quinta-feira, 10 de março de 2016

A atividade física pode ser perigosa, mas é o sedentarismo que mata milhões por ano.

A atividade física pode ser perigosa, mas é o sedentarismo que mata milhões por ano.

Fiz questão de iniciar o texto dessa forma pra deixar claro qual é o verdadeiro problema da sociedade. É claro que é chocante ver uma pessoa de 35 anos apresentar um quadro de morte súbita no meio de outros colegas, mas diariamente as vítimas do sedentarismo estão morrendo e não viram notícia. Elas morrem nos hospitais, de AVC, de hipertensão, de diabetes, de insuficiência cardíaca, de câncer. Isso quando não morrem enquanto dormem, como se fosse uma morte "de causas naturais". Ao mesmo tempo, não estou dizendo que todo mundo deve sair de casa ir fazer exercícios em alta intensidade sem avaliação médica. O que discordo é dizer que o exercício físico é o vilão da história. Mais ainda: discordo que o atestado exigido pelo governo ou por sua academia e que você fez de qualquer jeito irá salvar sua vida.

Você só deve ir ao médico se realmente estiver interessado no que ele tem pra te dizer e não simplesmente pegar um documento pra dizer "estou seguro", mesmo que tenha omitido a informação que está usando estimulantes, anabolizantes, que está fumando ou que usa algum medicamento que possa aumentar a probabilidade de um evento adverso durante a atividade física.

A avaliação médica pré-participativa não deveria ser de interesse do governo ou da academia, mas seu. Por isso discordo que deva ser obrigatório, pois você acaba mais interessado num documento do que realmente em ser avaliado. Quem tem que se interessar pela sua saúde é você mesmo. É você que tem que saber que mais de 10% da população tem alguma condição cardiovascular que necessita de acompanhamento médico, mesmo que não seja uma contraindicação para a prática de atividade física em alta intensidade. Se a academia está mais interessada na sua saúde que você, o atestado médico provavelmente fará muito pouca diferença. Em termos de saúde pública, é muito mais interessante que as pessoas não tenham um obstáculo para realizar a atividade física. Ou seja, o atestado médico não pode ser um obstáculo para que você se exercite. Isso quer dizer que a maioria irá se beneficiar da atividade física, mesmo que algumas pessoas possam passar mal com o exercício. Em termos individuais, pode ser eu ou você essa pessoa que irá se dar mal com o exercício. E ai vem a recomendação individual que você vá ao médico para ser avaliado, não pra ele te dar um documento pra praticar atividade física, mas pra que ele realmente te responda se você pode morrer com o exercício físico ou não e tratar doenças existentes.

Outra coisa: o PAR-Q não substitui o médico, muito menos é um teste sensível para a detecção de problemas e não isenta a academia de responsabilidades. O paciente não sabe descartar que está com um problema cardíaco ou não. Se ele está com sintomas, provavelmente já apresenta uma doença há um certo tempo. As doenças assintomáticas e com maior potencial de um desfecho para a morte súbita, principalmente em pessoas mais jovens, dificilmente trarão sintomas e serão detectadas pelo paciente.

Aos pacientes abaixo de 35 anos e que procuram o médico, a recomendação é que sejam submetidos a uma entrevista médica(anamnese) completa, associada a um exame físico + eletrocardiograma (pelo menos), para descartar doenças congênitas. O ecocardiograma é outro exame que posse auxiliar no diagnóstico de cardiopatias congênitas.

Em pacientes acima de 35 anos, em que a principal causa de morte súbita são as coronariopatias, além da anamnese, do exame físico e do eletrocardiograma, podem ser feitos exames buscando identificar doença coronariana ou sinais indiretos de doença avançada. Alguns exames que podem ser utilizados são a ecografia de carótidas com doppler, teste de esforço (teste ergométrico), exames laboratoriais, entre outros.

Às academias, mais importante do que exigir um atestado de seu cliente é exigir que ele seja avaliado de forma correta e não simplesmente entregar um documento pra se isentar da responsabilidade. Também é importante que os instrutores recebam treinamento de ressuscitação básica, aprendendo a realizar o primeiro socorro, que é determinante para o sucesso na reanimação (não adianta esperar chegar a UTI vida ou o SAMU, pois não dá tempo) e saber utilizar um desfibrilador automático (DEA), que é bastante simples de ser utilizado e que deveria estar presente em todo local que realiza treinamentos em alta intensidade.

Pra finalizar, numa matéria do correio publicada ontem, sem qualquer entrevista com um médico, diz que não há como prever um evento desfavorável em atletas. Essa informação é falsa. É óbvio que você não saberá o momento exato que o problema aparecerá, mas o médico é capaz de identificar pessoas que não devem praticar atividades físicas em alta intensidade. Na Itália, com a adição do eletrocardiograma na avaliação pré-participativa, houve uma redução da incidência de morte súbita em atletas para valores exatamente iguais ao de pessoas que não praticavam exercícios em alta intensidade. O exercício físico pode ser um gatilho para doenças que causam arritmias potencialmente fatais e estas pessoas devem ser identificadas.

Não busque o médico apenas para receber um atestado. Busque um médico porque você se preocupa com a sua saúde. Se o médico der um atestado gracioso, não aceite. Exija que seja avaliado de forma correta. E vá fazer atividade física.

Fonte: Dr. Getúlio Bernardo Morato Filho

0 comentários:

Postar um comentário

Propagandas (de qualquer tipo de produto) e mensagens ofensivas não serão aceitas pela moderação do blog.