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sábado, 1 de junho de 2024

[Medscape] Sono na redução do risco cardiovascular


A American Heart Association (AHA) criou em 2010 o Life´s Essential 7, uma espécie de checklist com 7 fatores para definir e quantificar a saúde cardiovascular. 

Desses fatores, quatro são biológicos (níveis ideais de pressão arterial, colesterol, glicemia e massa corpórea) e três são comportamentais (não fumar, atividade física regular e alimentação saudável). 

No ano de 2022 a AHA atualizou essa abordagem e acrescentou o sono como oitavo componente desses fatores, rebatizando a ferramenta de Life´s Essential 8. 

A associação desses oito marcadores com a preservação da saúde cardiovascular tem sido demonstrada. 


O sono tem sido reconhecido como um fator relevante para a saúde cardiometabólica. Estudos de laboratório mostram que o sono manipulado experimentalmente influencia a pressão arterial, a inflamação, a homeostase da glicose e outros fatores relevantes. Estudos observacionais maiores mostraram que pequenas alterações no sono em nível populacional estão associadas a alterações nos fatores de risco cardiovascular. Essa é uma lacuna de conhecimento que vem merecendo uma investigação mais aprofundada, em especial abrangendo dimensões do sono, além da duração. A atividade das ondas delta do eletroencefalograma (EEG) é uma característica proeminente do sono profundo, que está significativamente associada à qualidade do sono. A interrupção da atividade das ondas delta tem sido associada a diabetes, resistência à insulina, hipertensão e mortalidade.

Pesquisadores levantaram a hipótese de que a interrupção da atividade das ondas delta durante o sono poderia prever doenças cardiovasculares (DCV) em longo prazo e risco de morte por DCV. 


Os autores usaram um método abrangente baseado em entropia espectral de potência para avaliar a atividade das ondas delta durante o sono com base em polissonografias noturnas de 4.058 participantes do SHHS (Sleep Heart Health Study) e 2.193 participantes do MrOS (Osteoporotic Fractures in Men Study Sleep). 

Durante 11 anos de acompanhamento no SHHS, 729 participantes tiveram DCV incidente e 192 participantes morreram devido a DCV. Durante 15 anos de acompanhamento no MrOS, 547 participantes tiveram DCV incidente e 391 morreram devido a DCV. 

Em modelos de regressão multivariada de Cox, a menor entropia das ondas delta durante o sono foi associada a maior risco de doença coronariana e mortalidade cardiovascular. Além disso, a baixa entropia das ondas delta foi mais preditiva de doença coronariana, DCV e risco de morte por DCV do que os parâmetros convencionais do sono.


Implicações

Esses resultados inéditos sugerem que a interrupção da atividade das ondas delta durante o sono pode ser uma métrica útil para identificar pessoas com risco elevado de DCV e morte por DCV.

O editorial que acompanha o artigo ressalta que várias perguntas ainda sem resposta tornam necessários mais estudos: a entropia delta é meramente um marcador de risco cardiovascular, um fator de risco de DCV ou ambos? Seria um indicador de envelhecimento acelerado que representa um perfil geral de deterioração da saúde? Qual nível específico de baixa entropia delta pode conferir aumento do risco cardiovascular e da mortalidade, ou que nível de atividade das ondas delta precisa ser alcançado para proteção contra DCV? Esses níveis de corte podem diferir por idade, sexo e raça e etnia? Pode haver mudanças intrapessoais da atividade das ondas delta ao longo do tempo ou variabilidade do dia a dia, conforme mudanças nos níveis hormonais, fatores ambientais, distúrbios mentais, distúrbios neurológicos etc.?

De qualquer modo, o estudo amplia perspectivas na análise da cada vez mais evidente associação dos padrões de sono com a saúde e a doença cardiovascular.

Sempre vale lembrar que preservar a saúde é mais eficaz do que tratar a doença.

Fonte: Sono é cada vez mais reconhecido como um fator essencial para a preservação da saúde cardiovascular - Medscape - 27 de mai de 2024.

Postei essa notícia publicada recentemente no Medscape porque sono é algo que sempre estudei, desde o período da faculdade, quando pouco se falava acerca do tema. Até fiz uma monografia sobre o tema, então tive que estudar muito. 

Além disso, morava com minha tia, que é Otorrino e atua na área de Medicina do sono. Fui cobaia algumas vezes para realizar polissonografia. Então o tema me agrada. Nunca tive problema para iniciar o sono ou mantê-lo. Sempre sonhei muito, principalmente quando faço Jejum intermitente a noite. Sempre dormi muito bem e as poucas vezes que tive alguma dificuldade, bem pontuais, fiquei atordoado. Justamente por atender tantos pacientes com alteração do sono. 

Ano após ano percebo aqui no consultório que as pessoas estão indo deitar cada vez mais tarde, dormindo menos de 7h por noite. No meu questionário pré-consulta sempre questiono:
  • Que horas deita para dormir? Se deita após as 23:30 por qual motivo deita tão tarde?
  • Que horas acorda geralmente? Se acorda antes das 05:30, por qual motivo acorda tão cedo?
  • Pela manhã, sente que o sono foi reparador?
  • Tem dificuldade para iniciar o sono?
  • Inicia o sono mas acorda inúmeras vezes durante a noite?
  • Ronca?
  • Expõem-se ao sol com frequência?
Ano após ano as respostas só pioram. As pessoas negligenciam muito o sono, estão normalizando a utilização de indutores do sono (zolpidem). Estão normalizando deitar tarde, expor-se a tela antes de deitar. Achando que é normal acordar com sensação de sono não reparador. Sentir sonolência excessiva diurna. 

Para piorar, na Nutrologia eu fico assustado com a quantidade de pacientes portadores de obesidade que consultam com médicos que não medem a circunferência do pescoço mesmo o paciente relatando ronco. Médicos que sequer pedem polissonografia para pacientes com queixa de alteração do sono. 

A Medicina ainda precisa avançar muito em coisas básicas. O sono é um dos pilares para a boa saúde e longevidade. Já se passaram mais de 20 anos que comecei a estudar o tema e agora que boa parte dos médicos estão olhando o sono de forma diferente.

Espero que esse panorama mude. 

Autor: Dr. Frederico Lobo - Médico Nutrólogo - CRM-GO 13192 - RQE 11915, CRM-SC 32.949, RQE 22.416

terça-feira, 28 de maio de 2024

Cirurgia bariátrica: fazer ou não, eis a questão?


Dúvida super comum no meu dia-a-dia. Quem segue o meu blog/instagram/site sabe que coordeno um ambulatório de Nutrologia no SUS. Comecei em Janeiro de 2015, ou seja, quase 10 anos atendendo um grande volume de pacientes. E me orgulho muito disso, afinal o SUS é a melhor escola para quem quer realmente aprender a ser um bom médico. 

Um bom médico se faz com 5 pilares:
1) Conhecimento técnico-científico
2) Vivência: experiência atendendo
3) Escuta ativa
4) Atendimento humanizado
5) Anseio por ver o paciente melhorando ou amenizando a sua dor

A vivência é algo crucial na Nutrologia, pois, crescemos principalmente diante dos desafios, dos encontros com os pacientes enfermos. Desde 2018 estou contabilizando a quantidade de pacientes que atendi e que indiquei cirurgia bariátrica ou foram operados por indicação de outros profissionais. Só a título de curiosidade, somente a partir de 2022 que a prefeitura municipal de Aparecida de Goiânia passou a realizar  cirurgias bariátricas nos munícipes. Antes os pacientes faziam no Hospital Geral de Goiânia (HGG) ou por plano de saúde/particular. 

Contabilizei 948 pacientes submetidos a cirurgia bariátrica e que atendi desde 2018. Apesar de realizarmos apenas a Sleeve em nosso hospital (HMAP) a maioria dos pacientes foram submetidos ao Bypass em Y de Roux, ou seja, operaram no HGG ou por plano de saúde/particular. Depois, procuram o ambulatório de Nutrologia.

Mas por que estou contando essa questão epidemiológica? Simplesmente para mostrar que o que irei escrever abaixo não é fruto de vozes da minha cabeça. São constatações ao longo desses quase 10 anos. Ou seja, será que realmente vale a pena fazer cirurgia bariátrica?


Antes de tudo é preciso entender, quem é o paciente candidato à cirurgia bariátrica.

De acordo com Ministério da Saúde e  com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) estão aptas à cirurgia bariátrica:
  • Pessoas com IMC acima de 40 – com ou sem doenças associadas (comorbidades), com falha no tratamento clínico após 2 anos. 
  • Pessoas com IMC maior que 35, com alguma comorbidade – pressão alta, diabetes, gordura no fígado, refluxo gastroesofágico, problemas articulares. E com falha no tratamento clínico após 2 anos. 
Tratamento clínico compreende-se: dieta, exercício físico e uso de medicação antiobesidade. 

Ok, o paciente está apto, e aí, eu indico ou não? Depende.



Tanto no consultório particular quanto no SUS, sou bem realista e exponho a eficácia do tratamento não cirúrgico da obesidade.

Dependendo do grau da obesidade, dificilmente alguns pacientes conseguirão emagrecer somente com dieta e exercício físico. Isso corrobora com os grandes estudos epidemiológicos e vejo se confirmando na prática clínica após quase 10 anos à frente do ambulatório, além dos 14 anos de consultório. Quando passamos a tratar com medicamentos, a taxa de sucesso já melhora consideravelmente, em especial com as novas drogas para tratamento da obesidade (análogos de GLP-1)

Mas e quem já tentou de tudo: dieta, exercício, múltiplas medicações e mesmo assim não teve resultado? Deve operar? Mais uma vez depende e aqui começa o nosso papo. 

Ao longo desses anos vi pessoas sem opção, ou seja, ou operavam ou morriam decorrente das complicações da obesidade. Também vi pessoas que sequer tinham tentado tratamento medicamentoso e preferiram operar. Resultados: bom para alguns, péssimo para outros.

Eu vi, ouvi, acolhi, prescrevi:
  • Pacientes que antes da cirurgia não faziam dieta, nem atividade física, não usaram medicação e acreditaram que a cirurgia faria milagre. Resultado: grande perda de peso, com posterior reganho e hoje precisam fazer dieta continuamente, atividade física e alguns utilizar medicação. 
  • Paciente que já tinha tentado dieta e atividade física, uso de medicação. Fez cirurgia, depositou toda confiança na cirurgia. Foi submetido à cirurgia. Teve perda de peso considerada ruim e continua tendo que fazer dieta, atividade física e usando medicação. 
  • Paciente que tinha indicação formal para a cirurgia, teve grande perda de peso, não recuperou o peso, mas começou a apresentar complicações decorrentes da cirurgia. Está magro(a) mas buscando tratamento para as complicações disabsortivas. 
  • Paciente previamente com transtornos psiquiátricos, que "burlaram" o acompanhamento com psicólogo e psiquiatra, recebendo autorização dos mesmos. Operaram, tiveram perda de peso, reganharam o peso, parcialmente ou totalmente, hoje cursam com transtornos psiquiátricos mais severos, que necessitam de medicação que favorece ganho de peso.
  • Pacientes que tinham indicação, operaram, tiveram perda ponderal significativa, aceitaram que teriam que fazer atividade física, dieta, policiamento por toda a vida e acompanhamento dos nutrientes. Com sucesso terapêutico.
  • Paciente que foi submetido a Sleeve (apenas redução do tamanho do estômago = gastroplastica vertical), não teve perda ponderal significativa, não fez dieta corretamente e nem praticou atividade física. O cirurgião indicou o bypass. Fez o bypass e teve perda de peso importante, mas com reganho posterior. 

Ou seja, já vi de tudo, mas a pergunta que não quer calar: "Mas você Dr. Frederico indica a cirurgia?". 

Depende. Depende do histórico do paciente e isso inclui:
  • Hábitos dietéticos: as preferências alimentares desse paciente, o padrão alimentar (hiperfágico, compulsivo, beliscador, comer emocional), capacidade de seguir restrições alimentares. 
  • Atividade física e exercício físico que esse paciente fez ao longo da vida. Se conseguirá praticar após a cirurgia. 
  • Antecedentes psiquiátricos: se tem alguma doença psiquiátrica de base. A história psiquiátrica familiar. Se já necessitou fazer uso de psicofármacos ou se faz uso. Esse paciente faz acompanhamento psicoterápico? Como ele lidará com o novo corpo? E se ele não alcançar o corpo idealizado, como reagirá? E se mesmo após a mudança corporal ele perceber que terá que continuar fazendo dieta, exercício e tomando medicação antiobesidade, qual será a reação dele?
  • As comorbidades que esse paciente apresenta. Já que algumas ortopédicas podem dificultar a prática de exercício, o que favorecerá uma grande perda de massa muscular e com isso piora das alterações ortopédicas. Ou arritmias mais severas que impossibilitam exercícios que elevam muito a frequência cardíaca. 
  • Suporte familiar: a pessoa terá auxílio de alguém no pós-operatório imediato e para reforçar a necessidade de acompanhamento periódico?
  • Poder aquisitivo: aqui é um ponto importante e muito negligenciado principalmente no SUS. Muitas equipes não informam a média de gastos que esse paciente terá. Tenho uma tabela que mostro o custo médio dos polivitamínicos e poliminerais que esse indivíduo terá que usar por toda a vida. Bons produtos não são baratos. E o pior, na maioria das vezes o paciente terá que usar não só o polivitamínico, mas também dose adicional de cálcio, vitamina D, B12 (via oral ou sublingual ou injetável), ferro endovenoso. As vezes suplementos proteicos. As vezes enzimas digestivas.


A vida é feita de escolhas e a vida do médico também. Mas cabe ao médico quando indicar algo, levar em conta todas essas variáveis. E por que falo isso? Por que já indiquei cirurgia e alguns pacientes se arrependeram.

Obviamente eles não me culpam, afinal a escolha é do paciente. Agi dentro da Medicina baseada em evidência. Nesses casos é risco-benefício. Paciente de quase 200Kg que se não fizesse a cirurgia provavelmente viveria menos, teria algum evento cardiovascular (infarto, AVC). 

Assim como contraindiquei a cirurgia por já conhecer o paciente de longa data, acompanhei a falha no tratamento clínico, mas insisti no tratamento medicamentoso. O paciente não quis mais e pediu o laudo para o Endócrino. Operou e hoje faz acompanhamento comigo, tendo que tratar os déficits nutrológicos, ouvir a cada 3 meses eu falando sobre importância do exercício, do controle dietético e alguns utilizando medicação. 

Ou seja, a cirurgia bariátrica salva vidas (de alguns) quando bem indicada. Porém, quando a indicação não é cautelosa, quando aspectos psiquiátricos/dietéticos são negligenciados, podemos no deparar com verdadeiros desastres e culminar na seguinte frase: "Essa cirurgia acabou com minha vida" ou " se arrependimento matasse".

Portanto, se você está aventando a cirurgia, seja cauteloso, procure um bom cirurgião e saiba que:
  • A parte mais importante do tratamento é aceitar que a obesidade é uma doença. Doença esta que é crônica, recidivante, INCURÁVEL, com forte componente genético e de causa multifatorial. Aceite que é uma doença e que suas ações determinam o sucesso do tratamento.
  • Você pode estar magro após a cirurgia, bem magro, seu corpo ainda terá as células de gordura (adipócitos). A vigilância deverá ser eterna. 
  • A cirurgia bariátrica não é a cura para obesidade e muito menos o último tratamento disponível. É uma modalidade terapêutica, comprovadamente eficaz de acordo com centenas de estudos, porém, é apenas o início de uma nova jornada. Se o paciente terá sucesso terapêutico ou não, dependerá de alguns fatores: aceitação da doença, mudança de mentalidade, prática regular de exercício físico, aumento da atividade física, dieta, psicoterapia.
  • Dieta será por toda vida, se você comer alimentos ricos em sacarose ou em gordura, você conhecerá uma sensação terrível, o famoso Dumping. Pelo menos nos primeiros 5 anos a minha recomendação é que você mantenha acompanhamento com um bom nutricionista com experiência na área. 
  • Exercício físic preferencialmente 300 minutos por semana, no mínimo 150 minutos. Por toda a vida. Comece logo quando o cirurgião liberar. Qual a mais indicada: musculação. "Ah mas eu odeio", vai ter que deixar de odiar. A musculação será o que evitará que você perca muita massa muscular durante o processo de emagrecimento e que ajudará a evitar que você reganhe o peso perdido. Lembre-se: Ad eternum.
  • A dieta deverá ser mais proteica. É super comum pós-bariátricos rejeitarem proteínas, principalmente animal. Então, lembre-se, proteína dietética é um dos determinantes do sucesso da cirurgia. Constatação de prática clínica ao longo desses anos. 
  • Dependendo da técnica utilizada: sleeve ou bypass você poderá ter maior ou menor déficits nutricionais. O sleeve é uma cirurgia restritiva, corta o estômago e com isso a absorção de ferro, B12 caem. Já o bypass além de cortar o estômago, o cirurgião faz um desvio, ou seja, ligando o novo estômago, lá embaixo, no jejuno. Ou seja, fica sem absorver uma série de nutrientes no intestino delgado e no começo do jejum, como por exemplo: Vitamina B1, B9, B12, Cálcio, Ferro, Vitamina D. Ou seja, pelo menos duas vezes ao ano terá que fazer um check-up nutrológico básico para saber como estão os nutrientes. 
  • Se o componente emocional foi crucial no surgimento da obesidade, não é porque emagreceu que ele deixará de existir. Então, faça psicoterapia por toda a vida. 
Autor: Dr. Frederico Lobo - Médico Nutrólogo - CRM-GO 13192 - RQE 11915 / CRM-SC 32949 - RQE 22416

quinta-feira, 16 de maio de 2024

16 de Maio - Dia mundial da conscientização da doença celíaca

Para explicarmos o que é a Doença Celíaca (DC), antes precisamos entender o que é o glúten?

Glúten é uma proteína de serve que está presente no trigo. Mas frequentemente esse termo é utilizado para denominar proteínas semelhantes que estão presentes na cevada (Hordeína), no centeio (secalina). Ele é formado por duas proteínas: a glutenina e gliadina. Sendo que a glutenina confere viscosidade e elasticidade, enquanto que a gliadina é responsável pela extensibilidade da massa do pão.

O que é a Doença celíaca?

Consiste em uma doença do intestino delgado (enteropatia) que acomete crianças e adultos geneticamente predispostos, fazendo com que esses não tolerem nada que contenha glúten.

É uma doença sistêmica, autoimune desencadeada pela ingestão do glúten. Caracteriza-se pela inflamação crônica na mucosa intestinal, podendo levar a uma atrofia das vilosidades intestinais e gerando uma má absorção intestinal de vários nutrientes, além de manifestações clínicas.

Resumindo, na DC ocorre a presença de:

  • Combinação de manifestações clínicas glúten-dependentes (sintomas e sinais)
  • Presença de anticorpos específicos para a DC:  anticorpo antitransglutaminase tecidual (TG2), anticorpo endomisial (EMA) e anticorpo contra as formas deamidadas de peptídeos gliadina
  • Marcadores genéticos: HLA -DQ2 e HLA -DQ8
  • Presença da enteropatia
Aspectos epidemiológicos

Estima-se que acometa 1% da população da população mundial.  De acordo com uma revisão sistemática e meta-análise publicada em 2018 DC é um problema de saúde pública global. Os seguintes dados são apontados:
  • A prevalência global dessa condição é de 1,4% com base em achados sorológicos e 0,7% com base em achados de biópsia (soroprevalência de 1,4%  e prevalência de  0,7% )
  • A prevalência global de DC varia com sexo, idade, e localização geográfica.
  • A prevalência global de DC tem aumentado ao longo do tempo, passando de 0,6% entre 1991 a 2000 para 0,8% entre 2001 e 2016.
Infelizmente, no Brasil ainda não temos um estudo multicêntrico que defina a prevalência da DC, mas estima-se com base na prevalência mundial que haja no Brasil hoje cerca de 2 milhões de celíacos, sendo que a grande maioria ainda não tem diagnóstico.



Fisiopatologia e fatores de risco

A fisiopatologia ainda não está muito bem estabelecida, mas sabe-se que fatores genéticos combinados a fatores ambientais favorecem o surgimento da DC.

Os fatores genéticos estão fortemente relacionados com o desenvolvimento da DC, que se trata de uma doença poligênica. A presença do HLA -DQ2 (alelos DQA1∗05/DQB1∗02) é identificada em 90 a 95% dos celíacos, e em 5 a 10% dos portadores da doença é identificada a presença do gene HLA -DQ8 (DQA1∗0301/DQB1∗0302). Embora a presença dos genes HLA -DQ2 e DQ8 para o desenvolvimento da DC seja fundamental, sua existência não é sinônimo de que um indivíduo desenvolverá, obrigatoriamente, a doença. Cerca de 30 a 40% da população mundial possui os genes HLA -DQ2 e DQ8; entretanto, apenas 2 a 3% desenvolvem a DC, o que indica que outros genes e fatores ambientais são necessários para que a doença se manifeste.

Fatores protetores (controversos):  
Amamentação e exposição ao glúten após os 4 meses durante a introdução alimentar

Fatores de risco
  • Ausência de aleitamento materno
  • Infecções gastrintestinais na infância
  • Modificações genéticas do trigo (controverso)
  • Processos industriais empregados para melhorar a qualidade dos alimentos, como a utilização de enzimas transglutaminase microbiana (mTG);
  • Padrões dietéticos ocidentais, que promovem o consumo de elevadas quantidades de glúten.

Existem algumas patologias que, recorrentemente, são associadas à DC; entre elas, citam-se:
  • Diabetes mellitus tipo 1 – 3 a 12%;
  • Síndrome de Down – 5 a 12%;
  • Doença autoimune da tireoide – > 7%;
  • Síndrome de Turner – 2 a 5%;
  • Síndrome de Williams – > 9 %;
  • Deficiência de imunoglobulina A (IgA) – 2 a 8%;
  • Doença autoimune do fígado – 12 a 13%.


O quadro clínico da DC

Manifestações clínicas podem ser divididas em:

Gastrintestinais:
  • Diarreia crônica;
  • Constipação crônica;
  • Dor abdominal;
  • Náuseas;
  • Vômitos;
  • Distensão abdominal.
Extra-intestinais:
  • Déficits de ganho de peso e altura;
  • Atraso na puberdade;
  • Anemia crônica;
  • Osteopenia ou osteoporose;
  • Defeitos no esmalte dentário;
  • Irritabilidade;
  • Fadiga crônica;
  • Neuropatia;
  • Atrite/artralgia;
  • Amenorreia;
  • Aumento nos níveis das enzimas hepáticas;
  • Abortamento de repetição
Classificação

Segundo as Definições de Oslo, a DC pode ser classificada de acordo com os sintomas identificados:
  • Clássica – quando os sintomas são caracterizados pela presença de mal absorção intestinal, com ocorrência de diarreia, esteatorreias, vômitos, distensão abdominal, flatulência, perda de peso e déficit de crescimento;
  • Não clássica – os sintomas são intestinais, porém não envolvem mal absorção, como no caso de pacientes que apresentam constipação e dor abdominal;
  • Subclínica – os sintomas são extraintestinais, como quando há presença de anemia ferropriva, de anormalidades nas funções do fígado, osteoporose etc;
  • Assintomática – nos casos em que há ausência de sintomas.


Diagnóstico

Pode ser dado pelo Nutrólogo, Gastroenterologista, Pediatra. 
Importante salientar que o nutricionista não dá diagnóstico nosológico (doença), mas terá papel crucial no tratamento.

A Biópsia (6 fragmentos) de intestino delgado, até o momento, é considerada o método padrão-ouro para o diagnóstico da DC. Porém, pode apresentar falsos negativos. 
+
A pesquisa de Auto-anticorpos:
  • Anti-transglutaminase tecidual (TG2) IgA: o que solicitamos para triar
  • Anticorpo endomisial (EMA) IgA,
  • Anticorpo contra as formas deamidadas de peptídeos gliadina IgA
É importante salientar que durante a pesquisa para fechar o diagnóstico o paciente deverá estar consumindo glúten, para evitar falsos negativos.



Tratamento

O tratamento consiste na remoção total dos alimentos com glúten:
“Remoção total? Nem um pouquinho?” Não, nem um pouquinho. É remoção total. 

Isso pode ser bastante difícil devido alguns fatores:
  • A contaminação (cruzada) dos alimentos com o glúten, que ocorre quando os alimentos sem glúten entram em contato com os que contêm
  • glúten no armazenamento ou na manipulação;
  • Elevado custo dos produtos sem glúten;
  • Restritas opções de produtos sem glúten.
A principal dúvida dos pacientes após o diagnóstico é: Quais são os alimentos permitidos para quem tem  doença celíaca?
  • Cereais: arroz, milho.
  • Farinhas: mandioca, arroz, milho, fubá, féculas.
  • Gorduras: óleos vegetais e animais, manteiga.
  • Frutas: todas, ao natural e sucos.
  • Laticínios: leite, manteiga, queijos e derivados.
  • Hortaliças, raízes e leguminosas.
  • Carnes e ovos: aves, suínos, bovinos, caprinos, miúdos, peixes, frutos do mar.
  • Sementes e oleaginosas
E como o Nutrólogo vai te auxiliar?

Na minha prática, inúmeras vezes dei o diagnostico de doença celíaca ao acaso. Pacientes que vieram consultar devido diarréia ou intolerâncias alimentares. Porém, como atraio pacientes celíacos (meu nutricionista é portador), nos últimos anos tenho solicitado a anti-tranglutaminase IgA para quase todos os pacientes com doença celíaca. E o que mais me assusta é a quantidade de pacientes que recebem o diagnóstico já tardiamente, ou seja, na vida adulta. 

No caso acima, falei de triagem, investigação de sintomas, mas uma vez já estabelecido o diagnóstico, como o Nutrólogo poderá ajudar um paciente celíaco? Para responder essa pergunta é preciso entender que essa enteropatia cursa com alteração na absorção de nutrientes, em especial de vitaminas e minerais. Portanto, faz-se necessário dosar alguns nutrientes específicos que comumente podem estar baixos nos celíacos. Além disso, esses pacientes podem apresentar outras doenças do trato digestivo ou doenças sistêmicas. Logo, deve-se investigar melhor esse paciente, acolher, ouvir atentamente as queixas. Fazer um recordatório alimentar e analisar se há risco nutricional.

Há ainda os riscos de uma dieta sem glúten não supervisionada. Ou seja, muitas vezes o paciente recebe o diagnóstico e por anos segue uma dieta que acredita ser adequada. Quando vem à consulta, detectamos vários déficits nutricionais. Esse é o principal papel do Nutrólogo na Doença celíaca. 

O Nutrólogo com bom senso, assim como o gastro, encaminhará esse paciente para um nutricionista elaborar um plano alimentar nutricionalmente equilibrado. No meu caso, todos meus pacientes encaminho para o Rodrigo Lamonier, já que ele é o Nutricionista que treinei, atende comigo e entende muito de doença celíaca, por ser portador. Ou seja, conhece todos os desafios que o paciente encontrará.

O Rodrigo Lamonier atende presencial e online. Para agendar com ele clique aqui.

Autor: Dr. Frederico Lobo - Médico Nutrólogo - CRM-GO 13192 - RQE 11915 / CRM-SC 32949 - RQE 22416

Bibliografia:
  • FENACELBRA - https://www.fenacelbra.com.br/doenca-celiaca
  • Leonard MM, Sapone A, Catassi C, Fasano A. Celiac Disease and Nonceliac Gluten Sensitivity: A Review. JAMA. 2017 Aug 15;318(7):647-656. doi: 10.1001/jama.2017.9730. PMID: 28810029.
  • Nascimento AB, Fiates GMR. Doença celíaca e sensibilidade ao glúten não celíaca: da etiologia à abordagem nutricional. In: Associação Brasileira de Nutrição; Vaz EM, Fidelix MSP, Nascimento VMB, organizadores. PRONUTRI Programa de Atualização em Nutrição Clínica: Ciclo 3. Porto Alegre: Artmed Panamericana; 2014. p. 45-78. (Sistema de Educação Continuada a Distância; v. 3).
  • Naik RD, Seidner DL, Adams DW. Nutritional Consideration in Celiac Disease and Nonceliac Gluten Sensitivity. Gastroenterol Clin North Am. 2018 Mar;47(1):139-154. doi: 10.1016/j.gtc.2017.09.006. Epub 2017 Dec 7. PMID: 29413009.
 

sábado, 4 de maio de 2024

Ozempic é uma nova droga antiinflamatória?

Quase uma década atrás, uma mulher de vinte e poucos anos magra e de fala suave chamada Megan entrou no meu escritório e me presenteou com um meticuloso arquivo escrito à mão contendo seu histórico gastrointestinal. 

O arquivo incluiu descrições de seu diagnóstico inicial de doença de Crohn quando adolescente, as múltiplas operações que ela sofreu para remover partes doentes de seus intestinos e a variedade de sintomas que ela sofria, incluindo náuseas, uma dúzia de movimentos intestinais por dia e uma total dependência da nutrição obtida através de suas veias, conhecida como nutrição parenteral total (TPN). 

Em vez de vinte pés de intestino delgado que a maioria das pessoas tem, ela só tinha cerca de vinte polegadas restantes e foi diagnosticada com uma condição chamada síndrome do intestino curto. 

Tentamos uma variedade de tratamentos nos meses seguintes, mas ela permaneceu infeliz e principalmente em casa, incapaz de se concentrar em seus estudos ou tirar férias curtas com seus amigos. 

Finalmente, comecei com um medicamento injetável relativamente novo chamado Gattex (teduglutide), um análogo de um hormônio humano secretado por células intestinais conhecidas como peptídeo-2 semelhante ao glucagon (GLP-2).

Gattex melhorou o fluxo e a absorção do sangue intestinal, retardando o esvaziamento gástrico e aumentando a altura das pequenas projeções semelhantes a dedos nos intestinos de Megan conhecidas como vilosidades. Seis meses ou mais depois que ela começou a droga, Megan não estava apenas livre de sintomas gastrointestinais: ela também conseguiu descontinuar seu TPN nos fins de semana, uma liberdade anteriormente inimaginável. Gattex é um medicamento caro e apropriado para uso apenas em determinados contextos clínicos para pacientes com doenças raras. A droga foi lenta para chamar atenção dentro ou fora da gastroenterologia. Nos anos que se seguiram, continuei a usá-lo para pacientes como Megan. Para esses pacientes, parecia nada menos que um milagre.

Hoje, outro peptídeo semelhante ao glucagon, o GLP-1, é amplamente aclamado como milagroso.

O GLP-1, como o GLP-2, é um hormônio secretado pelas células intestinais e está sendo estudado em pacientes com síndrome do intestino curto. 

Ao contrário do Gattex, no entanto, as drogas que imitam o GLP-1 (GLP 1s) são atualmente prescritas para algumas das condições crônicas mais comuns nos EUA hoje - diabetes e obesidade - e foram banhadas com a atenção da mídia nos últimos dois anos no contexto do controle de peso. 

Tradicionalmente, os GLP-1s foram desenvolvidos para tratar o diabetes tipo 2. 

Essas drogas injetáveis se assemelham aos hormônios que o corpo produz depois de comer, estimulando a secreção de insulina pelo pâncreas e diminuindo os níveis de açúcar no sangue. 

Eles retardam a digestão e diminuem o apetite. Eles afetam partes do cérebro que controlam a fome, dizendo ao seu cérebro para se sentir cheio por um longo período de tempo. Não surpreendentemente, os GLP-1s podem levar a menor gordura corporal - um efeito colateral bem-vindo para muitos pacientes diabéticos que lutam com problemas de peso. 

Alguns GLP-1s agora são aprovados pela FDA para controle de peso crônico, incluindo Wegovy (semaglutida) e Saxenda (liraglutida), enquanto outros como Ozempic (semaglutida) são aprovados para diabetes tipo 2, mas são usados off-label para controle de peso—inclusive para perda de peso cosmética, depois de serem popularizados por celebridades e influenciadores de mídia social.

Se os agonistas do GLP-1 como Wegovy e Ozempic são drogas maravilhosas modernas, seus efeitos no peso corporal e no açúcar no sangue são apenas uma parte de sua história sensacional. 

Uma característica menos conhecida dos GLP-1s - e GLP-2s - é seu potencial de reduzir a inflamação local e sistêmica dentro do corpo, tanto nos intestinos quanto além. 

Sabemos hoje que a inflamação pode ser um fator de risco importante para o desenvolvimento de todos os tipos de doenças. 

A inflamação de baixo nível está ligada a uma grande variedade de condições crônicas, incluindo doenças cardíacas, câncer, obesidade, diabetes e distúrbios neurodegenerativos, todos os quais podem ser considerados, pelo menos em parte, distúrbios inflamatórios crônicos (CIDs).

Em indivíduos obesos, o excesso de gordura corporal - particularmente a gordura visceral armazenada profundamente dentro do corpo - produz inflamação de baixo nível a todas as horas do dia. 

A inflamação pode ser um mecanismo central pelo qual indivíduos obesos desenvolvem DICs adicionais, incluindo os principais assassinos, como doenças cardíacas e câncer. 

Pesquisas novas e emergentes sugerem que os GLP-1s, agindo através de vias anti-inflamatórias, podem ser benéficos em uma variedade de DICs, com o potencial de ajudar não apenas pacientes com diabetes e obesidade, mas também aqueles sem essas condições.

Dados recentes revelam que os GLP-1s são úteis em doenças cardíacas, uma condição que atualmente é a principal causa de morte em homens e mulheres em todo o mundo. 

Em agosto de 2023, um estudo patrocinado pelo fabricante Wegovy Novo Nordisk foi publicado no New England Journal of Medicine (NEJM). 

Os pesquisadores rastrearam 529 pacientes com obesidade e insuficiência cardíaca, designando-os para receber semaglutida semanal ou placebo por um ano. Eles descobriram que os pacientes tratados com semaglutida tiveram não apenas maior perda de peso do que aqueles em placebo, mas também menos sintomas e limitações físicas, bem como melhor tolerância ao exercício.

Alguns meses depois, em novembro de 2023, os resultados de um ensaio clínico histórico conhecido como o ensaio SELECT, que também foi patrocinado pela Novo Nordisk, causaram um alvoroço. 

Cerca de 17.000 pacientes com doença cardiovascular que estavam acima do peso ou obesos, mas não tinham diabetes, foram randomizados para receber semaglutida semanal ou placebo por vários meses. No final do período do estudo, os pesquisadores descobriram que os pacientes que receberam semaglutida não apenas perderam peso: eles tiveram uma impressionante diminuição de 20% nos eventos cardiovasculares, incluindo morte cardiovascular, ataques cardíacos e derrames. 

Além disso, a semaglutida diminuiu a insuficiência cardíaca e a mortalidade por todas as causas em 18% e 19%, respectivamente. 

Curiosamente, a semaglutida parecia estar prevenindo ataques cardíacos nos primeiros meses de tomar o medicamento, antes que os participantes do estudo perdessem muito peso, apoiando a ideia de que os pacientes não precisavam perder peso antes de começar a experimentar os benefícios cardiovasculares do medicamento.

Aqueles que tomaram a dose mais alta de semaglutida no ensaio SELECT tiveram quedas na inflamação sistêmica. 

Essa redução da inflamação pode ser um mecanismo importante pelo qual a semaglutida produz seus benefícios cardíacos. 

Estudos mostraram que a inflamação elevada de baixo nível é um fator de risco independente para o desenvolvimento de ataques cardíacos, derrames e morte por eventos cardíacos.

A semaglutida também ajudou a melhorar os fatores de risco tradicionais para doenças cardíacas, incluindo sobrepeso e obesidade, bem como níveis elevados de pressão arterial, açúcar no sangue e colesterol.

Esses fatores de risco tradicionais, por sua vez, também estão ligados à inflamação crônica e de baixo nível.

Além das doenças cardíacas, os GLP-1s podem ter um papel em outros DCIs.

Nas últimas décadas, a incidência de câncer de início precoce, ou seja, câncer diagnosticado em adultos com menos de 50 anos de idade, tem aumentado. 

Acredita-se que esta epidemia global emergente se deva em grande parte a fatores ambientais e de estilo de vida, como uma dieta subótima, falta de exercício e poluição - todos os quais podem desencadear inflamação no corpo. 

Em dezembro de 2023, pesquisadores da Case Western University publicaram resultados de um estudo observacional nacional envolvendo mais de um milhão de pacientes com diabetes tipo 2 que receberam medicamentos antidiabéticos de 2005 a 2019.

Em comparação com outros medicamentos antidiabéticos, incluindo insulina e metformina, os GLP-1s foram associados a um risco diminuído de câncer colorretal, um achado que se manteve forte, independentemente de o paciente ter diabetes sozinho ou diabetes, além de sobrepeso ou obesidade. 

Estudos observacionais não podem provar a causalidade, e descobrir como o GLP-1 afeta o câncer provavelmente será complexo, dada a natureza multifatorial da causa do câncer, que inclui influências genéticas e ambientais.

Ainda assim, sabemos hoje que a inflamação é uma das características do câncer.

A inflamação, em muitos casos, alimenta o início e o desenvolvimento do câncer, desde as primeiras influências genéticas e epigenéticas que transformam células normais em malignas até o crescimento e disseminação contínuos do câncer por todo o corpo. 

Os GLP-1s podem influenciar as vias que promovem o câncer não apenas controlando o peso e o açúcar no sangue, mas também através de seus efeitos anti-inflamatórios, independentemente desses fatores de risco tradicionais.

Uma proporção significativa de pacientes com diabetes ou obesidade está destinada a desenvolver doença renal. 

Profissionais que implantam GLP-1s para diabetes notaram que esses medicamentos também pareciam estabilizar a função renal dos pacientes. 

Tanto os ensaios experimentais quanto, mais recentemente, clínicos mostraram que os GLP-1s podem retardar o declínio renal e prevenir a perda substancial da função renal em pacientes diabéticos. 

GLP-1s como semaglutida e liraglutida demonstraram proteger os rins através da alteração do metabolismo da gordura e da energia.

Os pacientes que tomam GLP-1s tendem a ter melhor controle do açúcar no sangue, menor peso corporal e menor pressão arterial, o que também pode diminuir a inflamação e impactar positivamente a função renal. 

Além disso, pesquisadores da Universidade Monash, na Austrália, publicaram um estudo no início deste ano, revelando que o agonista GLP-1 liraglutida, com receptores nos rins, pode suprimir a inflamação e diminuir os marcadores de dano renal em modelos de doença renal de camundongos diabéticos e não diabéticos.

Outra complicação comum em pacientes com diabetes ou obesidade é a doença hepática esteatótica associada à disfunção metabólica (MASLD), anteriormente denominada doença hepática gordurosa não alcoólica (NAFLD).

O MASLD é agora a doença hepática crônica mais prevalente no mundo ocidental e afeta cerca de um terço da população dos EUA. 

Enquanto isso, faltam farmacoterapias licenciadas para esta doença. 

No MASLD, gotículas de gordura se acumulam no fígado, o que, por sua vez, pode levar à inflamação do fígado e cicatrizes ao longo do tempo - enquanto isso, a própria inflamação pode ajudar a alimentar esse caminho. 

A perda de peso é fundamental para reverter a doença em estágio inicial. 

Os GLP-1s estão sendo avaliados atualmente para o tratamento do MASLD.

Ensaios clínicos randomizados mostram que a semaglutida pode diminuir a gordura e a inflamação no fígado e melhorar os marcadores de lesão hepática, embora ainda não tenha sido demonstrado melhorar os estágios de cicatrizes hepáticas.

O tratamento com semaglutida também está associado a uma diminuição da inflamação de baixo nível em todo o corpo em pacientes em risco de desenvolver MASLD. 

A inflamação de baixo nível é preditiva do MASLD e tem sido associada à presença e gravidade das cicatrizes hepáticas subjacentes. 

Testes estão em andamento para determinar se a semaglutida atenderá aos desfechos clínicos para aprovação da FDA.

Os GLP-1s receberam atenção em doenças pulmonares e intestinais. 

Os resultados de alguns ensaios clínicos, bem como estudos observacionais, lançaram luz sobre os potenciais benefícios dos GLP-1s na asma, enfisema e bronquite crônica, embora ensaios clínicos em larga escala sejam necessários para confirmar esses achados. 

A obesidade, que cria inflamação crônica contínua no corpo, está cada vez mais associada à doença inflamatória intestinal (DII) e pode influenciar negativamente o curso da doença. 

Os cientistas também levantam a hipótese de que a obesidade contribui para o desenvolvimento da DII. 

Alguns estudos mostraram que pacientes com DII que tomam GLP-1s para diabetes reduzem a necessidade de esteróides ou medicamentos biológicos e têm menos hospitalizações ou cirurgias relacionadas ao IBD, sugerindo que os GLP-1s podem influenciar a atividade da doença na DII. 

Mais pesquisas são necessárias, no entanto, para determinar definitivamente se os GLP-1s são realmente benéficos para os resultados da doença em pacientes com DII.

* Como os GLP-1s podem diminuir a inflamação no corpo?

O melhor controle de DCIs como diabetes e obesidade reduz os níveis de gordura corporal e açúcar no sangue, o que significa menos inflamação. 

Mas foi demonstrado que os GLP-1s têm efeitos anti-inflamatórios independentemente do peso corporal ou do açúcar no sangue. 

Ensaios em humanos revelam que eles reduzem os biomarcadores inflamatórios do sangue, especialmente quando comparados com outros tratamentos antidiabéticos padrão. 

E eles parecem afetar a inflamação local e de todo o corpo. 

Os GLP-1s têm efeitos anti-inflamatórios em vários tecidos, reduzindo a produção de citocinas inflamatórias e impedindo o movimento de células imunes nos tecidos. 

Os receptores para GLP-1s são expressos em algumas células imunes - falando em seu potencial de modular o sistema imunológico e a inflamação - bem como em outras células ao redor do corpo. 

Eles são encontrados não apenas no pâncreas, mas em uma ampla variedade de órgãos, incluindo coração, rins, pulmão, fígado, vasos sanguíneos, estômago, intestinos e cérebro. 

Na verdade, a prevalência de receptores GLP-1 no corpo ajudou a despertar o interesse inicial em estudos que investigam o uso de GLP-1s para outros distúrbios além do diabetes.

No entanto, a distribuição de células imunes contendo receptores GLP-1 em vários tecidos é altamente desigual, sugerindo que as ações dos GLP-1s em alguns órgãos podem ser mais importantes do que em outros quando se trata de regular a inflamação. 

As células imunes ativadas pelos GLP-1s estão especialmente repletas nos intestinos—que abrigam grande parte do sistema imunológico do corpo—bem como no cérebro. 

De acordo com o cientista canadense Dr. Daniel Drucker, cuja pesquisa pioneira deu origem aos medicamentos modernos GLP-1, o eixo intestinal-cérebro-imune pode ser central para a capacidade dos GLP-1s de influenciar a inflamação no corpo, como sugere seu último estudo realizado em animais e publicado no início deste ano. 

A comunicação bidirecional entre o intestino e o cérebro incorpora sinais de trilhões de micróbios intestinais conhecidos coletivamente como microbiota intestinal e afeta uma infinidade de processos ao redor do corpo, incluindo a inflamação.

Os GLP-1s podem modular a microbiota intestinal e atingir células imunes no cérebro e no intestino para reduzir a inflamação em todo o corpo.

Dados os benefícios potenciais dos GLP-1s no cérebro, não é surpresa que haja um interesse crescente no uso de GLP-1s para doenças neurodegenerativas. 

Ensaios controlados apontam para a capacidade dos GLP-1s de reduzir as taxas de demência em pacientes diabéticos, e ensaios clínicos em larga escala estão em andamento para estudar a eficácia desses medicamentos para doenças como Alzheimer e Parkinson. 

Acredita-se que os GLP-1s modulam a função imunológica no cérebro, prevenindo o acúmulo contínuo de proteínas mal dobradas e diminuindo a inflamação - caminhos que contribuem para a doença de Alzheimer e outras doenças neurodegenerativas.

Por todas as possibilidades que os GLP-1s parecem ter no gerenciamento de inflamação e CIDs, deve-se ter cuidado ao avaliar e implantar esses medicamentos fora de seus contextos tradicionais.

Seus efeitos anti-inflamatórios são amplos, visando diferentes vias em diferentes tecidos, e sua gama de benefícios potenciais também pode ser acompanhada por problemas.

Embora os GLP-1s sejam geralmente bem tolerados, com efeitos colaterais comuns, incluindo problemas gastrointestinais como náuseas, vômitos, diarréia e constipação, complicações raras e mais graves incluem problemas como paralisia estomacal, pancreatite, obstrução intestinal, insuficiência renal e câncer de tireóide. 

Dados de segurança de longo prazo em populações não diabéticas são necessários para os GLP-1s mais recentes que são mais eficazes para perda de peso.

Os medicamentos também são caros, muitas vezes exigindo custos significativos do próprio bolso. 

Em suma, os GLP-1s não devem ser usados como uma solução rápida para perder alguns quilos, mas sim para pacientes em que o perfil risco-benefício faz sentido - em indivíduos obesos com alto risco de desenvolver DCIs adicionais, por exemplo, nos quais o uso de GLP-1s parece menos preocupante do que os riscos associados a uma vida de problemas graves de peso. 

Para muitos indivíduos obesos, os transtornos metabólicos, incluindo um ambiente hormonal alterado, podem tornar difícil perder e manter o excesso de peso indefinidamente sem terapias médicas ou cirúrgicas adjuvantes.

Infelizmente, as pessoas que mais precisam de GLP-1s para o controle de peso muitas vezes lutam para obtê-lo.

Prescrever GLP-1s para obesidade—ou qualquer distúrbio crônico—não evita a necessidade de mudanças no estilo de vida, que são fundamentais para diminuir a inflamação e o risco de desenvolver DCIs. 

Na verdade, certas mudanças no estilo de vida, como incorporar fibra mais solúvel - um tipo de fibra que alimenta nossos micróbios intestinais - na dieta, ou se exercitar regularmente, podem aumentar os níveis endógenos de GLP-1.

As prescrições de estilo de vida também podem ajudar a diminuir os riscos dos GLP-1s, permitindo que os pacientes sejam mantidos com a menor dose efetiva ou até mesmo desmamem totalmente os GLP-1s em algum momento.

Drogas GLP-1 como Ozempic e Wegovy ganharam imensa tração clínica, bem como fama cultural popular devido ao seu sucesso no tratamento do sobrepeso e da obesidade, doenças conspícuas que sobrecarregam mais de dois terços de todos os adultos americanos.

No entanto, seus efeitos podem ser mais amplos do que nunca imaginado: evidências estão se acumulando sobre o potencial dos GLP-1s para combater a inflamação invisível e de baixo nível, bem como várias das condições crônicas associadas a ela.

Mas, embora os GLP-1s possam ser promissores para o tratamento de uma variedade de doenças, mais pesquisas são necessárias para estabelecer exatamente quais populações de pacientes além das existentes podem se beneficiar desses medicamentos.

Enquanto isso, os pacientes devem discutir a potencial utilidade dos GLP-1s para uma condição específica com seus médicos.

E como no caso da minha paciente Megan, que entrou no meu escritório há muito tempo com uma doença rara terrível, o uso de peptídeos semelhantes ao glucagon - que são poderosos hormônios intestinais - não deve ser arrogante.


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quinta-feira, 2 de maio de 2024

Comitê do Senado americano investiga custos de Ozempic e Wegovy

O senador Bernie Sanders está pressionando a farmacêutica Novo Nordisk para obter detalhes sobre os preços dos populares medicamentos para diabetes e perda de peso.

Um comitê do Senado está investigando os preços que a Novo Nordisk cobra por seus medicamentos de grande sucesso, Ozempic e Wegovy, que são altamente eficazes no tratamento de diabetes e obesidade, mas têm preços altos.

O senador Bernie Sanders, de Vermont, presidente do Comitê de Saúde, Educação, Trabalho e Pensões do Senado, disse em uma entrevista que os preços devem “ser reduzidos para que os consumidores o obtenham e para que os governos não faliram fornecendo-o”. 

O preço de tabela do Ozempic, que é autorizado para diabetes tipo 2, é de cerca de US$ 968 por pacote. Wegovy, que é aprovado para perda de peso e para reduzir o risco de problemas cardíacos em alguns adultos com obesidade, custa US$ 1.349,02 por pacote.

Numa carta enviada quarta-feira a Lars Fruergaard Jorgensen, presidente-executivo da Novo Nordisk, Sanders escreveu que o comitê estava solicitando comunicações internas sobre os preços destes medicamentos nos Estados Unidos, que são mais elevados do que o custo noutros países. O comitê também solicitou informações sobre a razão pela qual a empresa cobra mais pelo Wegovy quando os dois medicamentos contêm o mesmo composto, a semaglutida, e perguntou se a Novo Nordisk iria “reduzir substancialmente” os preços de ambos os medicamentos. Sanders solicitou uma resposta até 8 de maio.

Um porta-voz da Novo Nordisk escreveu em um comunicado que a empresa concorda “que o acesso a esses tratamentos importantes é essencial para os pacientes no Medicare, Medicaid e nos mercados comerciais”, mas acrescentou que “é fácil simplificar demais a ciência que vai para entender a doença e desenvolver e produzir novos tratamentos, bem como os meandros dos sistemas de saúde dos EUA e globais”. O porta-voz disse que o Novo Nordisk “permanece comprometido em trabalhar com os formuladores de políticas para avançar soluções para apoiar o acesso e a acessibilidade para todos os pacientes”.

O Sr. Sanders disse que também pretendia olhar para Eli Lilly, que faz os medicamentos rivais Mounjaro e Zepbound.

“Não estamos apenas escolhendo o Novo Nordisk,” disse ele. “Este é um problema geral.”

Os Centros de Controle e Prevenção de Doenças estimam que quase 42% dos adultos americanos têm obesidade e que mais de 11% da população tem diabetes. "Você pensa apenas no grande número de pessoas que poderiam ser elegíveis para tomar esses produtos, e isso começa a realmente conjurar sua mente pensando em como pagar por isso", disse Stacie Dusetzina, especialista em políticas de saúde da Faculdade de Medicina da Universidade de Vanderbilt. Esses custos são agravados pelo fato de que os pacientes podem precisar tomar esses medicamentos pelo resto de suas vidas, acrescentou ela.

Muitos dos principais planos de seguro cobrem os medicamentos, mas a extensão da cobertura varia muito. Como os planos de saúde e os empregadores têm lutado para acompanhar o custo, alguns restringiram quem pode acessar esses medicamentos ou encerraram a cobertura. "Nós já passamos do ponto de ruptura", disse Lindsay Allen, economista de saúde da Northwestern Medicine.

Os planos estaduais do Medicaid não são necessários para cobrir tratamentos anti-obesidade; muitos cobrem Ozempic para diabetes. Os planos da Parte D do Medicare não cobrem medicamentos apenas para perda de peso, embora esses planos possam cobrir Ozempic para diabetes e Wegovy quando é usado para tratar problemas cardiovasculares.

Essa cobertura de retalhos e o alto custo dos medicamentos deixaram muitos pacientes incapazes de acessá-los.

“Nenhuma droga, não importa o quão grande seja, vale qualquer coisa se as pessoas não puderem pagar”, disse Sanders.

Especialistas disseram que esperavam que os preços caíssem à medida que a nova concorrência chegasse ao mercado. Mas a Dra. Allen disse que estava cética de que uma investigação reduziria os preços rapidamente. “Agora não é o momento em que nenhum desses fabricantes vai dizer: 'Ei, pela bondade de nossos corações, vamos em frente e reduzir esses custos.”

Dani Blum é repórter de saúde do The Times. Mais sobre Dani Blum

quarta-feira, 1 de maio de 2024

Padrão de alimentação baseado na dieta do mediterrâneo se associa com menor deposição de proteínas ligadas á Doença de Alzheimer



Cada vez mais existem evidências que demonstram que nosso cérebro é extremamente sensível ao nosso estilo de vida, e padrões de alimentação ricos em ultraprocessados, carboidratos refinaria e gorduras saturadas, além do sedentarismo podem estar associado a um risco aumentado de demência (como o Alzheimer).

Assim, um grupo de pesquisadores criou uma dieta chamada MIND, que leva em consideração os padrões clássicos de duas dietas mais conhecidas, a Dieta do Mediterrâneo e a dieta DASH. De forma geral, o estímulo é a maior consumo de grãos, fibras (em frutas e verduras), carnes magras em geral, nozes/castanhas, e azeite como fonte principal de gordura (ao invés de gorduras saturadas).

Um grupo de voluntários idosos aceitou em fornecer seu cérebro para autópsia post-mortem, e assim pode ser avaliado diretamente alguns marcadores de demências, como o depósito de beta amiloide e proteína Tau no cérebro, entre outros. 581 cérebros, com morte ao redor dos 91 anos foram avaliados.


Correlacionando essas informações com um recordatório alimentar que esses indivíduos fizeram ao longo da vida (ajustado para outros hábitos, como exercício), os pesquisadores conseguiram concluir que houve uma relação clara entre seguir os preceitos dessa dieta tiveram uma patologia cerebral muito menos evidente do que os tinham hábitos considerados menos saudáveis.

O estudo segue sendo observacional, e mesmo com ajuste para outros fatores, não é possível excluir que outros hábitos comuns a essas pessoas sejam o real fator protetor, mas o estudo certamente reforça a ideia de que o cérebro é mais uma “vítima” do estilo de vida moderno, e estratégias de melhora de alimentação, exercício, e tratamento de doenças como obesidade e diabetes podem reduzir a chance de ele ficar doente!

Artigo: Agarwal. Association of Med-DASH intervention for NG delay and Med Diets with AD pathology. Neurology 2023

Autor: Dr. Bruno Halpern 
https://www.instagram.com/p/C6Zk3JPO_sM/?utm_source=ig_web_copy_link

quarta-feira, 24 de abril de 2024

Nota de Informação Científica sobre os reais procedimentos competentes a Especialidade de Nutrologia - ABRAN

No dia 15 de Abril de 2023 a ABRAN emitiu um parecer sobre os reais procedimentos competentes a Especialidade de Nutrologia. Já que algumas pós-graduações estão anunciando algumas modalidades terapêuticas como parte do arsenal da Nutrologia. 



A nota diz: "A ABRAN por intermédio de seus canais de comunicação tem recebido informações sobre cursos de pós-graduação da área médica que estão divulgando de forma equivocada procedimentos médicos cabíveis para Nutrólogos. Tais procedimentos estão atrelados, especialmente, aos denominados implantes hormonais e as soroterapias.

Todavia, a ABRAN vem por intermédio da presente nota ratificar que tais atividades não estão presentes no rol de procedimentos do Médico Nutrólogo.

Sendo certo que o Especialista de Nutrologia tem como atividades/procedimentos os seguintes itens: Tratamentos diretos em face da obesidade, de transtornos alimentares, síndromes de má absorção, como a síndrome do intestino curto, diabetes, hipertensão, dislipidemia, atuação na terapia nutricional enteral e parenteral, atuação em face da desnutrição, entre inúmeras outras atividades.

Ademais, destaca-se a importância da melhor e mais completa formação curricular dos Docentes que ministram os cursos de Pós-Graduação, em especial a titulação na área de Nutrologia, a fim de que os cursos oferecidos tragam o melhor conhecimento científico, bem como reproduzam as melhores e corretas práticas e procedimentos que podem e devem ser aplicados dentro da literatura e legalidade.

Dessa forma, a ABRAN alerta aos médicos e a sociedade em geral sobre o tema, bem como repudia que médicos não especialistas em Nutrologia divulguem procedimentos ou cursos de Pós-Graduação para tratar da especialidade médica de forma errônea, o que prejudica o desenvolvimento da nobre Especialidade".



quinta-feira, 11 de abril de 2024

Controvérsias dentro da Nutrologia

Semanalmente recebo e-mail de leitores perguntando sobre vários temas. A maioria sabe que sou bem cético e radical quando o assunto é evidências científicas. Sou taxado de chato e por alguns colegas da área. Então resolvi fazer um post sobre isso.  

As opiniões aqui expressas não objetivam colocar pacientes em confronto com médicos que solicitam tais exames. Apenas explico o porquê de EU não solicitar tais exames e algumas terapias.

Cada médico solicita o exame que acha que deve, prescreve o que acha que deve. E assuma a responsabilidade diante do Conselho Regional de Medicina. Cada médico prescreve a terapia que deseja, porém arque com as consequências de prescrever uma abordagem terapêutica que tem resolução do CFM proibindo.

TEMA 1: Biorressonância


Há 15 anos eu me submeti ao exame. Encontrei, resultados opostos aos encontrados nos exames laboratoriais. Discrepância total. Exemplo: o exame mostrou ressonância para elevação do colesterol, do cortisol, glicemia. Todos meus exames laboratoriais estavam dentro na normalidade.

Pode ser que para alguns funcione, para mim não funcionou.

Portanto a bioressonância eu não solicito. A não ser que o Conselho Federal de Medicina e ANVISA emitam um parecer mostrando a eficácia do método. Caso o fabricante ou representante queira me mostrar documentos e artigos para provar a eficácia, estou aqui.

Pareceres que me respaldo para dar minha opinião médica:

TEMA 2: Testes de intolerância alimentar baseados em IgG ou IgG4 - Teste de hipersensibilidades alimentares


Parecer que me respaldo para emitir minha opinião, foi publicado pela Sociedade Brasileira de Alergia e Imunologia: http://asbai.org.br/revistas/vol356/Guia-35-6.pdf

"A dosagem de IgG específica e suas subclasses não oferece qualquer contribuição no diagnóstico e portanto sua prática não é recomendada"
Um outro material muito interessante é o disponível nesse site: https://www.sciencebasedmedicine.org/igg-food-intolerance-tests-what-does-the-science-say/

Começo do ano fiz uma revisão sobre métodos diagnósticos de alergias alimentares e todos os artigos mais atuais contraindicam o método. Os estudos afirmam que talvez a dosagem de IGG  ou IGG4 possa fornecer pistas sobre alergias alimentares, mas talvez estejam sendo interpretadas de forma errônea. Alguns amigos alergologistas compactuam da mesma opinião.

Em 2012 o Conselho Federal de Nutrição (CFN) foi questionado sobre a solicitação e execução de tal exame por parte de nutricionistas. 

"O “Food Detective” é um exame que utiliza o método Elisa para detecção de anticorpos IgG para 59 alimentos. O kit de exame é produzido pela Cambridge Nutricional Sciences Ltda, o resultado fica pronto em 40 minutos e necessita de apenas uma gota de sangue para realizar o exame.
Ressalta-se, no entanto, que alguns testes de alergia são questionáveis aos olhos dos profissionais médicos. É necessário considerar a confiabilidade do teste para realizá-lo. Não foi encontrado pelo CFN nenhum documento que certificasse a confiabilidade do Food Detective.
O teste considerado padrão-ouro no diagnóstico da alergia alimentar é o duplocego controlado por placebo (DADCCP), na qual a análise é feita por IgE (COCCO,2007).
A produção de anticorpos IgG e IgG4 específicos constitui resposta fisiológica à ingestão de alimentos, sem que implique qualquer manifestação clínica de hipersensibilidade alimentar (MORGAN, 1992; SZABO, 2000).
Apesar disso, painéis de anticorpos IgG ou IgG4 específicos para antígenos alimentares têm sido proclamados por alguns como instrumentos diagnósticos na alergia alimentar. Contudo, as evidências disponíveis não dão suporte à eficácia diagnóstica da dosagem de IgG específica em nenhuma doença em particular além da hemossiderose pulmonar (Síndrome de Heiner) (COCCO, 2007).
A Resolução CFN ° 380/2005 também reforça a solicitação de exames ao dispor atividades complementares como: “1.2.1. Solicitar exames laboratoriais necessários à avaliação nutricional, à prescrição dietética e à evolução nutricional do cliente/paciente;”
Portanto, o CFN não recomenda solicitação de exames de IgG por se tratar de diagnostico para alergias, sendo que, o diagnóstico de qualquer doença cabe ao médico realizar. A lei e as resoluções citadas dispõem que os exames são para acompanhamento dietoterápico.
As referências utilizadas por eles:

ASBAI – Associação Brasileira de Alergia e Imunopatologia. Alergia Alimentar. Acesso em:
08/10/2012.Disponível em: www.asbai.org.br.

Cocco, R.R.; Caelo-Nunes, I.C.; Pastorino, A.C.; et.al. Abordagem laboratorial no diagnóstico da alergia alimentar. Rev Paul Pediatr 2007;25(3):258-65.

Morgan JE, Daul CB, Lehrer SB. The relationship among shrimp-specific IgG The relationship among shrimp-specific IgG subclass antibodies and immediate adverse reactions to shrimp challenge. J Allergy Clin Immunol 1990;86:387-92.

Szabo I, Eigenmann PA. Allergenicity of major cow’s milk and peanut proteins determined by IgE and IgG immunoblotting. Allergy 2000;55:42-9.

Em Junho de 2015 o Jornal Estadão fez uma reportagem sobre o tema. Juntamente com o parecer oficial da ASBAI sobre o tema (http://m.vida-estilo.estadao.com.br/noticias/bem-estar,diagnosticos-de-alergias-e-intolerancias-alimentares-confundem-portadores-e-levam-a-deficiencias-,1707483)

Presentes em 40% da população, as intolerâncias alimentares são frequentemente confundidas com as alergias alimentares. Os sintomas são, em diversos casos, parecidos, e a falta de confiabilidade nos exames de detecção aumentam as dúvidas dos pacientes em relação a ambas as doenças. Segundo Renata Rodrigues Cocco, alergologista do Hospital Albert Einstein, “as alergias costumam apresentar sintomas que variam desde erupções cutâneas até problemas mais sérios, como distúrbios gastrointestinais (vômitos e diarreias) e anafilaxias (inchaço de órgãos do sistema respiratório)”. Já no caso das intolerâncias alimentares, os sintomas estão geralmente relacionados ao trato gastrointestinal. “É muito mais comum surgirem transtornos na digestão do alimento, que variam de intensidade de acordo com a quantidade consumida”, Outra diferença entre as alergias e as intolerâncias alimentares está no fator causador. “As alergias são reações ligadas a alguma proteína presente no alimento que foi considerada um elemento estranho pelo organismo. Já a intolerância ocorre quando o corpo não possui enzimas para digerir determinado carboidrato, como no caso da lactose, por exemplo”. Uma característica das alergias é que muitas são curadas naturalmente pelo organismo durante a vida, muitas vezes na fase de adolescência. “Por isso é muito mais comum em crianças. É muito raro encontrarmos adultos com alergias alimentares”, comenta. As intolerâncias podem surgir já durante a fase adulta e, uma vez adquiridas, persistem pelo resto da vida. “Devido ao fato de ser causada pela falta de uma enzima, a única coisa que podemos fazer é criar uma dieta de restrição. Entretanto, comparada à alergia, a atenção que devemos ter não é tão radical, pois os sintomas são menos agressivos”, verifica a alergologista.

Tratamento: Tanto para alergias alimentares quanto para intolerâncias, não existem tratamentos comprovados cientificamente que eliminem a doença. “No caso de alergias, a recomendação é a restrição total do alimento em questão da dieta. Já no caso da intolerância, o consumo é permitido em alguns casos, desde que a quantidade ingerida não seja prejudicial para o trato digestivo”, interpreta a médica. No entanto, quando a restrição a um determinado alimento for total, deve haver um acompanhamento de substituição nutricional. “Principalmente no caso de crianças, excluir algo da dieta pode levar a severos casos de anemia, desnutrição ou falhas no desenvolvimento. Por isso, sempre deve haver essa troca de um alimento por outro de equivalência nutricional”, alerta.

Diagnóstico de Alergias: Para a detecção de alergias alimentares, Renata Cocco afirma que o diagnóstico é muitas vezes baseado na observação. “O exame consiste em a pessoa ingerir uma determinada quantidade do alimento e, a partir daí, se observa as reações do organismo”, relata.
Entretanto, um exame de sangue específico pode indicar a presença da doença, que atinge cerca de 5% da população. “O teste conhecido como RAST consiste na verificação da imunoglobulina E (IgE) no sangue do paciente. Tal procedimento pode indicar a quais alimentos aquele indivíduo possui sensibilização alérgica”, conta a médica. No entanto, “um resultado positivo não significa necessariamente que a pessoa tem alergia àquele determinado alimento, apenas uma propensão”. O teste é encontrado em diversos laboratórios pelo País e possui cobertura da maioria dos planos de saúde.
Outro exame trazido recentemente ao Brasil promete ser mais eficaz no diagnóstico de alergias. Trata-se da identificação de frações proteicas a partir da tecnologia microarray (biochips de DNA que selecionam e se integram a partículas específicas predeterminadas), que pode identificar 112 alérgenos ao mesmo tempo. A alergologista considera que o teste deve ser analisado por um especialista já experiente na área. “Por ser um exame que verifica reações cruzadas, é de difícil interpretação. Por exemplo, alguém que possui ao mesmo tempo aversão ao látex e a uma fruta qualquer é alérgico a uma proteína comum a ambos os alimentos”, expõe Renata. O exame por microarray está em fase de adequações e deve retornar ao mercado no segundo semestre deste ano.

Diagnósticos de Intolerâncias: Os exames que detectam intolerâncias alimentares também são, muitas vezes, realizados a partir de observação clínica. No entanto, um exame criado recentemente, chamado de Food Detective, tem atraído pacientes em busca de um diagnóstico preciso sobre os tipos de intolerância alimentar presentes em seus organismos e acaba levando-os a uma confusão ainda maior. Em relação ao teste, Renata Cocco alerta que não existe nenhuma comprovação científica da eficácia do exame. “Ele simplesmente mede o nível de imunoglobulina G (IgG) no sangue. Porém essa substância pode estar relacionada a diversos outros fatores que não sejam a intolerância. Simplesmente não faz o menor sentido”. Além de ineficaz, o teste é comercializado a preços elevados (de R$ 800 a R$ 3 mil) e não pode ser encontrado em rede pública. “Qualquer exame, principalmente de alergias e intolerâncias, pode apresentar falsos resultados. Porém, nesse caso, os pouquíssimos resultados corretos são obtidos por meio de pura sorte, sem qualquer lógica para tal. Não existe racionalidade”, argumenta.

De acordo com a Dra. Ana Paula Moschione Castro, diretora da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI), não há embasamento científico para assumir que as intolerâncias alimentares estejam relacionadas à presença de anticorpos do tipo IgG. “As intolerâncias podem ocorrer por diversas razões, inclusive sem envolvimento do sistema imunológico. Portanto, não é possível confiar neste teste, nem sequer fazer inferências baseadas nos seus resultados”, analisa.

A diretora também reforça a posição de Renata Cocco e apresenta oposição à realização do teste em nome da entidade. “A ASBAI compartilha desta opinião por estimular profundamente a prática da medicina baseada em evidências vistas em trabalhos científicos ou opiniões de instituições idôneas e renomadas. Este repúdio ao teste para diagnóstico é compartilhado, inclusive, pela Academia Americana de Alergia e Imunologia”, acrescenta Ana Paula.

TEMA 3: Testes nutrigenéticos


Ultimamente vários pacientes me perguntam sobre os famosos testes nutrigenéticos disponíveis no mercado. Testes que "baseado" na detecção de alguns genes e polimorfismos consegue predizer qual o melhor tipo de dieta para cada indivíduo. Um grande avanço na nutrologia.

Mas será que realmente funcionam?

Será que há respaldo científico para se solicitar tais exames?

Afinal são caros e não saem por menos de 1800 reais o mais simples deles.

Por que será que não vemos geneticistas defendendo a utilização de tais exames ?

Parecer que me baseio para dar a opinião: http://www.sban.org.br/por_dentro/informativos/71/posicionamento-da-the-academy-of-nutrition-and-dietetics-genomica-nutricional?fb_action_ids=654437174643590&fb_action_types=og.likes&fb_source=other_multiline&action_object_map=%5B926596364033905%5D&action_type_map=%5B%22og.likes%22%5D&action_ref_map=%5B%5D

Inúmeras são as dúvidas. Acredito que seja uma área que está em franco avanço e daqui alguns anos poderemos utilizá-la. Mas AINDA não é a hora. O motivo ? Respondo com o parecer da Academy of Nutrition and Dietetics, que é uma entidade norte americana fundada em 1917 e que conta com mais de 75.000 membros, com participação de profissionais e estudantes na área de nutrição. Recentemente, ela publicou seu posicionamento frente a #GenômicaNutricional #Nutrigenética #Nutrigenômica e #TestesNutrigenéticos

Abaixo um texto publicado no site da Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição

“A Academy of Nutrition and Dietetics” é uma entidade norte americana fundada em 1917 e que conta com mais de 75000 membros, com participação de profissionais e estudantes na área de nutrição. Recentemente, a Academia publicou um trabalho a respeito de seu posicionamento frente a “Genômica Nutricional”.

O texto traz uma ampla revisão sobre o assunto, abordando desde os principais resultados do Projeto Genoma Humano (PGH), as áreas de estudo da Genômica Nutricional, até as implicações éticas de sua aplicação na prática clínica.

O PGH foi um marco na história da ciência. Há aproximadamente 11 anos, a sequência completa do genoma humano foi publicada, promovendo impactos em diversas áreas do conhecimento, inclusive na Nutrição. Um dos principais resultados foi o fato de que o número de genes humanos é muito menor do que se estimava – entre 20 e 25 mil. A partir de então, o tempo e os custos para sequenciar um genoma humano estão sendo reduzidos continuamente e, espera-se que sua incorporação na prática médica torne-se realidade.

Genômica Nutricional é um termo amplo, que abrange a Nutrigenética, a Nutrigenômica e a Epigenômica Nutricional, as quais se referem a maneira como os nutrientes e os genes interagem e como estes se expressam para revelar os resultados fenotípicos, incluindo o risco de doenças. A Nutrigenética estuda a influência da variabilidade genética entre os indivíduos, a qual responsável pelas diferenças no estado de saúde e no risco de doenças, considerando os diferentes padrões de ingestão alimentar.  A Nutrigenômica estuda a forma como as interações entre componentes da alimentação e genoma afetam o padrão de expressão gênica. Apesar destas delimitações, o termo Nutrigenômica muitas vezes é utilizado como sinônimo de Genômica Nutricional. Já a Epigenômica Nutricional se refere à influência da alimentação sobre mudanças na expressão gênica, mas sem que ocorram alterações na sequência do DNA.

Na Nutrigenética, as principais alterações estudadas são os polimorfismos de nucleotídeo único (SNPs), os quais são considerados variações normais no DNA e que consistem na troca de apenas um nucleotídeo em determinada região do DNA. Eles são responsáveis pelas diferenças observadas na cor dos olhos e cabelos, no tipo sanguíneo e alguns deles podem ter influência sobre o risco de desenvolvimento de determinadas doenças, muitas das quais podem estar associadas ao padrão alimentar individual. O texto do parecer destaca alguns SNPs relevantes que são relacionados à Nutrição, como é o caso do C677T no gene que codifica a enzima metilenotetra-hidrofolato redutase (MTHFR). Este SNP interfere no status de folato e de homocisteína e, potencialmente, no risco cardiovascular, na prevalência de defeitos do tubo neural e em outros riscos de doenças. Outros polimorfismos destacados encontram-se nos genes que codificam a fosfatidiletanolamina N-metiltransferase (PEMT) e a metilenotetra-hidrofolato desidrogenase 1 (MTHFD1), os quais estão relacionados a alterações no metabolismo da colina. Ainda, é referido que a associação mais estudada entre SNPs e doença é a relação entre o genótipo da apolipoproteína E (apoE) e a doença arterial coronariana (DAC). O papel do gene FTO (fat mass and obesity associated) sobre o risco de desenvolvimento de obesidade é citado, com ênfase no fato de que tal risco pode ser modificado por fatores ambientais, como a prática de exercícios físicos e a redução da ingestão energética. Neste aspecto, fica claro também que a vulnerabilidade genética à obesidade somente se expressa quando a exposição a fatores ambientais permite tal manifestação.

Com relação à Nutrigenômica, destaca-se que estudos de restrição energética e de modificações alimentares em indivíduos com sobrepeso e obesidade têm fornecido evidências de como os nutrientes afetam a expressão gênica. Tem sido demonstrado que quando estes indivíduos modificam seus padrões de alimentação, genes envolvidos com o metabolismo e com o fator de crescimento semelhante à insulina (IGF-1) apresentam redução de expressão (down regulation). Efeitos de intervenções alimentares sobre o padrão de expressão gênica têm sido também aplicados em outras condições clínicas, como é o caso do câncer, com resultados promissores, porém muitas vezes conflitantes.

Por fim, a Epigenética refere-se a alterações herdáveis, porém que não promovem variações na sequência do DNA, mas que tem papel importante no controle da expressão gênica. Assim, a Epigenética é o processo que regula como e quando os genes são silenciados ou ativados e a Epigenômica é o estudo das alterações epigenéticas de uma célula. Os principais mecanismos epigenéticos de regulação da expressão gênica incluem hipo ou hipermetilação do DNA, alterações em histonas, silenciamento de genes por microRNAs e estabilidade cromossômica. Fatores relacionados à alimentação podem agir por meio de mecanismos epigenéticos ao longo da vida e se estender por gerações. É citado o exemplo dos indivíduos que foram expostos à privação alimentar intrauterina durante o Inverno Holandês da Fome (Dutch Hunger Winter), entre 1944 e 1945, e que na vida adulta apresentaram maior incidência de doenças crônicas, tais como esquizofrenia, diabetes melito tipo 2, DAC, hipercolesterolemia e alguns tipos de câncer.

Em diversos pontos do texto evidencia-se a preocupação em deixar claro que, apesar das fortes evidências de que a alimentação tem grande influência sobre o padrão de expressão gênica e que pode influenciar mecanismos epigenéticos, ainda há muitas questões sem respostas e que precisam ser elucidadas.

O parecer discorre sobre o aumento abrupto dos testes genéticos disponíveis no mercado, sobre os diferentes tipos de testes e sobre como a Genômica Nutricional poderia ser incorporada à prática clínica, deixando claro que os resultados destes testes podem fornecer informações úteis sobre o risco para desenvolvimento de doenças ou para manutenção da saúde de um indivíduo, sempre associados a outras informações, tais como história familiar, parâmetros bioquímicos e presença de fatores de risco para doenças (ex: obesidade, hipertensão arterial, hiperlipidemias).

O texto é finalizado com uma discussão sobre o nível de conhecimento acerca da Genômica Nutricional por parte dos Nutricionistas e destaca que conhecimentos sobre genética devem ser amplamente incorporados nos cursos de graduação em Nutrição e também em programas de residência. Com relação ao futuro da Genômica Nutricional, conclui-se que apesar de promissora na elaboração de planos alimentares personalizados com base no genótipo, esta ciência ainda está em desenvolvimento.

O posicionamento resumido é o seguinte: “A posição da Academia de Nutrição e Dietética é a de que a Genômica Nutricional fornece compreensão sobre como as interações entre alimentação e genótipo afetam o fenótipo. A aplicação prática da Genômica Nutricional em doenças crônicas complexas está em ascensão, porém ainda não é possível recomendar o uso de testes nutrigenéticos para fornecer aconselhamento nutricional na rotina da prática dietética. Nutricionistas devem ter habilidades básicas em genética como uma fundamentação para o entendimento da Genômica Nutricional; a competência requer conhecimentos e habilidades avançadas”. (tradução livre).

Versão para download em: http://www.andjrnl.org/article/S2212-2672(13)01783-8/fulltext

Por:
  • Cristiane Cominetti: Professora da Faculdade de Nutrição da Universidade Federal de Goiás
  • Renato Heidor: Pesquisador do Laboratório de Dieta, Nutrição e Câncer da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP
ABORDAGENS TERAPÊUTICAS

TEMA 4: Terapia endovenosa ou Soroterapia


Só é autorizada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) para casos de intoxicação aguda ou crônica por metais tóxicos ou reposição de nutrientes quando a via oral ou enteral está impossibilitada. Vejamos o que fala a resolução do CFM sobre terapia endovenosa:

Art. 9º São destituídos de comprovação científica suficiente quanto ao benefício para o ser humano sadio ou doente, e por essa razão têm vedados o uso e divulgação no exercício da Medicina, os seguintes procedimentos da prática ortomolecular e biomolecular, diagnósticos ou terapêuticos, que empregam:

I)        Para a prevenção primária e secundária, doses de vitaminas, proteínas, sais minerais e lipídios que não respeitem os limites de segurança (megadoses), de acordo com as normas nacionais e internacionais e os critérios adotados no art. 5º;

II)        EDTA (ácido etilenodiaminotetracético) para remoção de metais tóxicos fora do contexto das intoxicações agudas e crônicas;

III)     O EDTA e a procaína como terapia antienvelhecimento, anticâncer, antiarteriosclerose ou voltadas para patologias crônicas degenerativas;

IV)   Análise do tecido capilar (mineralograma capilar) fora do contexto do diagnóstico de contaminação e/ou intoxicação por metais tóxicos;

V)    Antioxidantes para melhorar o prognóstico de pacientes com doenças agudas, observadas as situações expressas no art. 5º;

VI)   Antioxidantes que interfiram no mecanismo de ação da quimioterapia e da radioterapia no tratamento de pacientes com câncer;

VII) Quaisquer terapias antienvelhecimento, anticâncer, antiarteriosclerose ou voltadas para doenças crônicas degenerativas, exceto nas situações de deficiências diagnosticadas cuja reposição mostra evidências de benefícios cientificamente comprovados.

Outros documentos/artigos/reportagens que me respaldo para emitir minha opinião:

TEMA 5: Reposição hormonal com finalidade antienvelhecimento

A prática de reposição hormonal com finalidade antienvelhecimento É PROIBIDA pelo Conselho Federal de Medicina: http://portal.cfm.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=23324:conselho-federal-de-medicina-proibe-o-uso-das-terapias-antienvelhecimento-no-pais&catid=3

Não é reconhecida pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia: http://www.endocrino.org.br/cfm-proibe-terapias-antienvelhecimento/

Não é reconhecida pela Sociedade Brasileira de Geriatria: http://www.sbppc.org.br/site/index.php?option=com_content&task=view&id=2016&Itemid=26


TEMA 6: Dieta hCG

A Gonadotrofina Coriônica ( HCG) é uma glicoproteína hormonal produzida pelas células trofoblásticas sinciciais. É o único hormônio exclusivo da gravidez, conferindo alta taxa de acurácia como diagnóstico de gestação. Possui a função de manter o corpo lúteo no ovário durante o primeiro trimestre de gestação, estrutura essencial à manutenção da gravidez.
 Em algumas situações patológicas como, mola hidatiforme, coriocarcinoma e câncer de testículo podemos evidenciar a produção do hCG diverso da gravidez e o médico está habilitado ao diagnóstico diferencial correto em tais situações.

No homem a Gonadotrofina Coriônica (HCG) atua estimulando as células intersticiais de Leydig e, consequentemente, a secreção de androgênios.

 Em crianças com criptorquidismo, a HCG atua induzindo a maturação do testículo subdesenvolvido, o crescimento dos cordões espermáticos extremamente curtos e a descida do testículo.

A última revisão sobre o tema, evidenciou que o emagrecimento promovido pela mesma, decorre da dieta hipocalórica de 500Kcal. O mesmo estudo (metanálise) frisa que há riscos de eventos trombóticos com o uso do hCG. O CRM-MS emitiu parecer contrário à dieta: http://www.portalmedico.org.br/pareceres/CRMMS/pareceres/2013/4_2013.pdf

Recentemente (Maio/2015) a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia em conjunto com a Associação Brasileira para Estudos da Obesidade e Síndrome metabólica publicaram um posicionamento sobre a tal terapia: http://www.endocrino.org.br/posicionamento-sobre-hcg/

"Posicionamento oficial da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) e da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (ABESO) em relação à utilização da Gonadotrofina Coriônica Humana (hCG) para tratamento da obesidade.

Considerando que muitos médicos estão administrando hCG para pacientes que querem emagrecer, alegando sua eficácia para tal propósito;
Considerando que não há nenhuma evidência cientifica que hCG seja útil no tratamento da obesidade (pelo contrário, o que se tem de evidências é que não tem nenhuma eficácia);
Considerando que o tratamento com hCG pode ser deletério para os pacientes, podendo levar a graves consequências clínicas, conforme documentado na literatura médica;

A SBEM e a ABESO posicionam-se frontalmente contra a utilização de hCG com a finalidade de emagrecimento, considerando tal conduta não ter evidências científicas de eficácia e apresentar potenciais riscos para a saúde.

No consultório tenho atendido vários pacientes com complicações por uso do hCG. Quem visita meu instagram já percebeu que sempre aparece alguém comentando sobre a experiência negativa que teve com o hCG. Minha visão é a seguinte: as pessoas que perdem peso com a dieta do hCG é devido a restrição calórica.

O hCG pode ser usado mas há indicações. A forma injetável de hCG, vendida com receita médica, é aprovada, como tratamento da infertilidade ( na mulher), criptorquidismo, hipogonadismo hipogonadotrófico e puberdade tardia ( no homem e crianças).

Não há provas de que a Gonadotrofina Coriônica (hCG) aja sobre o metabolismo dos lipídios ou sobre a distribuição dos tecidos adiposos ou ainda, que influencie o apetite.

Consequentemente, a Gonadotrofina Coriônica (hCG) não possui indicações relativas ao controle de peso.( bula medicamento).

O hCG é classificado como “categoria X” pela FDA, significando que ele pode causar malformações fetais. Também constam nas orientações desta categorização que o seu uso não deve ser aplicado a pacientes com câncer hormônio-relacionados, tais como o câncer de próstata, endométrio, mama, ovário; bem como outras patologias homônio-relacionadas.

Com efeito, testes adicionais podem ser necessários para estabelecer a segurança do hCG
para indivíduos com distúrbios da tireóide ou glândula adrenal, cistos ovarianos, hemorragia
uterina, doença cardíaca, epilepsia, enxaqueca ou asma.

Os principais estudos existentes sobre a dieta hCG são esses:

1. Pektezel MY, Bas DF, Topcuoglu MA, Arsava EM. Paradoxical consequence of human chorionic gonadotropin misuse. J Stroke Cerebrovasc Dis. 2015 Jan;24(1):e17-9.

2. Thellesen L, Jørgensen L, Regeur JV, Løkkegaard E. [Serious complications to a weight loss programme with HCG.]. Ugeskr Laeger. 2014 Jul 21;176(30).

3. Lempereur M, Grewal J, Saw J. Spontaneous coronary artery dissection associated with β-HCG injections and fibromuscular dysplasia. Can J Cardiol. 2014 Apr;30(4):464.e1-3.

4. Sanches M, Pigott T, Swann AC, Soares JC. First manic episode associated with use of human chorionic gonadotropin for obesity: a case report. Bipolar Disord. 2014 Mar;16(2):204-7.

5. Goodbar NH, Foushee JA, Eagerton DH, Haynes KB, Johnson AA. Effect of the human chorionic gonadotropin diet on patient outcomes. Ann Pharmacother. 2013 May;47(5):e23.


TEMA 7: Implantes de gestrinona e Modulação hormonal

Textos que embasam a minha opinião: 
  1. Pareceres de inúmeras sociedades médicas sobre modulação hormonal ou implantes de gestrinona: https://www.ecologiamedica.net/2022/11/parecer-de-varias-sociedades-medicas.html
  2. Vídeo super elucidativo do meu colega Dr. Carlos Eduardo Viterbo: https://www.ecologiamedica.net/2024/03/implantes-hormonais-de-gestrinona.html

Autor: Dr. Frederico Lobo - Médico Nutrólogo - CRM-GO 13192 - RQE 11915 / CRM-SC 32949 - RQE 22416