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sábado, 1 de junho de 2024

[Medscape] Sono na redução do risco cardiovascular


A American Heart Association (AHA) criou em 2010 o Life´s Essential 7, uma espécie de checklist com 7 fatores para definir e quantificar a saúde cardiovascular. 

Desses fatores, quatro são biológicos (níveis ideais de pressão arterial, colesterol, glicemia e massa corpórea) e três são comportamentais (não fumar, atividade física regular e alimentação saudável). 

No ano de 2022 a AHA atualizou essa abordagem e acrescentou o sono como oitavo componente desses fatores, rebatizando a ferramenta de Life´s Essential 8. 

A associação desses oito marcadores com a preservação da saúde cardiovascular tem sido demonstrada. 


O sono tem sido reconhecido como um fator relevante para a saúde cardiometabólica. Estudos de laboratório mostram que o sono manipulado experimentalmente influencia a pressão arterial, a inflamação, a homeostase da glicose e outros fatores relevantes. Estudos observacionais maiores mostraram que pequenas alterações no sono em nível populacional estão associadas a alterações nos fatores de risco cardiovascular. Essa é uma lacuna de conhecimento que vem merecendo uma investigação mais aprofundada, em especial abrangendo dimensões do sono, além da duração. A atividade das ondas delta do eletroencefalograma (EEG) é uma característica proeminente do sono profundo, que está significativamente associada à qualidade do sono. A interrupção da atividade das ondas delta tem sido associada a diabetes, resistência à insulina, hipertensão e mortalidade.

Pesquisadores levantaram a hipótese de que a interrupção da atividade das ondas delta durante o sono poderia prever doenças cardiovasculares (DCV) em longo prazo e risco de morte por DCV. 


Os autores usaram um método abrangente baseado em entropia espectral de potência para avaliar a atividade das ondas delta durante o sono com base em polissonografias noturnas de 4.058 participantes do SHHS (Sleep Heart Health Study) e 2.193 participantes do MrOS (Osteoporotic Fractures in Men Study Sleep). 

Durante 11 anos de acompanhamento no SHHS, 729 participantes tiveram DCV incidente e 192 participantes morreram devido a DCV. Durante 15 anos de acompanhamento no MrOS, 547 participantes tiveram DCV incidente e 391 morreram devido a DCV. 

Em modelos de regressão multivariada de Cox, a menor entropia das ondas delta durante o sono foi associada a maior risco de doença coronariana e mortalidade cardiovascular. Além disso, a baixa entropia das ondas delta foi mais preditiva de doença coronariana, DCV e risco de morte por DCV do que os parâmetros convencionais do sono.


Implicações

Esses resultados inéditos sugerem que a interrupção da atividade das ondas delta durante o sono pode ser uma métrica útil para identificar pessoas com risco elevado de DCV e morte por DCV.

O editorial que acompanha o artigo ressalta que várias perguntas ainda sem resposta tornam necessários mais estudos: a entropia delta é meramente um marcador de risco cardiovascular, um fator de risco de DCV ou ambos? Seria um indicador de envelhecimento acelerado que representa um perfil geral de deterioração da saúde? Qual nível específico de baixa entropia delta pode conferir aumento do risco cardiovascular e da mortalidade, ou que nível de atividade das ondas delta precisa ser alcançado para proteção contra DCV? Esses níveis de corte podem diferir por idade, sexo e raça e etnia? Pode haver mudanças intrapessoais da atividade das ondas delta ao longo do tempo ou variabilidade do dia a dia, conforme mudanças nos níveis hormonais, fatores ambientais, distúrbios mentais, distúrbios neurológicos etc.?

De qualquer modo, o estudo amplia perspectivas na análise da cada vez mais evidente associação dos padrões de sono com a saúde e a doença cardiovascular.

Sempre vale lembrar que preservar a saúde é mais eficaz do que tratar a doença.

Fonte: Sono é cada vez mais reconhecido como um fator essencial para a preservação da saúde cardiovascular - Medscape - 27 de mai de 2024.

Postei essa notícia publicada recentemente no Medscape porque sono é algo que sempre estudei, desde o período da faculdade, quando pouco se falava acerca do tema. Até fiz uma monografia sobre o tema, então tive que estudar muito. 

Além disso, morava com minha tia, que é Otorrino e atua na área de Medicina do sono. Fui cobaia algumas vezes para realizar polissonografia. Então o tema me agrada. Nunca tive problema para iniciar o sono ou mantê-lo. Sempre sonhei muito, principalmente quando faço Jejum intermitente a noite. Sempre dormi muito bem e as poucas vezes que tive alguma dificuldade, bem pontuais, fiquei atordoado. Justamente por atender tantos pacientes com alteração do sono. 

Ano após ano percebo aqui no consultório que as pessoas estão indo deitar cada vez mais tarde, dormindo menos de 7h por noite. No meu questionário pré-consulta sempre questiono:
  • Que horas deita para dormir? Se deita após as 23:30 por qual motivo deita tão tarde?
  • Que horas acorda geralmente? Se acorda antes das 05:30, por qual motivo acorda tão cedo?
  • Pela manhã, sente que o sono foi reparador?
  • Tem dificuldade para iniciar o sono?
  • Inicia o sono mas acorda inúmeras vezes durante a noite?
  • Ronca?
  • Expõem-se ao sol com frequência?
Ano após ano as respostas só pioram. As pessoas negligenciam muito o sono, estão normalizando a utilização de indutores do sono (zolpidem). Estão normalizando deitar tarde, expor-se a tela antes de deitar. Achando que é normal acordar com sensação de sono não reparador. Sentir sonolência excessiva diurna. 

Para piorar, na Nutrologia eu fico assustado com a quantidade de pacientes portadores de obesidade que consultam com médicos que não medem a circunferência do pescoço mesmo o paciente relatando ronco. Médicos que sequer pedem polissonografia para pacientes com queixa de alteração do sono. 

A Medicina ainda precisa avançar muito em coisas básicas. O sono é um dos pilares para a boa saúde e longevidade. Já se passaram mais de 20 anos que comecei a estudar o tema e agora que boa parte dos médicos estão olhando o sono de forma diferente.

Espero que esse panorama mude. 

Autor: Dr. Frederico Lobo - Médico Nutrólogo - CRM-GO 13192 - RQE 11915, CRM-SC 32.949, RQE 22.416

terça-feira, 7 de maio de 2024

Repercussões cardiológicas dos anabolizantes - Dr. Tácito Bessa

 Vídeo bem detalhado elaborado pelo meu amigo Dr. Tácito Bessa - Cardiologista em Joinville

quarta-feira, 15 de março de 2023

Dieta Cetogênica pode dobrar o risco de doença cardíaca



Tema que chamou atenção no Congresso Mundial de Cardiologia (WCC) em 2023, foi o aumento do risco cardiovascular promovido pelas dietas cetogênicas. 

Uma dieta com baixo teor de carboidratos e alto teor de gordura, apelidada de dieta "tipo Keto ou Keto Diety", foi associada a um aumento nos níveis de LDL e a um aumento de duas vezes no risco de futuros eventos cardiovasculares, em um novo estudo observacional.

"Até onde sabemos, este é o primeiro estudo a demonstrar uma associação entre uma plataforma alimentar restrita em carboidratos e maior risco de doença cardiovascular aterosclerótica", disse a coordenadora do estudo Iulia Iatan, MD, PhD,  da University of British Columbia, Vancouver, Canadá.

“A hipercolesterolemia que ocorre durante uma Keto diet não deve ser considerada benigna”, concluiu ela. O estudo foi apresentado dia 5 de março na Sessão Científica do American College of Cardiology (ACC) no congresso mundial de cardiologia. 

A apresentação recebeu muita atenção da mídia, com manchetes sugerindo uma relação causal com eventos cardíacos com base nesses resultados observacionais. Mas o especialista em lipídios Steven Nissen, MD, Cleveland Clinic, Cleveland, Ohio, alertou contra prestar muita atenção às manchetes ou às conclusões do estudo.

Alguns especialistas na área de lipídios apontaram que o aumento do LDL no grupo de dieta "tipo Keto" foi relativamente pequeno e "certamente não é suficiente para produzir uma duplicação do risco cardiovascular".

Existem vários vieses no estudo. As pessoas que estavam na Keto diet neste estudo eram diferentes daquelas que estavam na dieta padrão. Além disso aqueles que seguiam a dieta keto faziam isso por um motivo (comorbidade) - maior prevalência de sobrepeso/obesidade tinham uma incidência maior de diabetes mellitus, sendo assim, o perfil era completamente diferente e altamente favorável para um maior risco cardiovascular. Mesmo que os pesquisadores tenham tentado ajustar para outros fatores de risco cardiovascular , haverá confusão não medida em um estudo como este.

Para Niesen (correspondente do Medscape cardiology(, este estudo não "responde a quaisquer perguntas significativas da maneira que queremos que sejam respondidas. Não sou um grande fã desse tipo de dieta, mas não acho que duplique o risco de efeitos adversos eventos cardiovasculares, e não acho que este estudo nos diga uma coisa ou outra". 


Para o estudo, Iatan e seus colegas definiram uma dieta com baixo teor de carboidratos e alto teor de gordura consistindo em não mais que 25% da energia diária total de carboidratos e mais de 45% do total de calorias diárias de gordura. Isso é um pouco maior em carboidratos e menor em gordura do que uma dieta cetogênica estrita, mas pode ser considerada uma dieta 'semelhante ao Keto'.

Eles analisaram dados do UK Biobank, um banco de dados prospectivo em larga escala com informações de saúde de mais de meio milhão de pessoas que vivem no Reino Unido e foram acompanhadas por pelo menos 10 anos.

Ao se inscrever no Biobank, os participantes preencheram um questionário de dieta de 24 horas auto-relatado e, ao mesmo tempo, tiveram sangue coletado para verificar seus níveis de colesterol. Os pesquisadores identificaram 305 participantes cujas respostas ao questionário indicavam que eles seguiam uma dieta pobre em carboidratos e rica em gorduras. Esses participantes foram pareados por idade e sexo com 1.220 indivíduos que relataram comer uma dieta padrão.

Da população estudada, 73% eram mulheres e a média de idade foi de 54 anos. Aqueles em uma dieta pobre em carboidratos e rica em gordura tiveram um índice de massa corporal médio mais alto (27,7 vs 26,7) e uma maior incidência de diabetes (4,9% vs 1,7%).

Os resultados mostraram que, em comparação com os participantes em uma dieta padrão, aqueles na dieta "tipo ceto" apresentaram níveis significativamente mais altos de colesterol LDL e apolipoproteína B (ApoB).

Os níveis de LDL foram de 3,80 mmol/L (147 mg/dL) no grupo tipo ceto versus 3,64 mmol/L (141 mg/dL) no grupo padrão (P = 0,004 ) . Os níveis de ApoB foram 1,09 g/L (109 mg/dL) no grupo ceto-like e 1,04 g/L (104 mg/dL) no grupo padrão (P < 0,001 ) .

Após uma média de 11,8 anos de acompanhamento, 9,8% dos participantes da dieta com baixo teor de carboidratos/alto teor de gordura versus 4,3% do grupo da dieta padrão experimentaram um dos eventos incluídos no desfecho composto do evento: angina, infarto do miocárdio, doença arterial coronariana, acidente vascular cerebral isquêmico, doença arterial periférica ou revascularização coronariana/carotídea.

Após o ajuste para outros fatores de risco para doenças cardíacas – diabetes, hipertensão, obesidade e tabagismo – descobriu-se que os indivíduos com uma dieta pobre em carboidratos e rica em gorduras têm um risco duplo de ter um evento cardiovascular (HR, 2,18; P < 0,000 ) . 001).

"Monitoramento mais próximo necessário"

O autor sênior Liam Brunham, MD, University of British Columbia, comentou com theheart.org | Medscape Cardiology : "Nossos resultados mostraram, acho que pela primeira vez, que existe uma associação entre esse padrão alimentar cada vez mais popular e o colesterol LDL alto e um risco futuro aumentado de eventos cardiovasculares. Isso é preocupante, pois há muitas pessoas por aí seguindo esse tipo de dieta, e acho que sugere a necessidade de um acompanhamento mais próximo dessas pessoas”.

Ele explicou que, embora seja esperado que os níveis de colesterol aumentem com uma dieta rica em gordura, "há uma percepção de que isso não é preocupante, pois reflete certas alterações metabólicas. O que mostramos neste estudo é que se o seu colesterol aumentar significativamente com esta dieta, você não deve assumir que isso não é um problema.

"Para algumas pessoas com diabetes esta dieta pode ajudar a baixar o açúcar no sangue e algumas pessoas podem perder peso com ela", observou ele, "mas o que nossos dados mostram é que há um subgrupo de pessoas que apresentam altos níveis de LDL e Apo B e isso parece estar conduzindo o risco."

Ele apontou que, em geral, o nível médio de LDL aumentou apenas ligeiramente nos indivíduos com dieta pobre em carboidratos/alto teor de gordura, mas o colesterol alto grave (mais de 5 mmol/L ou 190 mg/dL) foi quase o dobro nesse grupo (10% vs 5%). E esses pacientes tiveram um aumento de seis vezes no risco de doença cardiovascular ( P <0,001).   

“Isso sugere que existe um subgrupo de pessoas que são suscetíveis a essa exacerbação da hipercolesterolemia em resposta a uma dieta pobre em carboidratos e rica em gorduras”.

Brunham disse que seu conselho seria que, se as pessoas optarem por seguir essa dieta, elas deveriam ter seu colesterol monitorado e gerenciar seus fatores de risco cardiovascular.

"Eu não diria que não é apropriado seguir esta dieta com base neste estudo", acrescentou. "Este é apenas um estudo observacional. Não é definitivo. Mas se as pessoas querem seguir esse padrão alimentar porque sentem que haverá alguns benefícios, então devem estar cientes dos riscos potenciais e tomar medidas para mitigar esses riscos."

Nissen disse que, em sua opinião, "o júri ainda não decidiu" sobre esse tipo de dieta. "Estou aberto à possibilidade de que, particularmente a curto prazo, uma dieta 'tipo ceto' possa ajudar algumas pessoas a perder peso e isso é bom. Mas geralmente não recomendo esse tipo de dieta."

Em vez disso, ele aconselha os pacientes a seguir uma dieta mediterrânea, que comprovadamente reduz os eventos cardiovasculares em um estudo randomizado, o estudo PREDIMED .

“Não podemos tomar decisões sobre que tipo de dieta recomendar aos pacientes com base em estudos observacionais como este, onde faltam muitas sutilezas. Mas quando estudos como este são relatados, a mídia de massa se aproveita disso. o público precisa ser educado", comentou Nissen. 

"Nós nos referimos a esse tipo de estudo como gerador de hipóteses. Ele levanta uma hipótese. Não responde à pergunta. Vale a pena examinar a questão de saber se uma dieta tipo cetogênica é prejudicial. Não sabemos no momento , e acho que não sabemos mais nada depois deste estudo", acrescentou.

Os autores do estudo não relatam relações financeiras relevantes.