Existe alguma dieta específica para quem está tomando Semaglutida ou Tirzepatida?







Você inicia o uso de um análogo de GLP-1, como Wegovy ou Mounjaro, e na primeira refeição, algo está diferente. Aquele prato que você comia normalmente agora te faz sentir náuseas, empachamento e um desconforto inesperado. Essa surpresa é um cenário comum, relato diário no nosso consultório e sinaliza que seu corpo está funcionando de uma nova maneira.

Então surgirá no seu feed no instagram, um nutricionista ou médico falando que existe uma dieta específica para quem está usando as "canetas emagrecedoras" ou uma dieta denominada "Moujaro friendly". Será mesmo que existe isso? Dá pra fazer uma dicotomia entre o que é permitido e o que não é permitido? Puro sensacionalismo, para te vender algo ou causar pânico. Um clickbait. 

Esse termo não existe. A solução não é uma nova dieta da moda, mas uma adaptação estratégica à nova fisiologia do seu corpo: a adoção de "alimentos amigáveis" que respeitam o esvaziamento gástrico lentificado e a sensibilidade alterada que o medicamento provoca. Trata-se de uma estratégia lógica para alinhar o que você come com a forma como o medicamento age, garantindo mais conforto e melhores resultados.

E acima de tudo, utilização de alimentos que poderão te nutrir melhor, evitando que você apresente perda de músculos, queda de cabelo, fique indisposto. 

O que realmente significa GLP-1-friendly?


Adotar uma alimentação "friendly" significa fazer escolhas que trabalhem a favor do seu tratamento, respeitando o novo ritmo do seu sistema digestivo. Na prática, um alimento ou refeição "friendly" é aquele que:
  • Melhora a sua tolerância ao medicamento já que na nossa prática a gente vê muitos pacientes abandonando o tratamento por conta dos efeitos colaterais. Com a tirzepatida isso é menos comum, porém, com a Semaglutida e liraglutida isso ocorre com maior frequência. 
  • Evita efeitos colaterais comuns como náuseas, empachamento e mal-estar.
  • Ajuda a atingir a meta diária de proteína e a proteger com isso a sua massa muscular. Toda perda de peso promove em maior ou menor grau perda de músculos. Se você negligencia isso, ingere menos proteína e não pratica atividade física, você está pedindo para ter as complicações decorrente dessa perda.
  • Previne picos de glicemia (subidas rápidas de açúcar no sangue).
  • Reduz a inflamação corporal, um mecanismo ainda não elucidado mas que tem colocado essa classe na mira para tratamento de várias condições, como ativação mastocitária, até lipedema. 
  • É compatível com o esvaziamento gástrico mais lento que o medicamento provoca.
Essa abordagem não tem relação com alimentos "milagrosos" ou "zero calorias". O princípio é simples: fisiologia + estratégia. Nutrição inteligente. 

Você continua precisando de comida de verdade, mas selecionada e organizada de uma forma que otimiza seu bem-estar e a eficácia do tratamento.

Proteínas: As grandes estrelas do tratamento


Neste novo contexto, a proteína se torna o nutriente mais crucial para o sucesso do seu tratamento. Ela é a base para proteger seu corpo e garantir uma nutrição adequada com menos volume de comida.
Proteína é “remédio em forma de comida” nesse contexto.

As proteínas são tão benéficas porque:
  • Possuem digestão mais leve se cortes magros de carne, versões desnatadas de lácteos ou ovos cozidos: Especialmente quando preparadas de formas mais suaves (cozidas, refogadas, grelhadas) e em porções menores, como carne bovina desfiada ou frango desfiado, peixe em lascas.
  • Protegem a massa magra: A perda de peso rápida induzida por esses medicamentos pode levar a uma perda significativa de músculos junto com a gordura, o que é prejudicial para o seu metabolismo a longo prazo. A ingestão adequada de proteína é a principal estratégia nutricional para neutralizar esse efeito, garantindo que o peso eliminado seja predominantemente de gordura, e não de tecido muscular metabolicamente ativo.
  • Promovem maior saciedade: A proteína sustenta por mais tempo, evitando a fome entre as refeições, mas sem causar a sensação de "peso no estômago" típica de refeições muito gordurosas.
  • Efeito térmico dos alimentos: Dentre os macronutrientes, as proteínas são as que promovem maior efeito térmico, ou seja, a digestão dela é mais difícil e com isso o corpo gasta mais calorias para quebrá-las. Esse fenômeno denominamos de efeito térmico dos alimentos (ETA). 
  • Densidade nutricional: As fontes de proteínas não são somente fonte de proteínas. Tem na sua composição gordura (por isso optamos por cortes magros, versões com menor teor de gordura), mas junto carregam: minerais (ferro, zinco, cobre, cálcio, magnésio, cromo, selênio) e vitaminas, em especial as do complexo B. E hoje já sabemos que ao utilizar análogos de GLP-1 ou fazermos dietas um pouco mais restritiva, a ingestão desses nutrientes pode cair. Essa privação de nutrientes pode levar a sensação de cansaço, queda de cabelo, unha quebradiça.
Boas fontes incluem frango desfiado, ovos, peixes, iogurte grego, queijos magros, tofu e outras proteínas vegetais. Dica Prática: Tente incluir uma fonte de proteína em todas as suas refeições principais (café da manhã, almoço e jantar) e, se possível, também nos lanches.

Vegetais e Carboidratos: A estratégia da digestão lenta


Com o estômago funcionando em um ritmo mais lento, a forma como você consome vegetais e carboidratos também precisa de ajuste.

Vegetais: Grandes volumes de vegetais crus, como uma salada gigante, podem causar desconforto e gases, especialmente no início do tratamento. Por isso, vegetais cozidos são geralmente mais bem tolerados. Boas opções incluem abobrinha, cenoura, brócolis, vagem, chuchu e couve-flor.

Carboidratos: A escolha deve ser por "carboidratos inteligentes", que são ricos em fibras e possuem uma digestão mais lenta. Isso ajuda a manter a energia constante e a glicemia estável. Exemplos incluem aveia, quinoa, batata-doce e leguminosas como feijão, lentilha e grão-de-bico.

Dica do Prato Ideal: Uma montagem que funciona bem para muitas pessoas é dividir o prato da seguinte forma: metade com vegetais cozidos, um quarto com um carboidrato integral e um quarto com uma fonte de proteína magra. Começando sempre pelas proteínas. Brincamos com nossos pacientes que é "pecado" sobrar proteína nesse prato. 

Gorduras e hidratação: O toque de leveza


Ajustar a ingestão de gorduras e líquidos é fundamental para evitar o desconforto. O objetivo não é eliminar as gorduras, mas sim priorizar as fontes de qualidade em pequenas quantidades, como azeite de oliva, abacate e algumas castanhas.

Para promover saciedade sem peso, combine essas gorduras com alimentos de alto teor de água. Sopas leves, frutas como melancia e melão, e vegetais como pepino e tomate aumentam o volume da refeição de forma leve, ajudando você a se sentir satisfeito com menos densidade calórica e mais conforto digestivo.

O Que Evitar (ou Reduzir) para se Sentir Melhor


Assim como existem os alimentos "friendly", há aqueles que podem piorar os efeitos colaterais e atrapalhar seu progresso. Aumentar a frequência desses itens eleva a chance de sentir refluxo, náuseas e empachamento.

Os principais alimentos e hábitos "não-friendly" incluem:
  • Frituras e refeições muito gordurosas (fast food, carnes gordas, feijoada pesada).
  • Álcool.
  • Açúcares de absorção rápida (refrigerantes, doces em excesso, sucos açucarados).
  • Porções muito grandes de comida de uma só vez.
  • Excesso de alimentos crus em uma única refeição.
Isso não significa uma proibição eterna. A ideia é entender que a frequência e a quantidade desses alimentos impactam diretamente seu conforto e a eficácia do tratamento. Reduzi-los é uma escolha estratégica para se sentir melhor.



Conclusão: Uma nova relação com a xomida


Ajustar sua alimentação durante o uso de análogos de GLP-1 é uma mudança de paradigma. Quando a medicação e a nutrição trabalham juntas, o foco deixa de ser só perder peso e passa a ser saúde metabólica: menos gordura visceral, melhor glicemia, menos inflamação, mais qualidade de vida. Trata-se de adotar escolhas inteligentes focadas em obter mais nutrientes em menor volume, protegendo seus músculos para um resultado sustentável.

Para colocar isso em prática, lembre-se destas dicas:
• Fracione as refeições: Opte por porções menores, distribuídas ao longo do dia.
• Coma devagar: Mastigue bem e respeite o novo ritmo do seu estômago.
• Comece pela proteína e vegetais: Essa ordem no prato melhora a saciedade e a tolerância.
• Cuide da hidratação: Beba água ao longo do dia, mas evite grandes volumes junto com as refeições.
• Observe seu corpo: Aprenda a identificar quais alimentos causam mais ou menos desconforto para você e ajuste conforme necessário.

As informações contidas neste artigo são para fins educativos e informativos e não substituem uma consulta médica ou nutricional. Sempre converse com seu médico ou nutricionista antes de fazer qualquer alteração em sua dieta ou tratamento.

Autores:
Dr. Frederico Lobo - Médico Nutrólogo - CRM-GO 13192 - RQE 11915 
Dra. Christian Kelly Nunes Ponzo - CRM-ES 9683, RQE de Gastroenterologista: 6354, RQE de Nutrologia: 6355
Dra. Theresa Leo - Médica Nutróloga, Ginecologista e Obstetra - CRM-ES 8903 RQE 15007
Rodrigo LamonierNutricionista e Profissional da Educação física
Márcio José de SouzaNutricionista e Profissional da Educação física




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