sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Um terço dos casos de demência pode ser prevenível com modificações de estilo de vida

Mais de um terço dos casos de demência no mundo pode ser evitável ​​ao abordar nove fatores de estilo de vida que modificam o risco individual, de acordo com os resultados de um novo artigo detalhado da The Lancet Commission on Dementia Prevention, Intervention and Care (Comissão sobre prevenção, intervenção e tratamento da demência do Lancet).

O trabalho, apresentado na Alzheimer's Association International Conference (AAIC) 2017 e publicado simultaneamente no periódico The Lancet, foi compilado por 24 especialistas internacionais no campo da demência, que revisaram a literatura disponível na área e realizaram uma nova meta-análise que incluiu alguns fatores de risco não considerados nas análises semelhantes feitas anteriormente.

Os pesquisadores descobriram que nove fatores de estilo de vida são responsáveis ​​por 35% do fardo da demência. Esses fatores são: não completar o ensino secundário no início da vida; hipertensão; obesidade e perda de audição na meia idade; e tabagismo, depressão, inatividade física, isolamento social e diabetes na vida adulta.

"Consideramos apenas fatores de risco para os quais havia dados suficientes para tirar conclusões significativas, então provavelmente estamos subestimando a importância do estilo de vida, mas certamente podemos dizer que ele proporciona uma grande contribuição", disse a primeira autora, a Dra. Gill Livingston, do University College London(Reino Unido).

O relatório de longo alcance também aborda as intervenções e estratégias de tratamento para os pacientes com demência e comprometimento cognitivo.


"Nós apresentamos recomendações simples para os médicos sobre o que eles podem fazer em termos de tratamento", disse a professora Gill. "Descrevemos os caminhos terapêuticos mais baseados em evidências".

Dez mensagens fundamentais do relatório:

  1. O número de pessoas com demência está aumentando em todo o mundo, embora a incidência em alguns países tenha diminuído.
  2. Seja ambicioso em termos de prevenção. As recomendações englobam tratamento ativo da hipertensão; melhorar a educação infantil, exercício, engajamento social; reduzir o tabagismo e tratar a perda auditiva, a depressão, o diabetes e a obesidade.
  3. Tratar os sintomas cognitivos. Para otimizar a cognição, as pessoas com doença de Alzheimer ou demência com corpos de Lewy devem receber inibidores da colinesterase em todas as etapas, ou memantina na demência grave. Os inibidores da colinesterase não são eficazes no comprometimento cognitivo leve.
  4. Individualizar o tratamento da demência. O bom tratamento da demência deve ser adaptado às necessidades, preferências e prioridades individuais e culturais únicas, e deve incorporar o suporte para os familiares que cuidam do paciente.
  5. Cuide dos familiares que cuidam dos pacientes. Os familiares estão em alto risco de depressão. Deve-se disponibilizar intervenções eficazes para reduzir o risco de depressão e tratar os sintomas.
  6. Planeje o futuro. Pessoas com demência e as famílias delas valorizam as discussões sobre o futuro e as decisões sobre possíveis advogados para tomar decisões. Os médicos devem considerar a capacidade de tomar diferentes tipos de decisões no momento do diagnóstico.
  7. Proteja as pessoas com demência. Esses pacientes precisam de proteção contra a auto-negligência, a vulnerabilidade (incluindo a exploração), a administração financeira, a condução de veículos ou o uso de armas. A avaliação e o gerenciamento dos riscos em todas as fases da doença são essenciais, mas devem ser ponderados em relação ao direito da pessoa à autonomia.
  8. Tratar os sintomas neuropsiquiátricos, como agitação, humor deprimido ou psicose. O tratamento geralmente deve ser psicológico, social e ambiental, com a terapia farmacológica reservada para os pacientes com sintomas mais graves.
  9. Considere o fim da vida. Um terço das pessoas mais velhas morre com demência, por isso é essencial que os profissionais que trabalham no tratamento de pessoas no fim da vida considerem se os pacientes têm demência – eles podem não conseguir tomar decisões sobre o próprio tratamento ou expressar as próprias necessidades e desejos.
  10. As intervenções tecnológicas têm o potencial de melhorar a assistência, mas não devem substituir o contato social.
Ênfase no estilo de vida

"Esta é uma estimativa mais precisa dos riscos de demência associados aos fatores de estilo de vida do que o que tínhamos anteriormente, e incluímos mais fatores de risco do que foram considerados anteriormente", disse a Dra. Gill ao Medscape.

Por exemplo, disse ela, "eles incluíram isolamento social e audição, que não eram cobertos antes, e também examinamos todo o período da vida – quando essas coisas fazem a diferença. Essas duas coisas são inovadoras. Também pudemos ver como esses fatores de risco interagem uns com os outros quando vários deles ocorrem juntos"

Os autores consideraram todas as meta-análises já disponíveis, e onde não havia nenhuma disponível eles fizeram sua própria meta-análise, observou a Dra. Gill.

"Não havia nenhuma meta-análise sobre a audição, então fizemos uma, e descobrimos que a perda auditiva dobrou o risco de demência de nove a 17 anos depois". A Dra. Gill disse que o novo relatório seria influente na elaboração de futuras políticas internacionais de saúde pública. 

"Nossos resultados mostram que nunca é cedo demais ou nunca é tarde demais para realizar modificações de estilo de vida que farão a diferença".

Frisando que cerca de 47 milhões de pessoas vivem com demência em nível mundial, e que este número será praticamente triplicado para 131 milhões até 2050 – com o número de casos aumentando mais nos países de baixa e média renda – Dra. Gill disse: "Precisamos agir agora para começar a diminuir esses números. Abordar esses fatores de estilo de vida agora poderia transformar a futura sociedade".



Devido à falta de dados, o estudo não incluiu fatores alimentares, uso de álcool, deficiência visual, poluição do ar ou sono. "Portanto, a contribuição do estilo de vida é provavelmente um pouco mais
do que 35%, mas estamos apenas falando do que as evidências mostraram", disse a Dra. Gill.

Para colocar os 35% em perspectiva, o gene ApoE4 é responsável por 7%, observa o relatório. "Dito isto, aqueles com o gene ApoE4 são conhecidos por terem um risco adicional significativamente aumentado e, portanto, essas pessoas em particular devem fazer tudo o que estiver ao alcance delas para modificar esses fatores, o que irá reduzir os riscos", disse a Dra. Gill.

Outra descoberta interessante do relatório é que ser fluente em mais de um idioma não pareceu alterar de forma independente o risco. "Observamos, quando colocamos todos os dados juntos, que ser bilíngue não foi protetor, embora as pessoas geralmente pensem que seja", afirmou a Dra. Gill. 
"Provavelmente é a educação que acompanha isso que explica os achados descritos anteriormente".
Comentando o novo relatório para o Medscape, Maria Carrillo, psicóloga e PhD, diretora científica da Alzheimer Association, o chamou de "o apanhado geral mais abrangente dos dados sobre prevenção, intervenção e cuidados já realizado".

"Este trabalho reuniu todas as informações sobre as quais ouvimos falar nos últimos anos, disse Maria. "É importante perceber que podemos fazer algo sobre o fardo do Alzheimer agora".
As descobertas sobre fatores de estilo de vida nos dão "uma esperança incrível", acrescentou. "O que precisamos fazer agora é estabelecer o formato da receita para a combinação dos nove itens que foram considerados relevantes, quais dessas descobertas são as mais acionáveis, e a seguir, fazer as recomendações de saúde pública e nos certificar de que elas alcancem os grupos que mais precisam delas – aqueles com menos recursos socioeconômicos".

Ela disse que a Lancet Commission contribuiu com novas informações importantes sobre fatores de risco individuais. "Não tínhamos dados sólidos sobre a perda de audição antes, e eles confirmaram o risco do tabagismo – tem havido tanta discussão a esse respeito", observou. "Os pesquisadores também fazem uma recomendação global para o tratamento mais agressivo da hipertensão. Tudo isso é muito acionável ​​– obter um aparelho auditivo, parar de fumar, prestar mais atenção à pressão arterial".

Maria ressaltou que a elaboração da receita de recomendações de saúde pública mais específicas virá de novos estudos de intervenção iniciando atualmente em todo o mundo. Estes incluem o estudo randomizado FINGER US anunciado nesta semana, que está testando sistematicamente várias modificações de estilo de vida em uma grande população dos EUA.

Este estudo baseia-se no estudo anterior FINGER realizado na Finlândia, que mostrou que abordar vários fatores de risco simultaneamente pode ter benefícios cognitivos para as pessoas em risco de comprometimento cognitivo e doença de Alzheimer.
Comparações com o relatório NAS

O relatório do Lancet vem apenas algumas semanas após o lançamento de um relatório norte-americano semelhante sobre o Alzheimer das US National Academies of Sciences, Engineering, and Medicine (NAS), chamado "Preventing Cognitive Decline and Dementia: A Way Forward ".

Este relatório concluiu que "no momento, não há força suficiente de evidências para justificar o investimento em grande escala em atividades de saúde pública destinadas a prevenir a demência". No entanto, qualificou isso dizendo "alguns resultados podem ser vistos como potenciais benefícios adicionais para intervenções de saúde pública já identificadas". Estes são o melhor controle da pressão arterial para pessoas com hipertensão e o aumento da atividade física.

Então, por que a diferença nas recomendações dessas duas grandes revisões? Representantes dos dois grupos disseram ao Medscape que eles abordaram a questão de diferentes perspectivas, com o relatório do NAS se concentrando nas evidências de benefícios demonstrados em estudos de intervenção, enquanto o relatório do Lancet teve um foco mais amplo, e incluiu mais ênfase nos dados epidemiológicos.

O Dr. Lon Schneider, médico da Keck School of Medicine, da University of Southern California, em Los Angeles, e membro da equipe do The Lancet, disse: "nosso relatório foi provavelmente mais abrangente sobre as possibilidades de prevenção e, sim, provavelmente fomos mais agressivos em nossa interpretação sobre o que pode ser feito".

O Dr. Ron Petersen, médico da Mayo Clinic, em Rochester, Minnesota, que fez parte do comitê do NAS, acrescentou: "estávamos mais focados nos estudos de intervenção, e demos maior importância aos ensaios clínicos randomizados e à própria doença de Alzheimer, enquanto este novo relatório do Lancetcolocou mais ênfase na prevenção com base em estudos epidemiológicos. Eles também adotaram uma visão mais ampla, abrangendo todas as deficiências cognitivas e demências – não apenas a doença de Alzheimer".

"As projeções deles são muito interessantes, mas são mais hipotéticas do que as nossas", acrescentou. "Não estamos em desacordo com eles, e recebemos este novo relatório de braços abertos – isto ajudará a impulsionar o financiamento de novas pesquisas e ações para enfrentar este enorme problema da deficiência cognitiva e da demência na população que envelhece em todo o mundo".
A The Lancet Commission fez parceria com University College London, Alzheimer's Society UK, Economic and Social Research Council e Alzheimer's Research UK. Essas organizações forneceram ajuda financeira e prática, mas não tiveram nenhum papel na redação do manuscrito.

Alzheimer's Association International Conference (AAIC) 2017. Resumos 19550, 19551, 19552 e 19553. Apresentado em 20 de julho de 2017.

Lancet. Publicado em 20 de julho de 2017. Resumo

Fonte: http://portugues.medscape.com/verartigo/6501438?src=soc_fb_share#vp_2


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