quinta-feira, 17 de setembro de 2020

Guia alimentar para a população brasileira



Nós, do movimento Nutrologia Brasil abominamos totalmente a nota do Ministério da agricultura, pecuária e abastecimento pedindo revisão do Guia Alimentar para a população brasileira. 
O guia é elogiado em todo o mundo, por ser inovador e priorizar alimentos in natura. Obviamente confronta a indústria de alimentos, pecurária e grandes lantifundiários. Vale a pena lê-lo e segui-lo. Quem entende de saúde é profissional da saúde.


Para quem não está entendendo, a reportagem abaixo explica. 

Começou a circular ontem, no WhatsApp e em redes sociais, uma nota técnica do Ministério da Agricultura que recomenda a “urgente” revisão do Guia Alimentar para a População Brasileira. Como veremos adiante, há detalhes nessa história que merecem tanta atenção quanto o conteúdo do documento.

Ele é mesmo chocante. Assinado por Eduardo Mello Mazzoleni e Luís Eduardo Pacifici Rangel (que são, respectivamente, coordenador e diretor do Departamento de Análise Econômica e Políticas Públicas da Secretaria de Política Agrícola da pasta), o texto diz por exemplo que o Guia é atualmente “considerado um dos piores” do planeta.

É claro que os autores não apresentam a fonte dessa constatação, porque ela é falsa. O Guia brasileiro recebe, na verdade, inúmeros elogios mundo afora (veja aqui e aqui). Ao comparar guias alimentares de mais de 80 países, um relatório da FAO (a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura) sugere que eles adotem diretrizes para promover sistemas alimentares saudáveis e ao mesmo tempo sustentáveis, e observa que só quatro – entre eles, o brasileiro – já o fazem. A ênfase em dietas ricas em cereais integrais, legumes, frutas e vegetais também é elogiada pela FAO, e as diretrizes brasileiras se baseiam justo nesses alimentos.

Voltando à nota técnica, sua principal crítica se refere ao uso da classificação NOVA. Já falamos bastante sobre ela, que divide os alimentos segundo seu grau de processamento: 1. alimentos in natura ou minimamente processados (obtidos diretamente de plantas/animais ou que passam por alterações mínimas, como lavagem e empacotamento); 2. óleos, gorduras, açúcar e sal (que são extraídos de alimentos in natura ou diretamente da natureza e usados para cozinhar); 3. alimentos processados (fabricados basicamente com a adição de sal ou açúcar a um alimento in natura ou minimamente processado); e 4. alimentos ultraprocessados (cuja fabricação envolve diversas etapas e técnicas de processamento e vários ingredientes, muitos deles de uso exclusivamente industrial).

Os elogios ao nosso Guia se devem ao fato de que sua regra de ouro é simples e, ao mesmo tempo, eficaz para garantir uma alimentação balanceada: basta preferir sempre os alimentos da categoria 1. Ou seja, preferir água, leite e sucos naturais em vez de refrigerantes; preferir macarrão ‘comum’ a miojo; preferir sobremesas caseiras a guloseimas industrializadas. Mas, para o MAPA, isso é mau. Seu documento considera a classificação NOVA “confusa”, “arbitrária” e “incoerente” e ainda afirma que ela “prejudica a implementação de diretrizes para promover a alimentação adequada e saudável para a população brasileira”. É até difícil pinçar os piores momentos do texto. Ele diz, por exemplo, que “uma alimentação que utiliza ‘sempre alimentos in natura ou minimamente processados e preparações culinárias’ é perigosa”…

Detalhes tão pequenos

A avaliação dos integrantes do MAPA é idêntica àquela feita, há tempos, pela indústria de alimentos – que, por sua vez, não esconde seu desejo de alterar o Guia. Nem é preciso dizer que, para as empresas, um Guia que desencoraje o consumo de produtos ultraprocessados não é bom negócio. Até porque não se trata apenas de diretrizes para orientação individual, mas também para subsidiar políticas públicas e programas relacionados à alimentação. O repórter Guilherme Zocchio, d’O Joio e o Trigo, escreveu no ano passado sobre como o presidente-executivo da Abio (a Associação Brasileira da Indústria de Alimentos), João Dornellas, expressou publicamente a necessidade de as empresas melhorarem sua comunicação com o governo para induzir alterações. 

No caso do Ministério da Agricultura, esta comunicação parece ir bem. Houve ao menos uma reunião entre Dornellas e a ministra Tereza Cristina sobre o assunto. Aconteceu no dia 23 de julho, e a pauta foi exatamente a “Revisão do Guia Alimentar da População Brasileira”, segundo consta na agenda da ministra. Adoraríamos conhecer os pormenores dessa conversa. O fato é que, segundo a nota técnica publicada ontem, as análises e recomendações ali presentes se referem a um ofício já encaminhado anteriormente por Tereza Cristina ao ministro da Saúde Eduardo Pazuello sobre o mesmo tema (mas que não conseguimos localizar na lista de ofícios disponibilizada no site do MAPA). Paulo Márcio Mendonça Araújo, chefe de gabinete da ministra, encaminhou a nota técnica ao chefe de gabinete da Saúde dizendo que “O Ministério [MAPA] reforça sua disposição para parceria de nossas equipes (MS e MAPA), com foco na revisão, a fim de oferecer à sociedade informação mais precisa sobre o tema e, desse modo, cumprir integralmente o objetivo dessa iniciativa.”

Mais uma coisinha. Para embasar sua avaliação e sugerir mudanças de peso no Guia, os autores da nota técnica utilizam apenas duas referências bibliográficas. Um dos artigos, que trata das “contribuições” dos nutrientes dos alimentos processados na dieta americana, foi escrito por pesquisadores que já declararam  ter recebido verbas de organizações sustentadas financeiramente pela indústria de alimentos – como o IFT, que tem a Coca-Cola entre seus doadores. O segundo artigo está no Brasil Food Trends, uma publicação do Instituto de Tecnologia de Alimentos patrocinada pela indústria, com nomes como Nestlé, Danone e, claro, a Coca-Cola entre os financiadores. 

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