Diabetes Gestacional: causas, diagnóstico e estratégias de prevenção para uma gestação saudável




Importância do tema

A gravidez é um momento de intensas transformações hormonais e metabólicas. Entre essas mudanças, a disglicemia (ou alteração nos níveis de glicose) é a mais comum. 

Dados epidemiológicos estimam que cerca de 16% dos nascidos vivos no mundo sejam filhos de mulheres que tiveram alguma forma de hiperglicemia durante a gestação. Desse total, aproximadamente 8% das gestantes já tinham diagnóstico de diabetes antes de engravidar. O aumento desses casos está diretamente relacionado ao crescimento da obesidade, do diabetes tipo 1 e tipo 2 entre mulheres em idade fértil. E como as mulheres estão engravidando cada vez mais tarde, esse número tende a aumentar. 

A consulta de pré-natal representa, muitas vezes, a primeira oportunidade de rastrear o diabetes na vida adulta. Detectar precocemente uma alteração de glicose permite reduzir o risco de malformações fetais e prevenir complicações tanto para a mãe quanto para o bebê.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), quando a hiperglicemia é detectada pela primeira vez durante a gestação, ela deve ser classificada em duas categorias:
  • Diabetes diagnosticado na gestação (overt diabetes): quando a gestante apresenta valores de glicose compatíveis com diabetes fora da gravidez, sem diagnóstico prévio.
  • Diabetes Mellitus Gestacional (DMG): quando a alteração aparece durante a gestação, mas não atinge níveis de diabetes fora dela.

Interpretação da glicemia plasmática de jejum na primeira consulta pré-natal

  • Resultado da Glicemia em Jejum (mg/dL)  < 92 mg/d: É Normal
  • Se a glicemia fica entre 92  e125 mg/dL: É sugestivo de Diabetes Mellitus Gestacional (DMG)
  • Já se ficar no jejum ≥ 126 mg/dL: Provavelmente se trata Diabetes diagnosticado na gestação (overt diabetes)
  • Se a gestante apresentar hemoglobina glicada (HbA1c ≥ 6,5%) no primeiro trimestre, também é classificada como “diabetes diagnosticado na gestação”.

Epidemiologia do Diabetes gestacional

O DMG é a forma mais comum de hiperglicemia na gravidez. Ele ocorre quando o corpo da mulher não consegue produzir insulina suficiente para equilibrar o aumento natural da resistência à insulina que acontece nesse período.

A prevalência do DMG varia entre 3% e 25% das gestações, dependendo da população e dos critérios diagnósticos utilizados. Esse aumento acompanha o crescimento dos casos de sobrepeso, obesidade e resistência à insulina entre mulheres em idade fértil.

Fatores de risco para Diabetes gestacional

Alguns fatores aumentam o risco de desenvolver o diabetes gestacional. Entre eles estão:
  1. Idade materna mais avançada, 
  2. Excesso de peso antes da gravidez, 
  3. Histórico familiar de diabetes,
  4. Condições associadas à resistência à insulina, como obesidade central, hipertrigliceridemia, acantose nigricans e síndrome dos ovários policísticos.
  5. Ganho de peso acentuado durante a gestação,
  6. História obstétrica de abortamentos, malformações ou bebês grandes,
  7. Níveis elevados de hemoglobina glicada (≥ 5,7%) no início da gravidez,
  8. Baixa estatura: < 1,50m,
  9. Crescimento fetal excessivo, polidrâmnio
  10. Hipertensão ou pré-eclâmpsia na gravidez atual
Outros fatores menos conhecidos, mas importantes, são:
  • Baixos níveis de vitamina D: podem aumentar a resistência à insulina e o risco de DMG
  • Se Menarca antes dos 11 anos: existe um maior risco metabólico ao longo da vida
  • Má qualidade do sono: há um aumento no risco de intolerância à glicose e consequentemente de DMG

Riscos para a gestante e para o bebê

A hiperglicemia na gestação pode gerar repercussões tanto para a mãe quanto para o bebê. Entre as complicações maternas estão o aumento do risco de infecções urinárias, candidíase vaginal, polidrâmnio (excesso de líquido amniótico), hipertensão, pré-eclâmpsia, parto cesáreo, além da recorrência do DMG em futuras gestações e o maior risco de desenvolver diabetes tipo 2 no futuro.

Já para o bebê, os riscos incluem macrossomia (peso elevado ao nascer), traumas de parto, malformações, parto prematuro, hipoglicemia neonatal, hipocalcemia, hiperbilirrubinemia e maior probabilidade de obesidade e síndrome metabólica na infância e vida adulta.

Complicações maternas e fetais associadas à hiperglicemia na gestação

Há uma série de condições maternas que consequentemente aumentam risco de patologias no bebê, como por exemplo:
  • Hipertensão e pré-eclâmpsia na gestante:  risco de Macrossomia (bebê grande)
  • Polidrâmnio na gestante: Risco de distócia de ombro (dificuldade no parto)
  • Infecções urinárias e candidíase na gestante: Risco de malformações congênitas
  • Cesárea: Risco de prematuridade
  • Agravamento do diabetes prévio: Risco de hipoglicemia neonatal
  • Maior risco de DM2 após o parto: Síndrome metabólica na infância

Investigação do DMG

O diagnóstico do diabetes gestacional deve ser feito em todas as gestantes, mesmo na ausência de fatores de risco. O principal exame é o Teste de Tolerância Oral à Glicose (TOTG), realizado entre a 24ª e a 28ª semana de gestação.

Nesse teste, a mulher ingere 75 g de glicose anidra e tem o açúcar no sangue medido em três momentos: jejum, 1 hora e 2 horas após a ingestão. Se um ou mais valores estiverem acima do limite, o diagnóstico é confirmado.

Critérios diagnósticos do TOTG (75 g de glicose)

No jejum: Glicemia ≥ 92 e < 126: Positivo para DMG
Se após tomar 75g de glicose a glicemia de 1 hora: ≥ 180: Positivo para DMG
Se 2 horas após tomar 75g de glicose: ≥ 153 e < 200: Positivo para DMG
Se após 2 horas a glicemia for: ≥ 200: Diabetes diagnosticado na gestação (overt diabetes)

O diagnóstico é confirmado quando um ou mais valores estão acima dos pontos de corte.

Após o diagnóstico, o controle glicêmico deve ser rigoroso e contínuo. O automonitoramento da glicemia capilar é a ferramenta mais importante para garantir o equilíbrio sem causar hipoglicemias.

Monitorização recomendada se: 

  • Foi indicado apenas tratamento não-farmacológico: monitorar com 4 medidas diárias (jejum + 1h após café, almoço e jantar)
  • Recebeu indicação de insulina:  monitorar com 6 medidas diárias (jejum, 1h após café, antes e 1h após almoço, antes e 1h após jantar)

Metas de glicemia 

A meta da glicemai vai variar de acordo com o momento da medição, mas seguem geralmente os parâmetros abaixo:
  • Jejum / pré-prandial: manter entre 65 – 95
  • 1h após refeição: manter < 140
  • 2h após refeição: manter < 120
  • Madrugada (2–4h): manter entre 80 e 120
É importante ressaltar que em gestantes com risco aumentado de hipoglicemia, as metas podem ser levemente ampliadas. Ou seja, cada caso é um caso. 

Nos últimos anos, surgiram tecnologias de monitorização contínua de glicose (CGM), que permitem visualizar as variações de glicose em tempo real. Esse recurso é especialmente útil em mulheres com diabetes tipo 1, mas também vem sendo estudado no diabetes gestacional. Ainda não há consenso sobre seu impacto direto nos desfechos, mas os dados sugerem melhor controle glicêmico e maior aceitação pelas gestantes.

Tratamento do diabetes gestacional

O tratamento adequado do diabetes gestacional tem impacto comprovado na redução de complicações. Estudos demonstram que gestantes tratadas apresentam menores índices de distócia de ombro, macrossomia, cesárea, pré-eclâmpsia e hipertensão. Além disso, o tratamento não aumenta o risco de parto prematuro ou de bebês pequenos para a idade gestacional.

Quando o diabetes gestacional não é tratado, os riscos se estendem para o futuro da criança. Estudos de acompanhamento de longo prazo mostram que filhos de mulheres com DMG sem tratamento têm maior gordura corporal, IMC elevado e maior risco de desenvolver intolerância à glicose na infância e adolescência.

A base do tratamento

O tratamento deve sempre começar com Mudanças no estilo de vida composto por: 
  • Alimentação equilibrada (calculada meticulosamente por nutricionista especialista na área) e individualizada, 
  • Exercício físico de leve a moderada intensidade, quando não houver contraindicação médica. 
SE após 2 semanas de dieta os níveis de glicose continuarem elevados:
  • Jejum > 95
  • 2h pós prandial > 120mg/dL
Recomenda-se iniciar a terapia com insulina.

Terapias farmacológicas no Diabetes gestacional

1) Insulina: é a abordagem farmacológica há decadas utilizada, com melhor controle glicêmico e maior nível de segurança.
2) Metformina: é uma alternativa quando a insulina não é viável
3) Glibenclamida: Contraindicada na gestação

A dose inicial de insulina pode ser de 0,5 U/kg/dia, ajustada semanalmente de acordo com o monitoramento da glicose feito pelo endocrinologista ou obstetra. 

Gestantes que recebem corticoides para amadurecimento pulmonar fetal devem aumentar temporariamente a dose de insulina e intensificar o monitoramento glicêmico por até 72 horas após o uso.

Abordagem nutrológica do Diabestes gestacional 

Antes de tudo é importante frisar que uma das formas de se prevenir o DMG é o controle do peso. Ou seja, contraindica-se engravidar estando acima do peso. Isso seria o correto, no mundo ideal. Como sabemos que nem sempre é o que acontecerá, o ganho de peso deve ser controlado. 

Sendo que o ganho de peso ideal na gestação é baseado nas recomendações do Institute of Medicine (IOM-2009) e leva em consideração o índice de massa corpórea (IMC) pré-gravidez. 

Numa gravidez normal o ganho de peso ocorre devido a aumento de tecidos maternos e dos produtos da concepção, conforme a tabela abaixo.

Quanto a gestante pode engordar?

De acordo com o IOM (2009):
  • Se a paciente estava com o IMC: adequado previamente à gestação: aceita-se que ela ganhe de 11 a 16kg.
  • Se estava com sobrepeso (IMC 25-29,9): recomenda-se ganho de 7 a 11,5kg
  • Se estava com IMC>30 (obesidade): o ideal é que o peso aumente de 5 a 9kgg ao longo de toda a gestação. 
Nenhuma mulher, independente do IMC prévio deve perder peso durante a gravidez, nem realizar jejum. 

Ganho de peso em gestações gemelares

No caso de gestações gemelares estima-se um ganho de 16 a 24kg, sendo que no 2º e 3º trimestre, deve-se ganhar 700g por semana. PORÉM há uma intercorrência obstétrica: DMG. Nesse caso o máximo deve ser 16kg, aceitando-se até 20kg por ser gestação gemelar.

Norteamento da dieta no Diabetes gestacional

A dieta é peça fundamental no DMG, pois impacta diretamente a saúde materna e fetal, reduzindo riscos de complicações já citadas acima. 

A terapia nutricional é o tratamento inicial recomendado, sendo essencial para o controle glicêmico e prevenção de complicações.

O objetivo principal da dieta é:
  • Manter controle glicêmico rigoroso (principalmente pós-refeição), 
  • Promover ganho de peso gestacional adequado,
  • Prevenir complicações como macrosomia e necessidade de cesárea.
Sendo assim, o acompanhamento regular do peso e da glicemia é indispensável durante o pré-natal.

As necessidades energéticas (calorias) para gestantes com DMG devem ser individualizadas, mas seguem recomendações baseadas em evidências para garantir saúde materna e fetal, controle glicêmico e ganho de peso adequado.

Não há consenso sobre uma meta calórica específica para gestantes com diabetes gestacional; as necessidades são semelhantes às de gestantes sem diabetes e devem ser ajustadas conforme avaliação nutricional, levando em conta peso pré-gestacional, idade gestacional e ganho de peso recomendado.

Tradicionalmente, recomenda-se que mulheres grávidas aumentem a ingestão calórica em cerca de + 300 kcal/dia acima das necessidades de não grávida. 

Especificamente, as diretrizes da American College of Obstetricians and Gynecologists (ACOG) indicam que a partir do segundo trimestre a necessidade adicional seja aproximadamente + 340 kcal/dia, e no terceiro trimestre + ~450 kcal/dia em mulheres com peso pré-gravídico saudável. 

Um estudo sistemático mostra que o gasto energético total da gestante aumenta ao longo da gravidez, porém a magnitude do aumento pode variar conforme IMC pré-gravídico, ganho de peso gestacional, massa magra vs. gordura acumulada etc.  Por outro lado, algumas evidências indicam que, na prática, muitas gestantes mantêm uma ingestão energética relativamente estável ao longo da gravidez, ou com pequeno aumento, o que pode indicar sub-consumo ou sub-relato da ingestão dietética. 

Em gestantes com peso pré-gravídico dentro da faixa normal (IMC 18,0 a 24,9) e sem complicações, pode-se considerar o acréscimo de ~300-450 kcal/dia no segundo e terceiro trimestres, ajustando de acordo com o nível de atividade física e o ganho de peso gestacional observado. Em mulheres com sobrepeso ou obesidade pré-gravídica (ou seja, aqueles com maior risco de desenvolver DMG), algumas evidências sugerem que o acréscimo calórico pode ser menor, ou que a atenção deve maior ao controle do ganho de peso gestacional para evitar complicações. 

Em resumo, nas gestantes (saudáveis) fazemos o seguinte planejamento:
  • 1º trimeste: Adotamos pequena ou nenhuma mudança significativa em mulheres com bom estado nutricional; talvez +100 a +200 kcal/dia dependendo de atividade física. 
  • 2º trimestre: Acrescentamos + 340 kcal/dia (se gestantes com peso saudável) 
  • 3º rimestre: Acrescentamos 450 kcal/dia (em gestantes com peso saudável) 
Em relação às gestantes com DMG, não existem, até o momento, níveis consensuais internacionais específicos de calorias diárias que se aplicam universalmente. A Endocrine Society menciona que para mulheres com DMG e sobrepeso/obesidade, pode-se considerar uma restrição moderada de energia, por exemplo ~1600-1800 kcal/dia ou redução de ~33% das calorias totais, sem comprometer o crescimento fetal ou causar cetose. Porém, alguns pesquisadores questionam essa restrição durante a gestação. 

Em revisões recentes aponta-se que recomendações para DMG podem usar referência de 30-35 kcal/kg de peso corporal (pré-gravídico) como ponto de partida para mulheres com DMG (alguns autores chineses) e que exagero calórico e ganho de peso excessivo são prejudiciais. 

Para mulheres com DMG e obesidade pré-gravídica, o acréscimo energético do segundo/terceiro trimestre pode ser bem menor que 300-450 kcal/dia ou até não recomendado, dependendo do caso. Isso exige cuidado para garantir que o feto tenha nutrição adequada.

É importante ressaltar que em DMG, apesar da necessidade adicional energética da gravidez, o foco muitas vezes está mais em qualidade e distribuição dos macronutrientes (especialmente carboidrato) do que em “quantidade pura” de calorias. 

A atividade física, o metabolismo basal individual, a composição corporal (massa magra versus gordura), a genética, e outras comorbidades (obesidade, hipertensão, etc.) alteram as necessidades energéticas e infelizmente  vários estudos não estratificam completamente esses fatores.

Porém, uma coisa é consenso: na gestantes com DMG, a restrição calórica severa (< 1500 kcal/dia) não é recomendada porque pode induzir cetose materna e comprometer o crescimento fetal

No caso de pacientes portadoras de obesidade a American Diabetes Association (ADA) sugere 24kcal/kg de peso atual e 12kcal para obesas mórbidas.



Macronutrientes no Diabetes gestacional

As recomendações gerais de macronutrientes incluem: 
  • Carboidratos: em quantidade mínima de 175g/dia, priorizando fontes complexas e de baixo índice glicêmico. Os estudos mostram que a qualidade dos carboidratos é crucial: deve-se optar por alimentos integrais, frutas, legumes, grãos e evitar açúcares simples.
  • Proteínas: consumir no mínimo de 71g/dia,
  • Fibras: ingerir no mínimo de 28g/dia:  ênfase em frutas, legumes, grãos integrais e leguminosas.
  • Gorduras: dar preferência às mono e poli-insaturadas, limitando saturadas e evitando trans. O excesso de gordura pode aumentar resistência insulínica e risco de crescimento fetal excessivo.
Entre os padrões alimentares, dietas de baixo índice glicêmico e padrão DASH são as mais eficazes (e mais evidências) para controle glicêmico e redução de complicações como cesárea e macrosomia.

A dieta mediterrânea e plant-based apresentam potencial benefício, mas as evidências ainda são limitadas.

O plano alimentar deve ser individualizado com acompanhamento de um nutricionista, como já frisado acima e  SEMPRE evitando dietas restritivas extremas como cetogênica ou paleo, pelo risco de cetose para o bebê. 

Micronutrientes no Diabetes gestacional

Embora não haja valores de micronutrientes exclusivos para DMG, há evidências e ressalvas que devemos fazer. Já que a qualidade do micronutriente importa. Alguns micronutrientes com associação de risco ou benefício. Há trabalhos que mostram a seguinte correlação: déficit de micronutrientes da mãe e maior risco de diabetes na vida adulta (prole). 

Dietas muito baixas em carboidrato (< 175 g/d) podem aumentar risco de deficiências de micronutrientes em DMG. 


Há evidência (fraca) de que suplementação de ferro em excesso ou níveis altos podem estar associados a maior risco de DMG, possivelmente por aumento de estresse oxidativo e resistência à insulina. https://pmc.ncbi.nlm.nih.gov/articles/PMC9695730/

Vitamina B12, ácido fólico e Diabetes gestacional

Um trabalho publicado na Frontiers in nutrition mostrou que a deficiência de B12 na gestante no começo da gestação, estava associada a uma maior resistência à insulina e obesidade na prole. Já nessas mesmas gestantes, quando os níveis de ácido fólico estavam mais elevados, evidenciou uma correlação com um maior HOMA-IR.

Isso sugere que o equilíbrio entre esses dois micronutrientes é fundamental. Distúrbios no metabolismo de um carbono (envolvendo B6, B9, B12) também contribuem para o risco de DMG.



Magnésio e Diabetes gestacional

Sabe-se que o magnésio faz parte do metabolismo da glicose, partindo pressuposto, alguns pesquisadores começaram a analisar se esse íon teria algum benefício. O que os trabalhos mostram é que existe uma correlação significativa entre os níveis de magnésio e o desenvolvimento e controle do DMG.

Gestantes com DMG apresentam níveis séricos de magnésio significativamente mais baixos em comparação a gestantes saudáveis, especialmente no terceiro trimestre, e essa deficiência está associada ao aumento do risco de desenvolvimento de diabetes gestacional.

Estudos longitudinais mostram que a hipomagnesemia durante a gestação aumenta o risco de DMG, e quedas acentuadas nos níveis plasmáticos de magnésio ao longo da gravidez também elevam esse risco.

A suplementação de magnésio em algumas meta-análises de ensaios clínicos mostraram benefício glicêmico, mas não evidenciam redução consistente em complicações obstétricas. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/32185236/

Sendo assim, ainda não temos respaldo para indicar suplementação de magnésio para gestantes com risco de desenvolver DMG ou com DMG. O aumento da ingestão (via alimentação) desse mineral deve ser estimulado, visto que a quantidade de magnésio nos polivitamínicos e poliminerais para gestantes é baixo. 

Além disso, com a adoção do protocolo de suplementação universal de cálcio para todas as gestantes, o risco de déficit de magnésio é ainda maior, visto que ele é um dos competidores do cálcio. A suplementação de Ferro (também universal) pode depletar os níveis de magnésio. 

Então, embora a correlação exista, ainda não há consenso sobre protocolos de suplementação universal.

Cálcio e Diabetes gestacional

Segundo Ministério da Saúde (MS) do Brasil, a suplementação de cálcio nas gestantes é recomendada principalmente para prevenção dos distúrbios hipertensivos da gestação, como Pré‑eclâmpsia e Eclâmpsia. Ou seja, esse programa não tem correlação com prevenção de DMG.  

A justificativa do MS para crição do programa de suplementação tem como base:
  1. Os distúrbios hipertensivos da gestação são uma das principais causas de morbimortalidade materna e perinatal no Brasil. 
  2. A ingestão média de cálcio entre mulheres brasileiras é baixa; por exemplo, há trabalhos mostrando que mais de 96 % das mulheres adultas consumiam menos cálcio do que o recomendado. 
  3. Há evidência científica (robusta) demonstrando que a suplementação de cálcio em gestantes pode reduzir em até 55 % o risco de pré-eclâmpsia. 

A suplementação deve começar a partir da 12ª semana de gestação até o parto. Sendo que a dose é cerca de 1g/dia. Devendo haver atenção à absorção: o cálcio não deve ser tomado ao mesmo tempo que o ferro, devendo manter-se intervalo de pelo menos 2 horas. 

Mas e no DMG? Há indicação de se repor cálcio ?

Baixos níveis de cálcio no início da gestação estão associados a maior risco de desenvolvimento de diabetes gestacional, indicando que a deficiência de cálcio pode ser um fator de risco independente para DMG.

Estudos observacionais mostram que gestantes com deficiência de cálcio apresentam maior incidência de DMG especialmente quando essa deficiência ocorre antes das 20 semanas.

A suplementação de cálcio, principalmente em associação com vitamina D, poderia teoricamente melhorar o controle glicêmico e reduzir resistência à insulina em gestantes com DMG; 

Há ensaios clínicos demonstram que essa combinação reduz glicemia de jejum, insulina sérica, HOMA-IR e melhora o perfil lipídico, além de diminuir complicações maternas (como cesariana e hospitalização) e neonatais (macrosomia, hiperbilirrubinemia e hospitalização). https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/31208474/

Por outro lado, níveis elevados de cálcio circulante estão associados a maior risco de diabetes tipo 2, mas a relação direta com DMG ainda não está totalmente esclarecida. Estudos transversais e meta-análises sugerem que tanto níveis baixos quanto elevados de cálcio podem impactar negativamente o metabolismo glicêmico, mas faltam dados robustos para gestantes.

Alterações na sinalização e transporte de cálcio durante a gestação afetam a adaptação das células beta pancreáticas, influenciando a secreção de insulina e o risco de diabetes gestacional. Mudanças nos canais de cálcio e proteínas transportadoras na placenta de gestantes com DMG podem contribuir para disfunção metabólica e menor conteúdo ósseo neonatal.

Faltam estudos prospectivos de grande porte que avaliem o impacto isolado da suplementação de cálcio sobre o risco e controle da diabetes gestacional em diferentes populações, sendo necessário mais pesquisa para recomendações definitivas.

Vitamina D e Diabetes Gestacional

 A deficiência de vitamina D está associada a maior risco de DMG, especialmente em gestantes com maior idade, IMC elevado e em grupos étnicos com maior prevalência de hipovitaminose D. 

A suplementação pode ser benéfica, mas os resultados são heterogêneos e o benefício parece maior em gestantes com níveis muito baixos (<20ng/mL). 

Outros micronutrientes relacionados ao Diabetes Gestacional

Há trabalhos evidenciando que a deficiências de tiamina (B1) e riboflavina (B2) aumentam o risco de DMG; maior ingestão está associada a menor incidência.

Níveis adequados de vitamina E, vitamina C, ferro, magnésio, selênio e zinco podem ser protetores, mas as evidências são limitadas e muitas vezes inconsistentes. O ferro, por exemplo, mostrou efeito protetor genético contra DMG.

Resumo das principais recomendações com evidência no DMG

  • Evitar restrição severa de qualquer macronutriente. A restrição da quantidade de carboidratos a 40% do total diário de calorias pode ser útil para obtenção de glicemias pós-prandiais adequadas. Exemplo: P: 60kg. Se optarmos por ofertar 30kcal/kg, precisaremos de um plano alimentar de 1800kcal. Sendo que 40% dessas 1800kcal devem ser advindas de carboidratos, ou seja, 720kcal ingeridas no dia, devem ser oriundas de carboidratos. Cada grama de carboidrato fornece 4kcal. Além disso, sempre que possível, colocar fonte protéica e de fibras junto do carboidrato.
  • Priorizar alimentos integrais, frutas, legumes, grãos, proteínas magras e gorduras saudáveis.
  • Limitar alimentos ultraprocessados, açúcares simples e gorduras saturadas/trans.
  • Individualizar o plano alimentar com acompanhamento nutricional especializado.
  • Evitar cafeína.
  • Abolir álcool.
  • Evitar embutidos, enlatados e produtos ultraprocessados.
  • Ingerir diariamente: 30ml de água para cada kg de peso corporal.
  • Praticar pelo menos 45 minutos de atividade física, de preferência com intensidade leve a moderada, caso não tenha contraindicação.
O cuidado não termina após o parto. Mulheres que tiveram DMG devem realizar avaliações periódicas de glicose e manter hábitos saudáveis, pois há maior risco de desenvolver Diabetes Tipo 2 nos anos seguintes.

Cuidar da alimentação, manter um peso saudável, praticar atividade física, dormir bem e monitorar a vitamina D são atitudes que reduzem o risco de reincidência.

O diabetes gestacional não é uma sentença, mas um sinal de atenção e oportunidade de cuidado. Com diagnóstico precoce, orientação adequada e acompanhamento multiprofissional, é possível proteger a mãe e o bebê, promovendo uma gestação segura e uma infância mais saudável

Autores: 
Dra. Theresa Leo - Médica Nutróloga, Ginecologista e Obstetra - CRM-ES 8903 RQE 15007
Dr. Frederico Lobo - Médico Nutrólogo - CRM-GO 13192 - RQE 11915
Dra. Natalia Jatene - Médica Endocrinologista CRM-GO 15792 RQE 10306

Bibliografia:

American Diabetes Association Professional Practice Committee; 15. Management of Diabetes in Pregnancy: Standards of Care in Diabetes—2025. Diabetes Care 1 January 2025; 48 (Supplement_1): S306–S320. https://doi.org/10.2337/dc25-S015

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