quarta-feira, 10 de setembro de 2025

Reportagem do Fantástico: Soroterapia e seus riscos

 

Reportagem Fantástico: Hipervitaminose: vitaminas em excesso colocam pacientes em risco

 


Canetas para tratamento da obesidade ou cirurgia bariátrica - Por. Dr. Ana Gabriela Magalhães

 Excelentes colocações da minha afilhada. 

Associações entre tatuagens e câncer: novos dados

Muitas pessoas sabem que fazer tatuagens traz riscos à saúde, como infecções e reações alérgicas. No entanto, estudos recentes têm sugerido também uma associação entre tatuagens e neoplasias, entre elas câncer de pele, linfoma e leucemia.

As pesquisas são preliminares e ainda existem muitas incógnitas — inclusive o motivo dessa possível conexão. Não há evidências suficientes para dizer se tatuagens causam câncer ou não, disse a Dra. Rachel McCarty, Ph.D., epidemiologista ligada à International Agency for Research on Cancer (IARC), sediada na França. “Não teremos a resposta para essa pergunta nos próximos anos”, disse ela.

Ainda assim, "as pessoas devem ser informadas" sobre os possíveis riscos, disse a Dra. Signe Bedsted Clemmensen, Ph.D., epidemiologista vinculada à Syddansk Universitet, na Dinamarca, especialmente porque cerca de um em cada três estadunidenses — 38% das mulheres e 27% dos homens — tem tatuagens. Veja a seguir o que os cientistas sabem até o momento.

Tinta usada na tatuagem pode conter substâncias cancerígenas


Os seres humanos têm aplicado pigmentos sobre o próprio corpo de forma decorativa desde pelo menos 3.000 a.C., como mostra a pele tatuada de uma múmia congelada conhecida como Ötzi, o “Homem de Gelo”. Haroldo II, rei da Inglaterra , tinha uma tatuagem, assim como Thomas Edison, Winston Churchill e até a mãe de Churchill, que tinha o desenho de uma serpente no punho .

Entretanto, as tatuagens eram diferentes naquela época, disse a Dra. Milena Foerster, Ph.D., também epidemiologista ligada à IARC. As antigas tatuagens feitas à mão com a técnica stick-and-poke “demoravam muito mais para serem feitas em comparação com as realizadas com máquinas apropriadas, por isso a superfície tatuada era muito menor”. Além disso, com as máquinas de tatuagem modernas, “mais tinta acaba penetrando na pele”. 

Outro aspecto relevante é que os pigmentos mais antigos também eram diferentes. Tradicionalmente, a pele era decorada com pigmentos de fuligem, carvão ou folhas moídas. As tintas modernas são totalmente diferentes disso.

“As tintas coloridas geralmente são compostas pelas mesmas substâncias presentes em tintas usadas em impressoras, na pintura automotiva e assim por diante”, disse a Dra. Rachel.

Essas tintas são coquetéis de compostos orgânicos e inorgânicos, como solventes, emulsificantes, aglutinantes, agentes antiespumantes e conservantes. Alguns desses compostos, como os hidrocarbonetos aromáticos policíclicos, encontrados recentemente em quase metade das tintas usadas na Europa, são sabidamente nocivos à saúde. “Esse é o principal carcinógeno presente na fumaça do cigarro”, disse a Dra. Milena. Além disso, também temos metais pesados, como chumbo, cromo e arsênio, encontrados em 9% das tintas europeias, e pigmentos azoicos, presentes nas tintas automotivas, que podem liberar aminas aromáticas com atividade carcinogênica. Embora as tintas europeias possam parecer mais prejudiciais, isso se deve principalmente ao fato de que elas foram as mais estudadas recentemente, e não por serem piores do que as tintas encontradas em outros lugares, como os EUA.

Inclusive, as tintas usadas nos EUA podem conter as mesmas substâncias, mas estão sujeitas a um escrutínio menos rigoroso. Em 2022, a União Europeia passou a regulamentar as substâncias presentes em tintas de tatuagem e maquiagem permanente. No entanto, nos EUA, “não há regulamentações atualmente”, disse a Dra. Rachel. As tintas usadas na aplicação de tatuagens são classificadas como cosméticos, e nenhuma delas é aprovada para injeção direta na pele pela Food and Drug Administration (FDA). (As práticas relacionadas à realização de tatuagens geralmente são regulamentadas por jurisdições americanas locais.) 

Com tantos compostos potencialmente tóxicos presentes em tintas de tatuagem, epidemiologistas — pesquisadores que estudam como as doenças afetam grandes populações — estão preocupados com os efeitos desses compostos na saúde, inclusive a possibilidade de causarem câncer.

Intuição médica levou a uma correlação com o câncer


A Dra. Rachel e outros cientistas começaram a pesquisar a questão do câncer após terem recebido uma ligação do Dr. Paul Shami, médico hematologista ligado ao University of Utah Huntsman Cancer Institute, nos EUA. O Dr. Paul, que atende pacientes com leucemia, começou a ter uma sensação de que estava vendo mais casos de câncer em pacientes com tatuagens.

Será que há alguma associação ou apenas uma maior parcela da população está se tatuando? Os cientistas analisaram 820 casos de câncer e os compararam com 8.200 indivíduos controles pareados conforme idade, sexo e etnia. Os resultados, publicados em 2024, sugerem que pessoas com tatuagem podem apresentar um aumento no risco de certos tipos de linfoma não Hodgkin. Além disso, indivíduos que fizeram tatuagens antes dos 20 anos tiveram um risco maior de neoplasias mieloides (tumores hematológicos raros).

Posteriormente, tivemos outro estudo, dessa vez na Suécia, mostrando que pessoas com tatuagens apresentam maior risco de linfoma. Um estudo dinamarquês publicado em 2025, do qual a Dra. Signe foi coautora, verificou que, considerando tatuagens maiores do que um palmo, o risco de linfoma era mais do que o dobro do de pessoas sem tatuagens. Como em qualquer estudo observacional, não é possível provar nada — esse tipo de pesquisa só consegue mostrar uma associação, e não a causa.

Porém, os cientistas têm uma hipótese: "Já está bem estabelecido que as tintas não permanecem totalmente na pele", disse a Dra. Rachel. “Elas são transportadas pelo sistema linfático e se acumulam nos linfonodos regionais. Essa é uma das partes principais da nossa hipótese sobre por que a tatuagem pode causar linfomas.”

Pesquisas mostram que os hidrocarbonetos aromáticos policíclicos presentes nas tintas pretas podem ser encontrados nos linfonodos próximos ao local da tatuagem, em alguns casos causando linfadenomegalia, que pode levar a inflamação crônica.

“Os linfonodos podem acabar tentando ‘lidar’ constantemente com essa substância estranha, o que pode induzir uma reação imunitária crônica”, disse a Dra. Signe. “Isso talvez leve à proliferação anômala de células e, com o tempo, a um aumento do risco de câncer.”

Risco de melanoma: achados conflitantes


Alguns estudos sugerem que as tatuagens também podem aumentar o risco de tumores de pele, como o melanoma. No estudo da Dra. Signe, pessoas com tatuagens tinham mais do que o dobro de chances de apresentar câncer de pele.

Porém, no novo estudo liderado pela Dra. Rachel — publicado em agosto — essas associações não foram vistas. “Nossos achados não sugerem que a presença de tatuagens possa aumentar o risco de melanoma”, disse ela. “Na verdade, estamos vendo um efeito protetor.”

Isso não significa que tatuagens sejam boas para a saúde — no entanto, em vez disso, pode ser que pessoas com maior risco de apresentar melanoma, como indivíduos que têm muitos nevos cutâneos, tenham menos chances de fazer uma tatuagem, disse a Dra. Rachel.

Outra explicação pode estar relacionada à exposição ao sol. “Quando alguém faz uma tatuagem, a recomendação é: passe protetor solar, porque, [se for exposta ao sol,] sua tatuagem vai desbotar. Talvez essa proteção solar extra esteja em parte reduzindo o risco de melanoma”, disse ela. De fato, um estudo de 2023 mostrou que pessoas com tatuagens têm mais chances de se proteger do sol.

Tatuagens podem ‘esconder’ o câncer


A realização de uma tatuagem pode dificultar o diagnóstico de câncer. Uma revisão de 43 casos de melanoma maligno realizada em 2025 mostrou que, se o câncer surge na pele tatuada, o prognóstico é pior — provavelmente devido ao diagnóstico tardio. “Se você não tem uma tatuagem, é muito mais fácil perceber alterações”, disse a Dra. Signe. Para os médicos, a presença de padrões e desenhos corporais dificulta a análise de lesões com um dermatoscópio.

Um problema semelhante ocorre no interior do organismo. Tintas de tatuagem podem tornar biópsias de linfonodos mais complexas. Um estudo com mulheres que apresentavam câncer cervical em estágio inicial mostrou que 40% das pacientes que tinham tatuagens apresentavam linfonodos corados pelos pigmentos exógenos.

“Essa pigmentação pode interferir nas biópsias de linfonodos sentinelas, dificultando a identificação precisa [de linfonodos acometidos] e a realização de análises histopatológicas”, disse o Dr. Giovanni Di Favero, médico oncologista ligado ao Asklepios Kliniken, na Alemanha, e autor principal do estudo.

Remoção de tatuagens pode ter o efeito oposto


Tudo isso não significa que seus pacientes devam se apressar para remover suas tatuagens. Pesquisas mostram que o laser usado na remoção pode fazer com que certos pigmentos, como o vermelho e o laranja, produzam substâncias cancerígenas.

“Se as tatuagens têm o potencial de causar câncer, removê-las pode ser ainda mais prejudicial, pois nesse processo os pigmentos são quebrados”, disse a Dra. Rachel. A Dra. Milena é ainda mais direta: “Eu não as removeria”, disse ela.

Sendo assim, o que uma pessoa deve fazer se estiver preocupada com o risco de câncer associado às tatuagens? “Mantenha-a protegida do sol”, disse a Dra. Rachel. Quando uma tatuagem é exposta à radiação ultravioleta, “componentes nocivos adicionais podem se formar na pele”, disse ela. Um estudo de 2025 mostrou que a luz solar faz com que as substâncias tóxicas extravasem dos pigmentos em direção à pele, como o dibromocloropropano (DBCP), usado como pesticida.

Orientações para quem está pensando em fazer uma nova tatuagem


A Dra. Milena deu algumas dicas:

Faça a tatuagem em um estúdio com práticas reconhecidas de higiene e segurança. “As infecções também aumentam o risco de linfoma”, disse. Entre os principais sinais de alerta, desconfie se o tatuador não usa luvas descartáveis e deixa tintas expostas à luz solar direta, disse ela, que também recomenda consultar uma lista com recomendações de segurança e higiene.

Adie a tatuagem se estiver gestante ou amamentando. Os desfechos relacionados à saúde reprodutiva são pouco estudados, mas, dado o perfil toxicológico da tinta de tatuagem e o pequeno tamanho das partículas, efeitos adversos durante a gestação ou amamentação não podem ser descartados, disse a Dra. Milena.

Escolha um desenho simples e com poucas cores. “Dessa forma, é possível limitar o número de substâncias que serão injetadas em seu organismo”, disse ela. “Eu escolheria uma [apenas] preta”, sugere.

Se você não estiver com pressa, espere um pouco. A Dras. Milena e Rachel, além de outros pesquisadores, estão conduzindo atualmente vários estudos prospectivos de grande porte para verificar se pessoas com tatuagens podem ter mais chances de apresentar câncer ao longo do tempo. Esse método pode fornecer evidências mais robustas do que estudos anteriores que simplesmente compararam pessoas com e sem tatuagens. “Espero que tenhamos os primeiros resultados razoavelmente confiáveis em três ou quatro anos”, disse a Dra. Milena.

Não se esqueça dos potenciais benefícios das tatuagens


A própria a Dra. Milena fez uma tatuagem preta após ter começado a pesquisar sobre o assunto. Ela não quer assustar as pessoas nem proibi-las de fazer uma tatuagem. Segundo ela, as tatuagens podem ter benefícios psicológicos. “Muitas vezes, essa é uma maneira de lidar com eventos traumáticos e, nesses casos, acho que é melhor fazer uma tatuagem do que começar a beber, por exemplo”, disse ela. Até mesmo pacientes que sobreviveram a um câncer costumam fazer tatuagens como estratégia para se recuperar do trauma relacionado à doença.


Dióxido de titânio: seguro para a pele, tóxico para o intestino?

Após uma decisão judicial histórica, o dióxido de titânio (TiO2)  um corante branco amplamente usado e encontrado em protetores solares, cremes dentais e tintas não é mais classificado como carcinogênico na União Europeia (UE). 

A decisão anulou o movimento realizado pela Comissão Europeia em 2019, de listar o TiO2 como uma substância suspeita para carcinogênese, o que exige uma nova revisão para a sua classificação.

Reversão legal

A Corte Europeia de Justiça (ECJ, sigla do inglês European Court of Justice) anulou a classificação de 2019 da Comissão Europeia, alegando que o Comitê de Avaliação de Risco (RAC, sigla do inglês Risk Assessment Committee) da UE se baseou em evidências científicas insuficientes para essa classificação. Mantendo a decisão do julgamento de 2022, o tribunal retirou a designação de substância carcinogênica e instruiu a Comissão Europeia a reavaliar a classificação de risco do TiO2.

“Ainda não se sabe como essa decisão influenciará futuras avaliações de risco pelo RAC e pela Comissão Europeia, bem como o processo de classificação CLP”, confirmou o Dr. Helge Kramberger-Kaplan, Ph.D., engenheiro e diretor geral do Instituto de Pesquisa em Materiais de Revestimento, Sistemas de Fachada e Vida Saudável Dr. Robert Murjahn Sociedade Limitada, na Alemanha. CLP faz referência às normas da UE para classificação, rotulagem e embalagem de produtos químicos perigosos.

O engenheiro acrescentou: “idealmente, os argumentos agora confirmados pela ECJ após anos de controvérsia legal seriam considerados desde o início em futuras análises, evitando mais processos judiciais e incerteza prolongada”.

Dados em animais versus evidências em humanos

“A incidência de tumores após sobrecarga pulmonar por partículas ultrafinas ocorreu principalmente em experimentos em modelos murinos”, afirmou o médico Dr. Martin F. Wilks, Ph.D., ex-diretor do Centro Suíço de Toxicologia Humana Aplicada da Universidade de Basileia, na Suíça. “Estudos epidemiológicos com trabalhadores envolvidos na produção de TiO2 não apresentaram, até o momento, evidências de aumento proporcional à dose na incidência de tumores pulmonares”.

Apesar da decisão judicial, o TiO2 foi proibido em produtos alimentares na UE desde 2022, devido aos seus potenciais efeitos genotóxicos. Em 2021, o Instituto Federal Alemão de Avaliação de Risco alertou que partículas de TiO2 poderiam entrar no núcleo celular e danificar o DNA e os cromossomos. 

Um estudo de 2017 do médico Dr. Gerhard Rogler, Ph.D., chefe do Departamento de Gastroenterologia e Hepatologia do Hospital Universitário de Zurique e professor da Universidade de Zurique, ambos na Suíça, também descreveu riscos: em camundongos com inflamação intestinal preexistente, as nanopartículas de TiO2 pioraram os sinais e sintomas. 

O autor observou efeitos semelhantes em pacientes com doença de Crohn, nos quais partículas penetrantes podem enfraquecer a barreira intestinal, desencadear exacerbações inflamatórias e aumentar o risco de câncer ao longo do tempo.

Lacuna nas evidências

“É significativo que haja poucos dados novos para abordar a questão ainda controversa da oncogenicidade do TiO2”, afirmou o Dr. Thomas Backhaus, Ph.D., presidente de ecotoxicologia e gestão de risco ambiental da Universidade Técnica da Renânia do Norte-Vestefália em Aachen, na Alemanha. “Nenhuma das empresas demandantes [da ação judicial] parece ter fornecido evidências provando que o TiO2 não atua como um carcinógeno pulmonar”.

Ele apontou um estudo recente do Japão em que não foram encontradas evidências de carcinogenicidade pulmonar em modelos murinos, mesmo com cargas de partículas mais elevadas em comparação às de um estudo frequentemente citado, de autoria do médico Dr. Uwe Heinrich, Ph.D., professor emérito da Faculdade de Medicina de Hannover e ex-diretor executivo do Instituto Fraunhofer de Toxicologia e Medicina Experimental, ambos na Alemanha. Contudo, ele observou que os dados gerais permaneceram insuficientes, conforme a conclusão de uma revisão recente. “Por que os produtores de TiO2 não conduzem esses estudos voluntariamente?”, questionou ele.

Baixo risco à saúde pública

“Não vejo um risco oncogênico para a população geral devido à inalação”, afirmou o Dr. Thomas. “Os níveis de exposição são muito baixos. De acordo com a regulamentação 2021/850 da UE, a maior exposição é provavelmente causada por sprays capilares, que, de acordo com as regras atuais da UE, podem conter até 1,1% de TiO2 para uso profissional e 1,4% para uso doméstico”.

O Dr. Helge confirmou que “na vida cotidiana, é impossível a presença prolongada de concentrações de poeira elevadas o suficiente para causar tais efeitos no pulmão humano. Mesmo estudos envolvendo milhares de trabalhadores da produção de dióxido de titânio não constataram evidências de danos”.

Meta-análise evidencia que bebidas energéticas podem aumentar o risco de suicídio e café reduzir

Bebidas energéticas podem aumentar o risco de suicídio: o que perguntar aos seus pacientes

Uma meta-análise (https://www.mdpi.com/2072-6643/17/11/1911) com mais de 1,5 milhão de participantes sugeriu que café e bebidas energéticas têm efeitos opostos no risco de suicídio .

O alto consumo de café (mais de 60 xícaras por mês) foi associado a uma redução significativa nas tentativas de suicídio, provavelmente devido às suas propriedades estimulantes e de melhora do humor.

Em contraste, observou-se que mesmo uma única lata de bebida energética por mês aumenta o risco de pensamentos e tentativas de suicídio, com um efeito dose-dependente que pode triplicar o risco em níveis de consumo mais elevados.

Essa diferença pode ser explicada pela presença de outros ingredientes psicoativos nas bebidas energéticas como taurina , guaraná e ginseng juntamente com seu alto teor de açúcar, que pode desencadear ansiedade e alterações de humor, principalmente em homens jovens, que são os principais consumidores.

A edição francesa do Medscape conversou com Guillaume Davido, MD, psiquiatra especializado em estudos de dependência no Hospital Bichat-Claude Bernard, em Paris, sobre as descobertas deste estudo.

Por que você acha que esse estudo é de particular interesse?

Os resultados são bastante impressionantes: as tentativas de suicídio foram 30% menores entre os consumidores de café em comparação aos consumidores de bebidas energéticas.

Esta meta-análise também é interessante porque nos incentiva a ser mais criteriosos sobre os efeitos da cafeína e a distinguir claramente bebidas energéticas com cafeína do café. Parece que o café, apesar de ser um estimulante , não aumenta o risco de suicídio. Isso é, no mínimo, surpreendente. Para mim, é quase uma revelação.

Por que esse efeito protetor da cafeína surpreende você?

A ideia de que a cafeína pode melhorar o risco de suicídio é bastante contraintuitiva. Sem mencionar que muitas publicações discutem os efeitos da cafeína na psiquiatria, particularmente seu efeito na qualidade do sono : quanto menos dormimos, mais estressados ​​e impulsivos ficamos, e maior a probabilidade de desenvolver comorbidades depressivas. Comorbidades depressivas implicam risco de suicídio. Transtornos psiquiátricos seriam mais desestabilizados em pacientes que consomem cafeína. Pensávamos que era principalmente o aspecto “cafeína” das bebidas energéticas que poderia potencialmente aumentar esses tipos de distúrbios, mas este estudo conclui um efeito protetor da cafeína.

No entanto, não é surpreendente que bebidas energéticas estejam associadas a um maior risco de suicídio, visto que seu consumo está associado a mais comorbidades psiquiátricas e com maior probabilidade de dependência . Até o momento, não havia pesquisas específicas sobre suicídio, mas isso parece plausível.

Além da cafeína, como você explica a possível ligação entre risco de suicídio e consumo de bebidas energéticas?

A meta-análise cita publicações sobre fatores de risco de comorbidade psiquiátrica e risco de suicídio que são agravados pelo consumo de bebidas energéticas. Elas mencionam especificamente taurina, guaraná ou ginseng, que podem promover ansiedade. No entanto, a literatura atual permanece muito cautelosa quanto à real toxicidade dessas substâncias. Também parece importante ter em mente que o consumo de bebidas energéticas [às vezes] ocorre dentro de um estilo de vida de risco geral, o que provavelmente explica em parte as associações observadas.

E quanto aos efeitos no microbioma e no eixo intestino-cérebro?

É verdade que o café tem efeitos antioxidantes e benefícios para o microbioma. A cafeína pode afetar positivamente o humor. Em contraste, outros componentes das bebidas energéticas, principalmente o açúcar, têm um efeito prejudicial sobre o microbioma . Por exemplo, um estudo mostrou que o consumo regular de bebidas energéticas diminuiu a expressão de genes bacterianos benéficos para o humor e reduziu a diversidade microbiana no intestino.

Você considera a comparação entre café e bebida energética neste estudo sólida?

É interessante, mas tem seus limites. Na meta-análise, a quantidade de café e, por extensão, de cafeína é bem definida, com um limite de 60 xícaras por mês, enquanto para bebidas energéticas, as quantidades são menos claras, descritas como uma lata.

Uma xícara de café tem cerca de 200 mL, e uma lata de um energético representa aproximadamente duas xícaras de café. Sabemos que essas bebidas contêm mais cafeína do que o café ou outras bebidas convencionais à base de cola, com teores que variam de 75 a 300 mg por bebida. Além disso, os entusiastas de bebidas energéticas consomem grandes quantidades, muitas vezes desconhecendo a quantidade de cafeína que ingerem.

Isso levanta questões sobre os resultados da meta-análise: os consumidores de café são protegidos pela cafeína ou simplesmente consomem menos do que os consumidores de bebidas energéticas? Publicações que destacam os riscos psiquiátricos associados ao café indicam que o consumo moderado é geralmente seguro. Pode até haver um efeito neuroprotetor . Portanto, tomar duas xícaras de café por dia não parece problemático.

E a população que consome bebidas energéticas?

Esta também é uma limitação observada pelos autores da meta-análise. Sabemos que pessoas que consomem regularmente bebidas energéticas não têm o mesmo perfil dos consumidores de café "clássico". São, em sua maioria, homens jovens . O risco de suicídio é maior entre homens jovens, e os consumidores de bebidas energéticas às vezes também usam outras substâncias; há uma ligação bem estabelecida na literatura entre bebidas energéticas e substâncias viciantes. Pacientes com problemas de dependência também apresentam risco aumentado de suicídio. Portanto, é necessária uma exploração mais aprofundada dessa população.

Mas, para mim, este também é um dos principais interesses deste estudo: é importante entender essa ligação bidirecional entre consumidores de bebidas energéticas e pacientes suicidas. Em consultas, o uso de bebidas energéticas deve ser visto como um "sinal de alerta". Seja na medicina geral ou na psiquiatria, se um paciente consulta por preocupações psicológicas, é relevante avaliar o consumo de bebidas energéticas porque pode indicar outros problemas: eles também podem estar consumindo outras substâncias ou ter um estilo de vida arriscado, o que permite a discussão de hábitos de vida. Eles podem desejar grandes quantidades de açúcar ou ter um transtorno alimentar como compulsão alimentar. O açúcar é conhecido por ser depressogênico e causa complicações metabólicas, que por sua vez levam a complicações psiquiátricas. Identificar esses comportamentos ajuda a detectar outros riscos associados, como síndrome metabólica ou doença hepática gordurosa devido ao consumo excessivo de açúcar.

Você pergunta aos seus pacientes sobre o consumo de bebidas energéticas?

Não é suficiente! Em consultas focadas no sono, esta pergunta deve ser incluída sistematicamente para avaliar a ingestão geral de cafeína. Na minha prática no hospital e na unidade de emergência psiquiátrica, não costumo perguntar durante a consulta inicial, pois lidamos principalmente com crises agudas. No entanto, torna-se relevante durante o acompanhamento ou ao final do tratamento. O objetivo não é demonizar a cafeína, mas abordá-la adequadamente. Em pacientes ansiosos, recomendamos limitar o consumo de estimulantes e evitar o consumo após as 16h, pois pode agravar a ansiedade ou interromper o sono. De forma mais ampla, a triagem clínica geral para transtornos de ansiedade deve incluir perguntas detalhadas sobre a ingestão de cafeína e bebidas energéticas.

Existem interações potenciais entre bebidas energéticas e medicamentos psiquiátricos?

No nível molecular, as interações existem, mas são discutíveis. Se você consumir cafeína com um antidepressivo ou antipsicótico, não necessariamente sentirá efeitos nocivos, mas algumas publicações relatam interações com a clozapina , um antipsicótico usado como último recurso para esquizofrenia resistente ao tratamento . A cafeína pode aumentar modestamente os níveis de clozapina .

Além disso, a cafeína e a maioria dos psicotrópicos compartilham o metabolismo hepático, com enzimas como a CYP1A2 envolvidas no metabolismo da cafeína. No entanto, não é possível afirmar com certeza se isso resulta em efeitos mentais pela ingestão concomitante.

No entanto, os níveis de glicose no sangue e de clozapina podem ser afetados em grandes consumidores de bebidas energéticas, e o monitoramento pode ser necessário, embora as evidências do impacto na saúde ainda não sejam claras.

Não há interações conhecidas com antidepressivos.

Por fim, recomenda-se não consumir bebidas energéticas ou café enquanto estiver tomando sedativos, pois seria como pressionar o acelerador e o freio simultaneamente. Identificar esse consumo é importante em pacientes que tomam hipnóticos.

Concluindo, o que você tira deste estudo?

Acredito que os autores desta meta-análise não pretendiam necessariamente destacar um efeito protetor do café, mas sim avaliar se a cafeína, presente no café ou em bebidas energéticas, impacta o risco de suicídio. Eles encontraram, surpreendentemente, uma diferença significativa entre os dois grupos de consumidores.

Na prática, eu levo isso em consideração:

A cafeína pode oferecer um efeito protetor contra o risco de suicídio quando consumida com moderação. Em contraste, doses muito altas como as encontradas em grandes quantidades de bebidas energéticas, podem aumentar esse risco.

Por exemplo, alguém que consome 15 xícaras de café por dia provavelmente não experimentará os benefícios protetores, dado o impacto no sono e em outras funções metabólicas, incluindo os efeitos cardiovasculares.

Deve-se prestar muita atenção aos consumidores de bebidas energéticas, e os pacientes devem ser questionados, pois esse tipo de consumo pode estar associado a múltiplas comorbidades, incluindo substâncias viciantes, síndrome metabólica e suicídio.

Fonte: https://www.medscape.com/viewarticle/energy-drinks-may-triple-suicide-risk-coffee-does-opposite-2025a1000ne8

terça-feira, 9 de setembro de 2025

Apague a luz: excesso de luz e obesidade, existe relação ?



Sim, há evidências crescentes de que a exposição excessiva à luz artificial, especialmente à luz durante a noite (artificial light at night, ALAN), está associada a um risco aumentado de obesidade e alterações metabólicas em humanos e modelos animais. 

Estudos epidemiológicos e experimentais sugerem que a exposição à luz artificial fora do ciclo natural claro-escuro pode desregular o ritmo circadiano, suprimir a produção de melatonina e impactar negativamente a regulação do apetite, o metabolismo energético e a composição corporal. Não é algo que a ciência possa bater o martelo e garantir: há evidências robustas, mas há evidências. 

Em humanos, dados de coortes prospectivas demonstram que mulheres expostas à luz artificial durante o sono apresentam maior risco de ganho de peso e desenvolvimento de obesidade ao longo de vários anos, mesmo após ajuste para fatores como dieta, atividade física e características do sono. O estudo foi um estudo de Coorte prospectiva (EUA, 43.722 mulheres). Conclusões:
  • Dormir com TV/luz acesa no quarto por ~5,7 anos associou-se a maior risco de ganho ≥5 kg (RR≈1,17) e de incidência de obesidade (RR≈1,33) vs. dormir no escuro, mesmo após ajustar por dieta, atividade e sono. 
  • É um estudo observacional (não prova causalidade), mas é forte e consistente. 
Já em crianças e adolescentes, níveis elevados de luz externa noturna (medidos por satélite) e padrões de exposição pessoal à luz (com mais tempo de exposição à luz ≥1 lx à noite) estão associados a maiores escores de IMC, maior percentual de gordura corporal e maior prevalência de sobrepeso/obesidade, com efeito mais pronunciado em meninos.

Estudos experimentais em animais corroboram esses achados, mostrando que a exposição crônica à luz artificial noturna, especialmente à luz azul, pode suprimir genes do relógio biológico (como Bmal1/Clock), reduzir Sirt1 e ativar vias lipogênicas, promovendo acúmulo de gordura e ganho de peso. 

Já outro estudo com modelos animais, concluiu que camundongos expostos a luz fraca à noite (~5 lux) ganharam mais peso sem comer mais, em grande parte por desalinhamento do horário das refeições (comendo na fase biológica “errada”). Efeito reproduzido em machos e fêmeas. 




Estudo com actígrafo (utilizado em idosos), mostrou que exposição a qualquer luz durante o sono associou-se a maior prevalência de obesidade, diabetes e hipertensão.  

actígrafo é um dispositivo portátil, semelhante a um relógio de pulso, que mede movimento e exposição à luz de forma contínua. Ele é usado em estudos de sono, cronobiologia e saúde metabólica para monitorar: 
  • Atividade motora: detecta quando a pessoa está em movimento ou em repouso, ajudando a estimar horários de sono e vigília. 
  • Exposição à luz: registra a intensidade e o tipo de luz ambiente (natural ou artificial), permitindo avaliar impacto do ALAN (luz artificial à noite) nos ritmos circadianos. 
  • Padrões circadianos: ajuda a identificar desalinhamentos do relógio biológico com o ambiente externo

Evidência experimental em humanos: ensaio cruzado mostrou que uma única noite dormindo com luz ambiente moderada (~100 lux) piora a sensibilidade à insulina e aumenta a atividade simpática vs. dormir em penumbra (<3 lux): postula-se que a ALAN possa ter esse efeito no metbolismo.  

Além disso, padrões subótimos de exposição à luz ao longo de 24 horas, caracterizados por noites mais claras e dias menos iluminados parecem aumentar o risco de obesidade, sugerindo que tanto a intensidade quanto o momento da exposição luminosa são relevantes.

A literatura destaca que intervenções para reduzir a exposição à luz artificial à noite podem ser consideradas como estratégias complementares na prevenção da obesidade, especialmente em populações urbanas e em crianças.

O que os cientistas postulam, é que a luz pode modular o metabolismo da glicose e a termogênese via circuitos neurais que envolvem retinahipotálamo e tecido adiposo marrom, além de afetar diretamente a secreção de melatonina e o eixo do estresse. Com isso, o excesso de exposição à luz artificial, particularmente à noite, estaria provavelmente associado a um maior risco de obesidade e alterações metabólicas.

Dicas rápidas de “higiene de luz” (baixo custo/baixo risco)

  • Dormir no escuro total; usar blackout/máscara.
  • Evitar TV/celular na hora de dormir; se necessário, brilho mínimo e filtros de luz.
  • Se um luz-guia for indispensável, preferir âmbar/quente e <5–10 lux, posicionada baixa e voltada para o chão.
  • Agendar refeições: evitar grandes lanches nas 2–3 h antes de deitar.
  • Leia esse meu texto sobre Higiene do sono: https://www.ecologiamedica.net/2012/02/metodos-de-higiene-do-sono-o-que.html

Fontes: 

1. Exposure to Artificial Light at Night: A Common Link for Obesity and Cancer?. Muscogiuri G, Poggiogalle E, Barrea L, et al. European Journal of Cancer (Oxford, England : 1990). 2022;173:263-275. doi:10.1016/j.ejca.2022.06.007.

2. Association of Exposure to Artificial Light at Night While Sleeping With Risk of Obesity in Women.
Park YM, White AJ, Jackson CL, Weinberg CR, Sandler DP. JAMA logoJAMA Internal Medicine. 2019;179(8):1061-1071. doi:10.1001/jamainternmed.2019.0571.

3.Outdoor Light at Night, Overweight, and Obesity in School-Aged Children and Adolescents. Lin LZ, Zeng XW, Deb B, et al. Environmental Pollution (Barking, Essex : 1987). 2022;305:119306. doi:10.1016/j.envpol.2022.119306.

4. Metabolic Implications of Exposure to Light at Night: Lessons From Animal and Human Studies.
Fleury G, Masís-Vargas A, Kalsbeek A. Obesity (Silver Spring, Md.). 2020;28 Suppl 1:S18-S28. doi:10.1002/oby.22807.

5. Personal 24-Hour Light Exposure Pattern With Obesity and Adiposity-Related Parameters in School-Aged Children: A Cross-Sectional Study Based on Compositional Data Analysis. Ding W, Li Q, Zhou Y, et al. Environmental Research. 2025;275:121422. doi:10.1016/j.envres.2025.121422.

6. The Complex Effects of Light on Metabolism in Humans. Ishihara A, Courville AB, Chen KY. Nutrients. 2023;15(6):1391. doi:10.3390/nu15061391.

Autor: Dr. Frederico Lobo - Médico Nutrólogo - CRM-GO 13192 - RQE 11915 - Gostou do texto e quer conhecer mais sobre minha pratica clínica (presencial/telemedicina), clique aqui.

Dieta Low FODMAP - O que é, para que serve?




O que é a dieta Low FODMAP?

A dieta Low FODMAP é uma abordagem nutricional criada para reduzir sintomas da Síndrome do Intestino Irritável, como dor abdominal, inchaço, gases, diarreia e constipação. FODMAP é a sigla em inglês para “Oligossacarídeos, Dissacarídeos, Monossacarídeos e Polióis Fermentáveis”. 

Esses carboidratos de cadeia curta são pouco absorvidos no intestino delgado e acabam fermentando no intestino grosso. Essa fermentação aumenta a produção de gases e puxa água para o lúmen intestinal, piorando os sintomas. 

A estratégia não é “cortar tudo para sempre”, e sim identificar quais grupos causam desconforto em cada pessoa. Com orientação, o objetivo final é ampliar ao máximo a dieta, preservando conforto intestinal e qualidade de vida.

Por que os FODMAPs causam sintomas na SII?

Pessoas com SII costumam ter maior sensibilidade visceral e alterações na motilidade do intestino. Quando FODMAPs chegam ao cólon, bactérias os fermentam e produzem gases, distendendo as alças intestinais. 

Ao mesmo tempo, alguns FODMAPs são osmoticamente ativos e puxam água para dentro do intestino. Esse combo de gás mais água pode gerar dor, distensão e mudanças no hábito intestinal. 

Em indivíduos sensíveis, pequenas quantidades já bastam para disparar sintomas. A dieta Low FODMAP reduz esse gatilho, ajudando a identificar tolerâncias pessoais.

Como funciona a abordagem em 3 fases

A Low FODMAP é estruturada em três etapas claras: eliminação, reintrodução e personalização. Na fase de eliminação, reduz-se temporariamente alimentos ricos em FODMAPs para “acalmar” o intestino. 

Em seguida, na reintrodução, testa-se cada grupo de FODMAP de forma planejada para mapear limites individuais. Por fim, na personalização, combina-se o que foi bem tolerado, criando uma alimentação variada e sustentável. 

Essa lógica evita proibições desnecessárias e corrige a impressão de “dieta restritiva para sempre”. O processo é mais seguro e eficaz quando feito com um nutricionista familiarizado com Low FODMAP.

Fase 1 — Eliminação guiada e de curta duração

A fase de eliminação dura, em geral, 2 a 6 semanas, tempo suficiente para reduzir sintomas e criar uma linha de base. 

Nessa janela, retira-se alimentos com alto teor de frutanos, galactanos, lactose, excesso de frutose e polióis como sorbitol e manitol. 

O cardápio segue com substituições estratégicas, garantindo proteínas, fibras de baixo FODMAP e micronutrientes. O objetivo não é emagrecer nem “desintoxicar”, e sim modular sintomas. 

Sinais de que a fase funcionou incluem menos dor, menos inchaço e evacuações mais previsíveis. Passado esse período, é hora de testar sistematicamente o que volta ao prato.

Fase 2 — Reintrodução estruturada e individual

Na reintrodução, cada família de FODMAP é testada em dias separados e em porções crescentes. 

Observa-se a presença, a intensidade e o tipo de resposta, como gases, dor, urgência ou constipação. 

O registro detalhado em diário alimentar ajuda a diferenciar coincidências de verdadeiros gatilhos. Se um alimento provocar sintomas, aguarda-se estabilizar e segue-se com o próximo teste. 

O ritmo é personalizado, respeitando rotina e resposta clínica. Ao fim, você terá um “mapa de tolerância” confiável.

Fase 3 — Personalização sustentável e flexível

Com os resultados em mãos, monta-se uma alimentação ampla, variada e sintoma-consciente. A ideia é incluir o máximo do que foi tolerado, mantendo apenas limites em itens problemáticos. 

Essa fase equilibra prazer de comer, convívio social e controle de sintomas. 

Ajustes finos são feitos conforme mudanças de rotina, estresse e microbiota. É comum a tolerância melhorar ao longo do tempo com a diversificação alimentar adequada. O resultado é autonomia para viver sem medo do prato.

O que comer e o que evitar: visão prática

A lista abaixo foi inspirada na abordagem da Universidade de Monash. Lembre-se: a classificação depende da porção típica; muitos itens “baixos” viram moderados/altos quando a porção aumenta. Para gramagens exatas e variações por marca/preparo, consulte o app/guia da Monash e use o sistema de “semáforo” (verde/âmbar/vermelho). 

Alimentos BAIXOS em FODMAP (porções típicas)

Frutas: Banana verde (nanica/prata, mais firme), morango, mirtilo (blueberry), uvas, kiwi, abacaxi, Laranja, tangerina/mexerica, limão, lima, Melão cantalupo, melão honeydew, Maracujá, mamão papaia, Framboesa, carambola, pitaya (dragon fruit), toranja (grapefruit)

Hortaliças, ervas e temperos simples: Alface, rúcula, espinafre, agrião, couve (couve-manteiga/kale), Pepino, tomate, tomate-cereja, berinjela, abobrinha, Pimentão vermelho/verde, cenoura, vagem, quiabo, chuchu, Nabo, rabanete, endívia, Cebolinha parte verde, alho-poró parte verde, Gengibre, cúrcuma (açafrão-da-terra), pimentas (malagueta/dedo-de-moça), Azeitonas, alga nori, Batata inglesa

Grãos, cereais e amidos: Arroz (branco, integral, basmati, jasmim), Quinoa, trigo-sarraceno (buckwheat), milhete (millet), Polenta/fubá de milho, tortilha 100% milho, pipoca (simples), Macarrão de arroz, Tapioca (goma), polvilho doce/azedo, Aveia cozida em porção pequena (≈½ xícara cozida)

Laticínios e alternativas sem lactose: Leite sem lactose, iogurte sem lactose, Queijos maturados: parmesão, cheddar, suíço/emmental, brie, camembert, Feta (porção pequena), Manteiga, bebida de amêndoas sem açúcar (verificar rótulo)

Proteínas: Carnes in natura (bovina, suína, frango, peru), peixes e frutos do mar (ex.: salmão, tilápia, sardinha, camarão, mexilhões), Ovos, Tofu firme, tempeh

Oleaginosas e sementes (porções pequenas): Amendoim, nozes, pecã, macadâmia, castanha-do-Pará (Brasil), pinoli, Sementes de abóbora, girassol, gergelim, chia, linhaça, Tahine (pasta de gergelim, porção pequena)

Doces, bebidas e condimentos simples: Açúcar (sacarose), glicose/dextrose, xarope de bordo (maple), Stevia, eritritol, Chocolate amargo (≈70% cacau, porção pequena), Café preto, chá verde, chá preto, chá de hortelã, chá de gengibre, rooibos, Água/água com gás, Molho de soja (shoyu) em pequenas quantidades, Óleo aromatizado com alho/cebola (sem partículas sólidas)

Observação: proteínas animais puras não contêm FODMAPs; problemas surgem em marinadas/molhos industrializados com alho/cebola/inulina. 

Alimentos com MODERADO teor de FODMAP (ou que viram moderados em porções médias)

Exemplos úteis para testes de reintrodução: Abacate (≈¼ unidade), Banana madura (mais doce que a verde), Romã (sementes, porção pequena), Coco: polpa fresca/ralado (½ xícara), leite de coco (≈¼ xícara), Suco de laranja (≈150 ml)

Hortaliças e leguminosas: Batata-doce (≈¾ xícara), Brócolis (flores), Aipo/salsão (1 talo médio), Beterraba (½ xícara), Milho-doce (½ espiga ou ½ xícara enlatado, escorrido), Ervilha fresca (porção pequena), Abóbora butternut e kabocha (½ xícara)

Cereais, pães e oleaginosas: Aveia (porções maiores), Pão de espelta de fermentação natural (1 fatia), Amêndoas (≈10–12 unidades), avelãs (≈10 unidades), Coco ralado (½ xícara). 

Fermentados e condimentos: Missô (1 colher de sopa), Ricota (pequena porção)

Dica clínica: “empilhamento” (somar vários “verdes” na mesma refeição) pode elevar a carga total e acionar sintomas; ajuste variedade e porções. 

Alimentos ALTOS em FODMAP (porções típicas)

Frutas: Maçã, pêra, manga, melancia, Pêssego, nectarina, ameixa (plum), cereja, Caqui (persimmon), figo, damasco (fresco e seco), lichia

Hortaliças e fungos: Cebola (todas as variedades), alho, alho-poró parte branca, cebolinha parte branca, Couve-flor, aspargos, alcachofra, Cogumelos (champignon, portobello; shiitake seco), Ervilha-torta (snow peas), Beterraba em porções grandes, couve-de-bruxelas em porções usuais.

Cereais e produtos de trigo/cevada/centeio: Pão/massa/biscoitos/bolos de trigo (inclusive integral), Centeio (pães), cevada (grãos/malte), bulgur, sêmola, farelo de trigo.

Leguminosas e derivados (porções comuns): Feijão-preto, feijão-carioca/pinto, feijão-branco, feijão-vermelho (kidney), Ervilha-seca (split peas), Grão-de-bico e lentilha em porções grandes, Soja em grão, leite de soja feito do grão inteiro.

Laticínios com lactose: Leite de vaca, iogurte tradicional, sorvete comum, Leite condensado, doce de leite, Queijos frescos e ricos em lactose (ex.: cottage; porções usuais de ricota)

Adoçantes e ingredientes concentrados: Mel, xarope de agave, xarope de milho rico em frutose (HFCS), Polióis: sorbitol, manitol, maltitol, xilitol, isomalte, 

Inulina/fibra de chicória (muito comum em “barras de proteína”, iogurtes “com fibra” e pães “alto teor de fibras”)

Bebidas e industrializados: Sucos de maçã e pêra, Refrigerantes “diet”/“zero” com polióis (sorbitol/xilitol)

Sopas/molhos prontos e embutidos com alho/cebola/inulina

Importante: esta lista não substitui o app/guia da Monash nem a orientação nutricional individual. Variações de porção, preparo, maturação da fruta e formulação industrial podem mudar a classificação


Dicas de compras e leitura de rótulos

Aprenda a identificar termos como inulina, xarope de milho com alto teor de frutose, sorbitol e manitol. Produtos “sem lactose” podem ser aliados úteis na fase de eliminação. 

Evite rótulos com listas extensas de aditivos e açúcares ocultos, especialmente polióis. Prefira alimentos in natura e minimamente processados para maior previsibilidade. 

Tenha uma lista de substitutos, como alho-infundido em óleo para sabor sem frutanos. Planejamento de compras evita improvisos que disparam sintomas. Por isso é importante fazer acompanhamento com um nutrólogo e nutricionista que entenda de FODMAPs.

Erros comuns e como evitar recaídas

Um erro frequente é prolongar demais a fase de eliminação, empobrecendo a dieta e a microbiota. Outro é testar vários FODMAPs ao mesmo tempo, confundindo a leitura dos sintomas. Não preencher o recordatório alimentar também dificulta decisões objetivas. 

Atenção ao “acúmulo” de FODMAPs no mesmo dia, que pode ultrapassar seu limiar sem perceber. Comer rápido, dormir pouco e alto estresse também modulam o intestino e sabotam resultados. Revisões periódicas com seu profissional mantêm a estratégia moderna e flexível.

Segurança, riscos e quem não deve fazer sozinho

A Low FODMAP é uma intervenção clínica e não deve ser seguida indefinidamente na fase mais restrita. Crianças, gestantes, idosos e pessoas com histórico de transtornos alimentares precisam de avaliação individual. Reduções prolongadas e sem supervisão podem diminuir fibras e micronutrientes. Monitorar proteínas, ferro, cálcio, vitaminas do complexo B e variedade de fibras é essencial. Profissionais ajustam o plano para preservar a saúde da microbiota e a imunidade. O foco é aliviar sintomas sem sacrificar a qualidade nutricional.

Evidências científicas em linguagem simples

Estudos clínicos mostram que a abordagem Low FODMAP reduz sintomas em parcela significativa de pessoas com SII. A melhora costuma incluir menos dor, menos distensão e hábitos intestinais mais previsíveis. A Universidade Monash, referência mundial no tema, padronizou testes e porções, impulsionando a qualidade das evidências. A resposta, porém, é individual e depende da execução correta das três fases. Benefícios sustentáveis exigem a etapa de personalização e reintrodução consciente. O objetivo final é comer bem, com variedade e conforto.

Na nossa prática clínica percebemos ao longo de quase 10 anos, que a Dieta Low Fodmap também pode ser útil em pacientes com fibromialgia, SIBO, SIFO e intolerâncias alimentares mútiplas. 

Perguntas frequentes 

Essas são as 5 perguntas mais frequentes que ouvimos no consultório quando escolhemos a abordagem low fodmap como tratamento nutricional. 

  1. “Vou precisar fazer Low FODMAP para sempre?” Não, a fase restritiva é temporária e dá lugar à personalização. 
  2. “Perderei nutrientes?” Não, se a abordagem for guiada e priorizar variedade e fibras adequadas.
  3. “Posso fazer sozinho?” A orientação profissional acelera resultados e evita carências. 
  4. “E se não melhorar?” Reavalie diagnóstico, estresse, sono, trânsito intestinal e porções. 
  5. “E probióticos?” Podem ajudar em casos selecionados, mas devem ser escolhidos com critério e acompanhamento.

Autores:
Dr. Frederico Lobo - Médico Nutrólogo - CRM-GO 13192 - RQE 11915
Rodrigo Lamonier - Nutricionista e Profissional da Educação física

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segunda-feira, 8 de setembro de 2025

[Contéudo para profissionais] Saúde óssea em adultos com obesidade antes e após intervenções para promover perda de peso

Resumo

A obesidade e suas comorbidades associadas constituem um grave e crescente problema de saúde pública. As fraturas afetam uma proporção substancial de pessoas com obesidade e resultam da combinação entre a redução da resistência óssea em relação à carga mecânica aumentada e o maior risco de quedas.

Fatores que contribuem para fraturas em pessoas com obesidade incluem os efeitos adversos do tecido adiposo sobre os ossos e músculos e, em muitos casos, a coexistência do diabetes tipo 2.

As estratégias para reduzir peso incluem dietas com restrição calórica, exercícios físicos, cirurgia bariátrica e intervenções farmacológicas com agonistas do receptor de GLP-1. No entanto, embora a perda de peso em pessoas com obesidade traga muitos benefícios à saúde, ela também pode ter efeitos adversos no esqueleto, com aumento da perda óssea e do risco de fraturas.

As prioridades para pesquisas futuras incluem o desenvolvimento de abordagens eficazes para reduzir o risco de fraturas em pessoas com obesidade e a investigação dos efeitos dos agonistas do receptor de GLP-1 sobre a perda óssea resultante da redução de peso.

Diabetes tipo 2

O diabetes tipo 2 é comum em pessoas com obesidade e pode conferir risco adicional de fraturas por meio de seus efeitos sobre as propriedades do material ósseo e pelo aumento do risco de quedas. Ambas as condições são caracterizadas por alta DMO e risco aumentado de fraturas; o risco aumentado de fratura de quadril tem sido consistentemente relatado em pessoas com diabetes tipo 2, apesar do efeito protetor da obesidade nessas fraturas.

Em um grande estudo observacional retrospectivo com mulheres idosas, comparações entre aquelas com apenas diabetes e aquelas com apenas obesidade sugeriram que o diabetes, isoladamente, pode estar associado a maior risco de fraturas vertebrais ou de quadril, assim como de fraturas não vertebrais e não de quadril, em comparação com obesidade isolada.

Por outro lado, entre aqueles com apenas obesidade, predominaram as fraturas não vertebrais e não de quadril. No entanto, mais estudos são necessários para estabelecer os efeitos do diabetes tipo 2 coexistente sobre o risco de fraturas em pessoas com obesidade.

* Hormônios incretínicos

O GLP-1 é um hormônio incretínico — produzido principalmente pelas células enteroendócrinas do intestino — secretado em resposta à ingestão de nutrientes e que potencializa a secreção de insulina desencadeada pela glicose. Os efeitos das incretinas humanas são atribuídos principalmente a dois hormônios peptídicos: GIP e GLP-1. Os hormônios incretínicos exercem diversos efeitos na homeostase da glicose, incluindo a inibição do esvaziamento gástrico e a redução da ingestão alimentar; a regulação da fome e da saciedade é um processo complexo controlado pelo sistema neuroendócrino.

O desenvolvimento da família dos agonistas do receptor de GLP-1 foi parcialmente impulsionado pelo sucesso dos inibidores orais da DPP-4, que aumentavam indiretamente as concentrações endógenas de GLP-1 e GIP, resultando em melhor controle glicêmico em pacientes com diabetes tipo 2. 

O agonismo do receptor de GLP-1 apresenta um mecanismo multifatorial de ação na regulação do peso corporal e do metabolismo da glicose, com efeitos diretos e indiretos no metabolismo energético e glicídico em órgãos periféricos-chave (como fígado, intestino, músculos e pâncreas), além de efeitos no cérebro.

No início da década de 2010, agonistas do receptor de GLP-1 como liraglutida e semaglutida foram desenvolvidos para o tratamento do diabetes tipo 2 e mostraram promover perda de peso inesperada, o que levou ao desenvolvimento desses fármacos também para o tratamento da obesidade.

A FDA e a EMA aprovaram o uso de liraglutida subcutânea (3,0 mg 1x/dia; Saxenda, Novo Nordisk) e semaglutida subcutânea (2,4 mg 1x/semana; Wegovy, Novo Nordisk) como opções terapêuticas para o manejo da obesidade crônica em indivíduos com IMC >30 kg/m² ou >27 kg/m² quando acompanhados de comorbidades relacionadas ao peso. A tirzepatida (Eli Lilly, EUA), agonista duplo de receptores, também foi aprovada pela FDA e EMA sob os nomes comerciais Zepbound (EUA) e Mounjaro (UE), administrada semanalmente por via subcutânea. Já o agonista triplo retatrutida encontra-se em fase de ensaios clínicos.

* Efeitos esqueléticos dos agonistas do receptor de GLP-1 em pessoas com obesidade: modelos pré-clínicos

Modelos de camundongos knockout para o receptor de GLP-1 e estudos in vitro em células ósseas sugerem que o tratamento com agonistas de GLP-1 pode ser benéfico para os ossos, apesar da perda de peso farmacologicamente induzida. Estudos pré-clínicos com liraglutida mostraram efeitos positivos no metabolismo ósseo em diversos modelos. Embora doses terapêuticas de liraglutida pareçam melhorar as propriedades do material ósseo, a maioria dos efeitos positivos na DMO e na microarquitetura foi observada em concentrações muito mais altas do que as aprovadas para redução de peso em obesidade. Até o momento, não há dados pré-clínicos disponíveis sobre os efeitos esqueléticos da semaglutida ou da tirzepatida.

* Efeitos esqueléticos dos agonistas do receptor de GLP-1 em pessoas com obesidade: estudos clínicos

Até onde se sabe, apenas dois estudos avaliaram alterações em marcadores de remodelação óssea (BTMs) e DMO em pacientes euglicêmicos em uso de agonistas do receptor de GLP-1. Outros estudos foram conduzidos em pacientes com diabetes tipo 2, com ou sem obesidade.
Estudo com liraglutida:
Lepsen e colegas realizaram um ECR com 37 mulheres euglicêmicas com obesidade (IMC médio de 34 kg/m², idade média de 46 anos). Após uma dieta hipocalórica de 8 semanas com perda média de 12 kg, as participantes foram randomizadas para liraglutida (1,2 mg/dia) ou placebo por 52 semanas.
 • Durante a fase inicial de perda de peso não farmacológica, P1NP sérico permaneceu inalterado, enquanto CTX aumentou.
 • Durante a fase de manutenção, CTX permaneceu estável em ambos os grupos, mas P1NP aumentou 16% no grupo liraglutida versus queda de 2% no placebo (p<0,05).
 • Após 52 semanas, DMO total, pélvica e de membros não se alterou em nenhum grupo. A DMO de membros foi estimada como maior no grupo liraglutida em 0,021 g/cm² (IC 95% 0,013–0,054; p=0,2), mas sem significância.
Estudo com semaglutida:
Avaliou adultos sem diabetes tipo 2, mas com risco aumentado de fraturas (T-score <–1,0, histórico de fratura por fragilidade ou ambos). Foram incluídos 64 indivíduos (86% mulheres, idade média 63 anos, IMC 21–39 kg/m²), randomizados para semaglutida (1,0 mg ou dose máxima tolerada) ou placebo por 52 semanas.
 • O grupo semaglutida apresentou perda de peso média de 9,4% (p<0,001), contra nenhuma alteração no placebo.
 • Não houve diferença no P1NP entre grupos, mas CTX aumentou 54,8% no grupo semaglutida versus placebo.
 • Na semaglutida, DMO lombar caiu 2,1% (p=0,01), quadril total caiu 2,6% (p=0,001) e DMO volumétrica tibial caiu 1,5% (p=0,003).
→ Semaglutida esteve associada à perda de peso, perda óssea e aumento de CTX, em padrão semelhante ao observado com restrição calórica. O desenho do estudo não permitiu avaliar se os efeitos foram independentes da perda de peso, pois o grupo controle não perdeu peso comparável.

* GLP-2 e ossos

Os efeitos esqueléticos dos agonistas do receptor de GLP-2 também foram estudados. O GLP-2, outro hormônio intestinal, é cosecretado com GLP-1 pelas células L após a ingestão de alimentos e exerce efeitos intestinotróficos.
Um ECR de dose-resposta em mulheres pós-menopáusicas com baixa DMO mostrou que o GLP-2 reduziu significativamente a reabsorção óssea (CTX sérico) após 4 meses de tratamento diário, sem suprimir a formação óssea (osteocalcina sérica). Essa alteração na remodelação óssea associou-se a aumento dependente da dose na DMO do quadril total, atingindo +1,1% no grupo de maior dose (3,2 mg) versus +0,3% no placebo (p<0,01). Mais estudos são necessários para avaliar os potenciais efeitos antifratura do GLP-2.

* Risco de fraturas com GLP-1

O risco de fraturas não foi avaliado especificamente para agonistas de GLP-1 prescritos para obesidade. No entanto, foi estudado em indivíduos com e sem obesidade tratados com doses usadas para diabetes tipo 2 (ex.: liraglutida 1,2 mg/dia vs 3,0 mg/dia para obesidade). A perda de peso com GLP-1 no diabetes tipo 2 é geralmente de 2–6 kg em 6 meses, maior com a semaglutida subcutânea.

Diversas revisões sistemáticas e metanálises sugerem que não há diferença significativa no risco de fraturas com agonistas de GLP-1 versus placebo ou outros antidiabéticos. Contudo, uma metanálise de 38 ECRs (39.795 pacientes com diabetes tipo 2) mostrou redução significativa no risco de fraturas (RR 0,71; IC 95% 0,56–0,91) com agonistas de GLP-1 em comparação com placebo ou outros antidiabéticos. Esse efeito benéfico só foi observado após mais de 52 semanas de tratamento.

Resumo final:

Pesquisas pré-clínicas indicam que agonistas do receptor de GLP-1 podem ter efeitos benéficos sobre a saúde óssea, embora a maioria desses efeitos positivos tenha ocorrido em doses mais altas do que as aprovadas para obesidade. Até agora, as evidências clínicas são limitadas, vindas principalmente de pacientes com diabetes tipo 2 (sem perda de peso significativa e com curto período de acompanhamento).

Conclusão

As fraturas em pessoas com obesidade representam uma carga substancial para a saúde pública. Sua patogênese ainda precisa ser claramente estabelecida, mas o risco aumentado de quedas, a sarcopenia e o diabetes tipo 2 frequentemente associado contribuem para esse cenário. O advento da cirurgia bariátrica e das intervenções farmacológicas que promovem perda de peso despertou interesse sobre como esses tratamentos afetam a saúde óssea. Os efeitos adversos de algumas formas de cirurgia bariátrica sobre o esqueleto estão bem documentados, mas os efeitos das terapias baseadas em incretinas, como os agonistas do receptor de GLP-1, ainda precisam ser totalmente estabelecidos.

Mais pesquisas são necessárias para avaliar se o uso prolongado de terapias baseadas em incretinas para obesidade pode compensar a perda óssea geralmente observada durante a perda de peso. Essa agenda de pesquisa deve incluir estudos de intervenção dedicados em pessoas com obesidade que utilizam esses fármacos nas doses aprovadas para o manejo da obesidade, com parâmetros ósseos como desfechos primários. Além disso, devem ser incentivados estudos observacionais utilizando dados longitudinais de mundo real de pacientes em uso desses tratamentos.