce, hortelã, salsa, alecrim e tomilho) e especiarias (por exemplo, canela, garam masala, gengibre, pimenta e açafrão) para temperar alimentos em vez de sal ou preparações que contenham sal. 

• Incorpore cebola, alho, aipo, cenoura e outros vegetais como base para preparar vários alimentos caseiros. 

• Cozinhe com óleo vegetal (por exemplo, canola e azeite) no lugar de gorduras ricas em gordura saturada (por exemplo, manteiga, gordura vegetal, banha de porco e óleo de coco). 

• Prepare as refeições planejando as refeições da semana, fazendo compras de supermercado com uma lista e cozinhando em um dia de folga para que haja refeições caseiras prontas para comer e reaquecer esperando na geladeira ou no freezer. 

• Inclua a família ou colegas de quarto na preparação das refeições; divida as responsabilidades de fazer compras e cozinhar. 

E aí, o que acharam? Já dá pra salvar como colinha, né?!


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domingo, 2 de março de 2025

Perda de peso corporal e remissão do diabetes tipo 2

O termo “remissão” em latim significa “retornar”. No sentido literal, a remissão do diabetes implica na restauração da hiperglicemia para uma regulação normal da glicose. 

Evidências crescentes sugerem que a perda de peso corporal é fundamental para alcançar a remissão do diabetes tipo 2, definida como HbA1c inferior a 6,5% (<48 mmol/mol) por pelo menos três meses após a interrupção da terapia farmacológica para redução da glicose. A remissão do diabetes tipo 2 pode ser classificada em remissão parcial (HbA1c <6,5% [<48 mmol/mol] ou glicemia de jejum <126 mg/dL [<7,0 mmol/L]) ou remissão completa (HbA1c <6,0% [<42 mmol/mol] ou glicemia de jejum <100 mg/dL [<5,6 mmol/L]). Diante do crescente número de pessoas vivendo com diabetes tipo 2 em todo o mundo, é essencial compreender melhor a natureza, os fatores de confusão e a trajetória da remissão da doença.

No estudo publicado em The Lancet Diabetes & Endocrinology, Sarah Kanbour e colegas relatam os achados de uma revisão sistemática e análise de meta-regressão que incluiu 22 ensaios clínicos randomizados, abrangendo mais de 12.000 participantes com diabetes tipo 2 submetidos a diferentes intervenções para perda de peso, com o objetivo de investigar a relação entre perda de peso corporal e remissão da doença. Notavelmente, os agonistas do GLP-1 e os inibidores de SGLT2 foram excluídos da análise. 

Os autores observaram uma forte relação dose–resposta entre perda de peso e remissão. Um ano após a intervenção, a remissão completa foi alcançada por 0,7% (IC 95% 0,1–4,5) dos participantes que perderam menos de 10% do peso corporal, por 49,6% (40,4–58,9%) daqueles que perderam entre 20–29% do peso e por 79,1% (68,6–88,1%) dos que perderam 30% ou mais do peso. A remissão parcial, um ano após a intervenção, foi atingida por 5,4% (IC 95% 2,9–8,4) dos participantes com perda de peso inferior a 10%, por 48,4% (36,1–60,8%) daqueles que perderam entre 10–19%, por 69,3% (55,8–81,3%) dos que perderam entre 20–29%, e por 89,5% (80,0–96,6%) dos que perderam 30% ou mais do peso corporal. A cada redução de 1 ponto percentual no peso, a probabilidade de remissão aumentou em 2%. 

Outros fatores, como duração do diabetes, uso de insulina, tipo de intervenção, sexo e raça/etnia, não afetaram significativamente a probabilidade de remissão. Por outro lado, na análise multivariada, indivíduos com idade entre 45–49 anos apresentaram menor probabilidade de remissão completa (proporção ajustada 0,72 [IC 95% 0,55–0,94]; p=0,020). 

Além disso, a proporção de pacientes com remissão completa diminuiu de 48% no primeiro ano para 14% após cinco anos de acompanhamento, enquanto a proporção de pacientes com remissão parcial caiu de 39% no primeiro ano para 19% após cinco anos.

Esses achados corroboram os resultados do estudo Diabetes Remission Clinical Trial (DIRECT), que utilizou um programa estruturado de manejo do peso corporal, e destacam diversas questões importantes para pesquisas futuras. Primeiramente, os resultados demonstram que a perda de peso é o único fator com um efeito claro e significativo na remissão do diabetes tipo 2. 

O tipo de intervenção não exerceu um impacto discernível na probabilidade de remissão quando ajustado para a perda de peso. Diferente de estudos anteriores, a análise atual, em que a mediana da duração do diabetes foi de seis anos, não encontrou evidências de que a duração da doença afetasse a remissão. No entanto, os achados de Kanbour e colegas sugerem que a idade pode influenciar a remissão, reforçando a necessidade de intervenções precoces, já que a função das células β se deteriora com o envelhecimento.

Em segundo lugar, os autores demonstraram que a perda de peso inferior a 10% parece insuficiente para alcançar uma remissão significativa do diabetes tipo 2. O estudo DIRECT, que incluiu indivíduos com idade média de 55 anos no início do estudo e diagnosticados com diabetes tipo 2 há até seis anos, mostrou que as taxas de remissão pelo menos dois meses após a interrupção de todos os medicamentos antidiabéticos diminuíram de 62% no primeiro ano para 13% após cinco anos nos participantes da fase de extensão. 

Assim, embora as intervenções para perda de peso sejam essenciais logo após o diagnóstico, evitar o ganho de peso seria uma estratégia ainda mais eficaz, especialmente considerando a impressionante queda nas taxas de remissão ao longo do tempo, observada tanto no estudo DIRECT quanto no estudo atual de Kanbour e colegas. 

O estudo DIRECT mostrou que a recuperação da função das células β induzida pela perda de peso mediava a remissão do diabetes tipo 2. No entanto, como a função das células β já está significativamente comprometida no momento do diagnóstico de pré-diabetes (hiperglicemia intermediária) e piora com a progressão para o diabetes tipo 2, um diagnóstico e intervenção mais precoces poderiam prevenir ou reverter essa deterioração.

Diante da necessidade de detectar a disfunção glicêmica mais cedo, a International Diabetes Federation recomendou a glicemia plasmática de 1 hora com um ponto de corte de 155 mg/dL (8,6 mmol/L) como um biomarcador sensível para a identificação precoce de pessoas com alto risco de desenvolver diabetes tipo 2, antes mesmo do estágio de pré-diabetes. 

O estudo Prediabetes Lifestyle Intervention Study (PLIS) demonstrou que a remissão do pré-diabetes para uma regulação normal da glicose melhora a sensibilidade à insulina e a função das células β, conferindo uma proteção substancial contra o diabetes tipo 2 quando comparada a indivíduos com perda de peso semelhante, mas sem remissão. 

Uma análise secundária do Diabetes Prevention Program (DPP) mostrou que a remissão direcionada do pré-diabetes para a regulação normal da glicose, além da perda de peso padrão, resultou em uma redução relativa de 76% no risco de desenvolvimento de diabetes tipo 2 em comparação com a perda de peso padrão isolada. Assim, a remissão do pré-diabetes induzida pela perda de peso pode ajudar a prevenir a progressão para o diabetes tipo 2. 

A aplicação da determinação da glicemia plasmática de 1 hora para detectar precocemente pessoas em alto risco, antes do início do pré-diabetes, pode melhorar ainda mais as taxas de remissão e levar a uma regulação normal da glicose.

À medida que a prevalência global do diabetes tipo 2 continua a aumentar, torna-se fundamental que a intervenção ocorra em idades mais jovens e em estágios iniciais de risco. Esse objetivo requer uma melhor detecção de risco por meio da determinação da glicemia plasmática de 1 hora e a implementação de estratégias direcionadas à remissão, levando a uma regulação normal da glicose. 

Esses princípios devem ser fortemente considerados em futuras recomendações e diretrizes para a prevenção do diabetes.

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By Alberto Dias Filho - Digital Opinion Leader
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Embaixador das Comunidades Médicas de Endocrinologia - EndócrinoGram e DocToDoc