quinta-feira, 19 de junho de 2025

Nutrição e cistite intersticial: quais alimentos pioram os sintomas



O que é?

A cistite intersticial (CI), também conhecida como síndrome da bexiga dolorosa, é uma condição urológica crônica caracterizada por dor pélvica, urgência miccional e aumento da frequência urinária, na ausência de infecção urinária ou outras patologias identificáveis. Considerada uma doença de difícil diagnóstico e manejo, a CI impacta significativamente a qualidade de vida dos pacientes, exigindo uma abordagem multidisciplinar.  

Este texto tem como objetivo elucidar para a população leiga os aspectos fisiopatológicos, critérios diagnósticos, tratamentos convencionais e o papel da nutrologia no manejo da CI, baseando-se em evidências científicas recentes.  

 Definição e Epidemiologia 

A CI é uma condição inflamatória crônica da bexiga, com prevalência estimada em 0,1% a 6,5% da população geral, sendo mais comum em mulheres (3:1 em relação aos homens) Sua etiologia permanece desconhecida, mas fatores autoimunes, neurogênicos e de barreira epitelial têm sido implicados.  

Fisiopatologia

Várias hipóteses tentam explicar a CI:  
- Defeito na camada de glicosaminoglicanos (GAG): Leva à permeabilidade aumentada da mucosa vesical, permitindo a infiltração de substâncias irritantes (Parsons, 2007).  
- Ativação mastocitária: Liberação de histamina e citocinas pró-inflamatórias 
- Alterações neurogênicas: Sensibilização de nervos periféricos e centrais, amplificando a percepção de dor

Quadro Clínico e Diagnóstico Diferencial 

Os sintomas incluem:  
- Dor suprapúbica piora com enchimento vesical.  
- Polaciúria (≥ 8 micções/dia) e noctúria.  
- Urgência miccional sem incontinência.  

Diagnósticos diferenciais

Infecção urinária, endometriose, síndrome do intestino irritável, bexica hiperativa, intolerância histaminérgica, síndrome de ativação mastocitária 

Critérios Diagnósticos e Exames Complementares
 
Não há teste definitivo; o diagnóstico é clínico e por exclusão. Critérios da Sociedade Internacional de Continência (ICS) incluem:  
- Sintomas ≥ 6 meses.  
- Cistoscopia com hidrodistensão (úlceras de Hunner em 10% dos casos).  
- Biópsia para excluir carcinoma in situ.  

Exames úteis:  

- Análise urinária e urocultura.  
- Estudo urodinâmico.  
- Questionários (ICSI, ICPI).  

Tratamentos Convencionais

Farmacológico  
1) Amitriptilina: Modulação da dor neuropática
2) Pentossano polissulfato sódico: Restauração da camada de GAG 
3) Hidrodistensão vesical: Alívio sintomático em 30-50% dos casos 

Tratamento não medicamentoso  
1) Fisioterapia pélvica: Melhora da disfunção muscular  
2) Estimulação nervosa sacral 
3) Nutrologia e Nutrição

A terapia nutricional para pacientes com cistite intersticial (CI) também chamada de síndrome da bexiga dolorosa é considerada uma abordagem complementar essencial no manejo da doença, com evidências crescentes na literatura científica. O foco do nosso tratamento na nutrologia consiste em:
1) Reduzir os sintomas urinários e a dor na bexiga
2) Evitar ingestão de irritantes vesicais via alimentação, ou seja, retirar o que desencadeia os sintomas e agrava o quadro
3) Manter o aporte nutricional adequado, já que diante das restrições alimentares os pacientes podem apresentar déficits de vitaminas, minerais. Por isso o acompanhamento conjunto do nutrólogo e do nutricionista é importante. Porém, tem que ser profissionais que tenham experiência no manejo da CI. 

Até o presente momento, a literatura indica: Evitar alimentos irritantes para a bexiga

Estudos mostram que certos alimentos atuam como desencadeadores dos sintomas, provavelmente por irritarem o urotélio ou alterarem o pH urinário.

Os mais comumente relacionados são:
  • Alimentos ácidos: Tomate, frutas cítricas (laranja, limão, principalmente abacaxi), vinagre, caju, acerola, mexerica
  • Alimentos e bebidas ricas: Cafeína e teobromina:  Café, chá preto, chá verde, chocolate, Coca-Cola, bebidas gaseificadas
  • Adoçantes como aspartame e sacarina. 
  • Alimentos condimentados: Pimentas, curry, massalas, páprica defumada
  • Alimentos embutidos: presunto, salame, salaminho, copa, molho inglês, shoyo
Abordagem dietéica 

Fazemos uma dieta de exclusão com posterior reintrodução, semelhante ao que fazemos na abordagem Low fodmaps. Consiste em:
1) Remover os potenciais irritantes 4 a 8 semanas.
2) Reintroduzir gradualmente os alimentos, um a cada 3-4 dias, observando a resposta.

Isso nos auxilia a identificar gatilhos individuais, já que os alimentos que agravam os sintomas podem variar entre os pacientes. É o que eu e o Rodrigo denominamos de trabalho duplo-detetive. 

Existem alguns Suplementos com benefícios mas ainda sem evidência robusta. 

1) Quercetina: que consiste em um Flavonoide com ação anti-inflamatória; melhora sintomas urinários em alguns estudos 
2) L-arginina: consiste em um aminoácido precursor de óxido nítrico; pode melhorar fluxo urinário e relaxamento vesical
3) Aloe vera: é uma planta com ação anti-inflamatório natural; relato de alívio sintomático em alguns pacientes
4) Condroitina, Glucosamina, Ácido hialurônico: teoricamente participam da camada protetora da bexiga. Pouca evidência. 
5) Probióticos: São bactérias que poderiam auxiliar na disbiose que é comum nessas pacientes. Porém, devem ser utilizados com muita cautela, pois, não é incomum a coexistência de CI e supercrescimento bacteriano do intestino delgado. Podendo até piorar o quadro. 

Papel do pH urinário e da hidratação adequada

A urina ácida pode intensificar a dor.
Dietas alcalinizantes (mais vegetais, menos proteína animal e café) ajudam alguns pacientes.
Citrato de potássio (oral) pode ser utilizado para alcalinizar a urina, porém, com cautela.
Manter ingestão hídrica adequada dilui compostos urinários irritantes. No mínimo 30ml por kilo de peso de água. Alguns pacientes restringem a ingestão por medo da frequência urinária, mas isso pode agravar os sintomas.

Conclusão

A CI é uma condição complexa que exige abordagem individualizada. A nutrologia surge como adjuvante promissor, modulando a inflamação e melhorando a qualidade de vida. Novos estudos são necessários para consolidar estratégias dietéticas específicas.  

Autor: Dr. Frederico Lobo - Médico Nutrólogo - CRM-GO 13192 - RQE 11915
Revisor: Rodrigo Lamonier - Nutricionista e Profissional da Educação física

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