PeptiStrong: ciência de verdade ou marketing turbinado?



Acho que há tempos eu não recebia tanta pergunta sobre um suplemento. Todos os disa recebo paciente que está tomando esse suplemento "milagroso". Colegas médicos, alunos e pacientes  todos perguntando se realmente funciona. 

Afinal, como 2,4 gramas de uma fava poderia ser mais potente que 30 gramas de Whey protein? 

A resposta é: Não é ! E quem está afirmando isso é o https://nutritionscam.com/peptistrong/

PeptiStrong: o que é, quais as promessas e por que tanta controvérsia?

PeptiStrong vem sendo vendido como um “novo ingrediente revolucionário” para ganho e preservação de massa muscular, inclusive virou moda aqui no Brasil.

Trata-se de um conjunto de peptídeos bioativos obtidos a partir da proteína da fava (Vicia faba) por hidrólise enzimática seletiva. No folders promocionais das farmácias de manipulação,  ele é apresentado como um ativo “descoberto por inteligência artificial” e capaz de aumentar a síntese proteica até 4x mais do que whey protein, com foco em hipertrofia, recuperação muscular, sarcopenia e pacientes pós-cirúrgicos. Será? 

Diante de promessas tão fortes, é natural perguntar: isso é ciência sólida ou mais um produto de marketing? O site NutritionScam analisou especificamente o PeptiStrong e levantou críticas importantes sobre as evidências disponíveis.

Abaixo os principais pontos dessa análise, traduzidos e comentados.

1. Como o PeptiStrong é vendido?

Os materiais de divulgação descrevem o PeptiStrong como:

  • Um ingrediente natural derivado da proteína da fava.
  • Uma rede de peptídeos bioativos “selecionados por IA” para otimizar síntese proteica, reduzir inflamação e melhorar recuperação muscular.
  • Indicado para: Atrofia muscular, sarcopenia e dinapenia; Recuperação pós-cirúrgica e pacientes acamados; Hipertrofia e desempenho esportivo; Mulheres no período peri e pós-menopausa.
  • Dose “padrão”: 2,4 g/dia (sachê ou scoop).

Em resumo, o discurso de marketing é que “uma pequena dose de peptídeos vegetais que, por sinalização celular, faria mais do que doses muito maiores de proteína tradicional.” Será mesmo ?

Os principais pontos de crítica do NutritionSCAM

Estudos em animais e contra placebo

Parte relevante das evidências vem de estudos em camundongos ou de ensaios em humanos comparando PeptiStrong com placebo (ou seja, não fazer nada).  Esse tipo de comparação pode mostrar algum efeito, mas não responde à pergunta clínica real: “PeptiStrong é melhor ou pelo menos tão bom quanto uma boa dose de proteína de alta qualidade?”

A discrepância de dose no único estudo contra proteína

Segundo o NutritionScam, no único estudo que comparou PeptiStrong com uma fonte de proteína de verdade (milk protein concentrate): A dose “clínica” usada de PeptiStrong foi aumentada em quase 10x, indo de 2,4 g para cerca de 20 g.

Ao mesmo tempo, o comparador foi uma milk protein concentrate com apenas 59% de proteína, uma qualidade bem inferior à de um whey isolate típico (que gira em torno de 90% ou mais de proteína). 

Ou seja, em vez de comparar aquilo que o marketing promete (2,4 g de PeptiStrong versus uma dose usual de whey ou outra proteína de alta qualidade), o estudo:

  • Superdosou o PeptiStrong;
  • Escolheu um comparador proteico fraco.
  • Mesmo assim, de acordo com o resumo do NutritionScam, não houve diferença significativa entre os grupos em perda de massa muscular, perda de força ou recuperação. 

 Falhas de desenho e conflito de interesse

O NutritionScam destaca ainda que o estudo foi claramente desenhado de forma “favorável” ao produto, com escolha de dose e comparador que facilitariam resultados de marketing. Vários autores do estudo são inventores ou funcionários ligados ao próprio PeptiStrong, o que configura um forte conflito de interesse (apesar de declarado). Eles lembram que ciência sem independência perde credibilidade: é como confiar em estudos sobre cigarro financiados e conduzidos por fabricantes de cigarro.

Com base nisso, o autor conclui que os estudos atuais “parecem mais um anúncio disfarçado de artigo científico” do que uma investigação realmente imparcial. 

O que isso significa na prática?

Promessa extraordinária, evidência comum (ou fraca). Dizer que 2,4 gramas de um peptídeo vegetal “sinalizador” seriam 4x mais potentes que uma dose padrão de whey é uma promessa enorme. Para aceitar isso, precisaríamos de diversos ensaios clínicos bem desenhados, independentes, com comparadores adequados (ex.: 20–30 g de whey isolate, caseína micelar, proteína de ervilha de alta qualidade, etc.).

Estudo chave com desenho problemático

O único estudo relevante comparando com proteína de verdade não testou o que o marketing promete. Se a hipótese central é “uma pequena dose que sinaliza mais do que uma dose maior de proteína”, o desenho deveria ser 2,4 gramas de PeptiStrong vs cerca de25 gramas de whey e não 20 gramas de PeptiStrong vs uma proteína mediana.

Conflito de interesse importante

Quando os mesmos grupos que criam e vendem o ingrediente são os responsáveis pelos estudos principais, e não há replicação independente, o nível de desconfiança precisa ser maior. Ou seja, temos que desconfiar. 

Custo x benefício

Produtos com PeptiStrong costumam ter preço bem elevado. No mínimo R$ 250 que é o que os meus pacientes tem relatado. Por ser caro, gera esses questionamentos. 

Se na prática, o resultado não é melhor que um whey de boa qualidade (e talvez nem igual), o custo por benefício provavelmente não compensa. Então para os que me perguntam sobre, respondo que não há evidência robusta de que PeptiStrong seja superior a proteínas tradicionais em prevenção de perda de massa muscular, ganho de força ou recuperação. 

O racional teórico (peptídeos sinalizadores, IA) é lindo e interessante, mas a fisiologia não se rende a slogans de marketing. Para a imensa maioria das pessoas (atletas recreacionais, pacientes em reabilitação, idosos com sarcopenia), ainda faz muito mais sentido lógico (e financeiro):

  • Garantir proteína adequada na dieta através da supervisão de um bom nutricionista pé no chão,
  • Usar suplementos proteicos convencionais bem estudados quando necessário (whey, caseína, proteínas vegetais ou blends proteicos),
  • Associar isso a treinamento de força bem estruturado e controle de comorbidades.

PeptiStrong pode até se mostrar útil no futuro, se surgirem ensaios clínicos independentes, bem desenhados, com desfechos clínicos relevantes. Mas, por enquanto a postura mais prudente é sermos céticos.

Como avaliar qualquer “novo ingrediente milagroso”

A análise do PeptiStrong serve de exemplo para outros suplementos da moda. Alguns filtros práticos:

  • Tipo de estudo: só animais? só biomarcadores? ou ensaios clínicos bem feitos em humanos?
  • Comparador: placebo ou uma opção realista do mundo real (whey, dieta otimizada, fisioterapia, etc.)?
  • Dose e protocolo: o que o marketing promete é o que foi testado?
  • Conflitos de interesse: quem financia, quem assina e quem vende?
  • Reprodutibilidade: há mais de um estudo, conduzido por grupos independentes?
  • Custo por benefício: entrega algo realmente superior ao que já existe, ou só aumenta o preço com um rótulo mais bonito?
Autor: Dr. Frederico Lobo - Médico Nutrólogo - CRM-GO 13192 - RQE 11915 - Gostou do texto e quer conhecer mais sobre minha pratica clínica (presencial/telemedicina), clique aqui. 

Em breve teremos novos estudos e vocês entenderão o que estou falando. Abaixo o post de um amigo sobre o tema.  


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