Muitas Pessoas com Obesidade Grave Sofrem Discriminação Médica, Aponta Estudo
Principais pontos:
- Um novo estudo revela que mais de 40% das clínicas nos Estados Unidos recusaram agendar consulta para um paciente hipotético com obesidade grave.
- Mais da metade dos consultórios pesquisados não possuíam instalações ou equipamentos básicos necessários para oferecer atendimento adequado a pacientes com índice de massa corporal (IMC) de 60 ou mais.
- Pesquisadores alertam que a discriminação e a falta de recursos podem contribuir para piores desfechos em saúde, incluindo atraso no diagnóstico de câncer, entre pessoas que vivem com obesidade grave.
Discriminação generalizada em ambientes clínicos
Pessoas que vivem com obesidade grave frequentemente enfrentam discriminação e barreiras ao buscar atendimento médico, segundo um novo estudo publicado no Annals of Internal Medicine. Os pesquisadores relataram que cerca de 2 em cada 5 (41%) clínicas recusaram agendar consulta para um paciente hipotético com 211 kg.
Uma recepcionista em um consultório de cirurgião ortopédico afirmou: “Já atingimos nosso limite para pacientes bariátricos neste local”, sem oferecer mais explicações.
O estudo destaca um problema crítico no acesso ao cuidado: além das recusas diretas, mais da metade das clínicas (52%) não possuíam os equipamentos ou instalações necessários para fornecer atendimento médico básico a pacientes com pesos corporais muito elevados.
Obesidade grave é definida como IMC de 40 ou mais, sendo considerada obesidade extremamente grave quando o IMC é de 60 ou superior.
* Falta de instalações e equipamentos
Muitas clínicas não possuíam infraestrutura essencial, incluindo mesas ou cadeiras de exame capazes de suportar pesos elevados com segurança, portas e corredores largos o suficiente para a mobilidade dos pacientes e aventais médicos em tamanhos adequados.
A Dra. Tara Lagu, autora sênior do estudo e professora adjunta de medicina e ciências sociais médicas na Northwestern University Feinberg School of Medicine, em Chicago, destacou o impacto prejudicial dessas deficiências:
“Pacientes que vivem com obesidade grave provavelmente já enfrentam vergonha e dificuldades para se locomover no mundo. Dizer a um paciente que ele não pode ser examinado em uma maca, que não pode usar um avental, ou que precisa ficar em pé durante a consulta, transforma o que deveria ser um lugar seguro e a experiência de ver um médico em algo humilhante e degradante. Precisamos reconhecer, como profissão, que todas as pessoas merecem algo melhor do que isso.”
* População afetada e riscos à saúde
Segundo os pesquisadores, aproximadamente 1 em cada 270 norte-americanos — quase 1 milhão de adultos — vive com obesidade extremamente grave (IMC ≥ 60). Esses indivíduos têm de duas a três vezes mais probabilidade de apresentar problemas de saúde significativos em comparação com a população geral.
Apesar desse risco aumentado, estudos anteriores mostram que pessoas com obesidade têm menos chance de receber serviços preventivos de saúde, como rastreamento de câncer. A Dra. Lagu explicou:
“A obesidade afeta os exames de rastreamento de câncer, e a falta de rastreamento pode resultar em detecção tardia. Sempre atribuimos os piores desfechos em pacientes com maior peso ao próprio peso, mas cada vez mais estudos estão apontando para piores cuidados, falta de cuidados ou até mesmo a evitação do cuidado como possíveis razões para esses atrasos.”
* Desenho e resultados do estudo
Para investigar as barreiras ao cuidado, os pesquisadores utilizaram a estratégia de “cliente oculto” (secret shopper), na qual pessoas ligavam tentando agendar consulta para um paciente hipotético com 211 kg. Foram contatadas 300 clínicas em quatro áreas metropolitanas — Boston, Cleveland, Houston e Portland (Oregon). O estudo incluiu cinco especialidades: dermatologia, endocrinologia, obstetrícia e ginecologia, cirurgia ortopédica e otorrinolaringologia (ENT).
A pesquisadora principal, Dra. Molly Hales, médica do University of Chicago Medicine, destacou que as perguntas feitas pelos “clientes ocultos” foram propositalmente elaboradas para sugerir necessidades médicas urgentes:
“Desenhamos algumas perguntas para que o recepcionista pensasse: ‘Eu realmente deveria agendar essa pessoa’, porque as questões sugeriam que o paciente poderia ter câncer e precisar de uma avaliação imediata.”
Apesar disso, apenas 59% das clínicas no total aceitaram agendar a consulta. Os especialistas em otorrinolaringologia foram os menos propensos, com apenas 48% oferecendo atendimento, enquanto endocrinologistas foram os mais dispostos a aceitar e tinham instalações mais adequadas.
* Soluções humilhantes
Mesmo entre as clínicas que aceitaram atender o paciente hipotético, cerca de 1 em cada 6 (16%) sugeriram alternativas que poderiam ser humilhantes, como exigir que o paciente permanecesse em pé durante o exame ou usar um lençol em vez de um avental.
A Dra. Hales observou:
“Nossos números provavelmente subestimam a magnitude do problema. É bem provável que pouquíssimos pacientes com peso elevado, ao marcar consultas, saibam sequer perguntar se podem ser acomodados de acordo com seu peso, e muitos podem hesitar em fazer essas perguntas ou em defender seus direitos por causa do estigma social.”
* Soluções potenciais
Os pesquisadores destacaram que já foi desenvolvido um Checklist de Ambiente Clínico para orientar clínicas ambulatoriais a garantir atendimento adequado a pacientes com obesidade. No entanto, ele ainda não foi amplamente adotado.
A Dra. Hales comentou:
“Esse checklist foi projetado para ser usado por clínicas ambulatoriais gerais e já foi testado tanto na atenção primária quanto em especialidades, então é um bom recurso para que as clínicas identifiquem onde existem oportunidades de melhoria.”
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